quarta-feira, 25 de maio de 2016

Eça & Outras

Eça de Queirós e o Dia da Gastronomia Portuguesa 

          A Assembleia da República pela resolução n.º 83/2015 instituiu o Dia Nacional da Gastronomia Portuguesa no último domingo de maio, comemorado este ano pela primeira vez no dia 29, coroando assim o empenhamento da Federação Portuguesa das Confrarias Gastronómicas, de que a Confraria Queirosiana faz parte, e de outras entidades nesta consagração, sobretudo daqueles que desde há muito, com as suas pesquizas, os seus estudos, as suas constatações, chamam a atenção para esta parte incontornável da Cultura Portuguesa como parte dourada do nosso quotidiano, pois o comer e o beber são uma das sete coisas boas que há na vida. Só sete e sem hierarquia: o conviver, o estudar, o viajar, o amar, o repousar, o cuidar do corpo e o tal comer e beber. Tudo isto com moderação da quantidade, segurança da qualidade, satisfação da identidade, boa conta da oportunidade.
 Celebra assim Portugal este dia em todo o país, mas desta feita sobretudo em Aveiro, a cidade escolhida para a sua primeira edição, com diversos eventos alusivos ao tema. A Gastronomia Portuguesa, se bem que conte já com diversos estudos sérios e bem fundamentados, ainda vive muito de mitos, de fantasias e mesmo de despudoradas trapaças estribadas em bacoquismos regionalistas, como se o comer e o beber não fossem, pela sua própria natureza, propícios à partilha e à interinfluência cultural dos povos, sem prejuízo das verdadeiras excecionalidades locais. Como, de resto, todas as outras seis “coisas boas”, as quais vivem também de notáveis teimosias e devoções. E uma delas é a imediata e incontornável associação de Eça de Queirós à festa da gastronomia. Outros escritores também a celebraram, outros também a trabalharam como motivo literário, mas nenhum se lhe chega perto, graças sobretudo aos estudos de Andrée Crabé Rocha, Dário Castro Alves, Beatriz Berrini, A. Campos Matos, a que Mário Vieira de Carvalho juntaria a música, e outros mais. Isto além de “muita fustalha” académica, literária, jornalística, memorialística ou croniqueira, quantas vezes distorcendo a lição inicial e transformando Eça num equivoco maître d’ hotel, que ele nunca foi nem certamente quis ser, mas antes um comissário das preocupações unidas a lembrar que há em todo o mundo «…tanto velho sem lar, tanta criancinha sem pão, e a incapacidade ou indiferença de monarquias e repúblicas para realizar a única obra urgente do mundo – a casa para todos, o pão para todos …» (Eça de Queirós, A Rainha, «Revista Moderna», 1898).

