segunda-feira, 25 de agosto de 2014

As guerras em nome de Deus