            Destas afeições queirosianas chegou-nos do Brasil a tempo de celebrarmos este dia um precioso testemunho, um novo livro de Dagoberto Carvalho Jr., desta feita com Hélio Coutinho Filho e Gladstone Vieira Belo, intitulado “Jantares Ecianos do Recife”, com amável dedicatória daquele primeiro autor e sua mulher Cristina, edição cuidada da editora Nova Presença a evocar a memória de Beatriz Berrini, a quem se deve a edição do incontornável “ Comer e Beber com Eça de Queiroz”, Rio de Janeiro: Editora Index, 1995, desde então imitado e pirateado em obras menores. E de que fala agora este outro livro? De uma já imorredoura tradição que junta regularmente à mesa, uma vez por ano desde 1993, os confrades da Sociedade Eça de Queiroz do Recife, que por sua vez sucedeu ao Club dos Amigos de Eça de Queiroz fundado em 1948 por Paulo Cavalcanti, e que ainda hoje ali subsiste agregando as novas gerações de ecianos.
            Destes jantares, destas memórias, temos testemunho fac-similado dos programas e dos que por ali passaram ao longo destes anos, entre muitos outros notáveis portugueses e brasileiros, Dário Castro Alves, Isabel Pires de Lima, Carlos Reis, A. Campos Matos e Beatriz Berrini, obreiros do eterno rejuvenescimento da língua comum, sentados nas portuguesíssimas e brasileiríssimas mesas dos restaurantes Recanto Lusitano, Adega, Oficina do Saber, Porto dos Navegantes, Garrafeira e tantos outros, comendo, bebendo e palestrando com Eça e suas criações literárias, o Abade de Cortegaça, Fradique Mendes, João da Ega, Tomás de Alencar e toda aquela humanidade que degusta grão-de-bico, arroz de favas, caldo de galinha, capão cozido, anho assado no espeto com arroz de forno, aletria e pasteis de nata, acompanhados de vinhos do porto, colares, verdes, douros, bucelas, dãos, alentejos e tantos outros, sobre os quais Eça também chalaceou: «As coisas mais deliciosas de Portugal, o lombo de porco, a vitela de Lafões, os legumes, os doces, os vinhos, degeneraram, insipidaram… Desde quando? Pelo que dizem os velhos, degeneraram desde o Constitucionalismo e o Parlamentarismo. Depois desses enxertos funestos no velho trono lusitano, os frutos têm perdido sabor como os homens têm perdido o carácter…» (Eça de Queirós, A Correspondência de Fradique Mendes).
Ainda vamos a tempo da redenção, como o demonstra este livro, inexcedível presente que me mandou este meu confrade Dagoberto Carvalho Jr. para que, em conjunto com todos vocês, oh divinos queirosianos, comemoremos a preceito este inicial Dia da Gastronomia Portuguesa, aqui em Portugal, no Recife e no Mundo, recordando o que por ela fez, ainda que num firmamento muito mais estrelado, o cônsul, o homem público, o escritor José Maria Eça de Queirós.

            J. A. Gonçalves Guimarães
            Mesário-mor da Confraria Queirosiana

Livros

No passado dia 29 de abril decorreu na Estação Arqueológica do Freixo, com a presença do presidente da Câmara Municipal do Marco de Canavezes, Dr. Manuel Moreira, e outras entidades regionais, o lançamento do livro “Tongobriga. Reflexões sobre o seu desenho urbano”, da autoria de Charles Rocha, Lino Tavares Dias e Pedro Alarcão, editado pelo CITCEM – Centro de Investigação Transdisciplinar Cultura, Espaço e Memória, da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Trabalho conjunto do arqueólogo com arquitetos na interpretação do urbanismo vitruviano daquela cidade romana, «as propostas agora apresentadas, embora muito justificadas, não só abrem exigentes perspetivas para futuros trabalhos, como também incentivam outros, e novos, modelos de restituição de ruínas arqueológicas».

Dicionário de Eça de Queiroz

           
           A 11 de maio, na Biblioteca da Imprensa Nacional em Lisboa decorreu a apresentação do monumental “Dicionário de Eça de Queiroz”, de A. Campos Matos, o mais atualizado repositório analítico sobre o universo queirosiano, agora apresentado por Jorge Martins.  
            Entretanto já se encontra na Biblioteca da Póvoa de Varzim o espólio queirosiano reunido por A. Campos Matos ao longo da sua já longa e proveitosa vida, o mais completo do mundo, estando para sair a 3ª edição de “Eça de Queiroz. Uma biografia” deste autor, também em edição da IN-CM.



A 19 de maio, na Biblioteca da Assembleia da República, foi lançado o livro “José Leite de Vasconcelos (1858 – 1941). Peregrino do Saber” com textos de vários autores, entre eles Guilherme de Oliveira Martins, Luís Raposo, Carlo Fabião, Santiago Macias e José Cardim Ribeiro.
A apresentação esteve a cargo de Fernando Rosas, professor de História Contemporânea na Universidade Nova de Lisboa recentemente jubilado.




Colóquios e Conferências

Língua Portuguesa

            No passado dia 15 de maio no Mosteiro da Batalha, Guilherme de Oliveira Martins, presidente do Centro Nacional de Cultura, administrador executivo da Fundação Calouste Gulbenkian e confrade de honra da Confraria Queirosiana proferiu uma conferência sobre as potencialidades da Comunidade de Países da Língua Portuguesa e a sua responsabilidade na sua defesa a nível mundial, recordando que se trata do idioma mais falado no hemisfério sul e o terceiro europeu mais falado em todo o mundo por 250 milhões de criaturas, prevendo que até 2100 haverá 400 milhões de falantes; «falar bem a língua, cultivar a língua, não é questão de gramáticos, é questão de cidadãos» acrescentou.

História da Educação

            Como noticiamos na página anterior, decorreu no dia 20 de maio no Arquivo Municipal gaiense o colóquio sobre “A História da Educação em Vila Nova de Gaia” organizado pelo CITCEM – Faculdade de Letras da Universidade do Porto, através do Professor Doutor Luís Alberto Marques Alves, presidente da Associação de Professores de História da Educação, com o apoio da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, tendo nele participado os investigadores do Gabinete de História, Arqueologia e Património sediado no Solar Condes de Resende, António Manuel S. P. Silva, Eva Baptista, Fátima Teixeira, J. A. Gonçalves Guimarães, José António Afonso, Licínio Santos e Susana Moncóvio, tendo esta última apresentado um estudo sobre “A educação feminina pelas Belas Artes na sociedade de oitocentos”, além dos que anteriormente referimos daqueles outros investigadores. Os trabalhos apresentados vão agora ser publicados pelo CITCEM, tendo entretanto sido sugerida a realização de um colóquio anual sobre esta temática.

Saudade Perpétua

            Nos próximos dias 24 a 26 de junho decorrerá em Gaia e Porto o 1º Colóquio Saudade Perpétua, organizado pelo Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade da Universidade do Porto, no qual apresentarão comunicações, entre outros, os confrades queirosianos Ricardo Charters de Azevedo, sobre «Códigos de bom-tom ou de civilidade» e Susana Moncóvio sobre «Maria da Glória da Fonseca Vasconcelos (n. 1831) e Leonor Augusta Gonçalves Pinto (n. 1849), elementos de uma família de artistas ativos no Porto e em Vila Nova de Gaia entre o século XVIII e o século XX».

Exposição internacional

           

No próximo dia 20 de junho no palácio Neptuno em Madrid será inaugurada uma exposição internacional promovida pela Quinta da Boeira, Arte e Cultura, Vila Nova de Gaia, de modelos de embarcações históricas portuguesas e europeias, dos séculos XVI a XIX, da autoria de Albino Costa, antigo pescador e marinheiro da Afurada, com a edição de um catálogo sobre a evolução das embarcações à vela coordenado pelo Gabinete de História, Arqueologia e Património dos ASCR – Confraria Queirosiana, da autoria de J. A. Gonçalves Guimarães. A abertura da exposição contará com a presença de várias personalidades espanholas e portuguesas, bem assim como com os dirigentes da Federação das Confrarias Enófilas Portuguesas, das Confrarias dos vinhos do Porto, do Dão, do Verde, da Bairrada, e da Confraria Queirosiana representada pelo seu mesário-mor, além de outras. A exposição percorrerá depois diversas cidades europeias ao longo do ano, estando também prevista a sua apresentação no curso sobre História Naval que decorrerá no Solar Condes de Resende a partir de outubro próximo, organizado pela Academia Eça de Queirós. Estes eventos são primeiros passos das comemorações da 1ª viagem de circum-navegação por Fernão de Magalhães, provavelmente nascido em Vila Nova de Gaia, que decorrerão em todo o mundo em 2019.  

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Eça & Outras, IIIª. Série, n.º 91 – quarta-feira, 25 de maio de 2016; propriedade dos Amigos do Solar Condes de Resende - Confraria Queirosiana; Cte. n.º 506285685 ; NIB: 001800005536505900154 ;
IBAN: PT50001800005536505900154; email: queirosiana@gmail.com; www.queirosiana.pt; confrariaqueirosiana.blospot.com; eca-e-outras.blogspot.com; vinhosdeeca.blogspot.com; coordenação da página: J. A. Gonçalves Guimarães (TE-638); redação: Fátima Teixeira; inserção: Amélia Cabral.


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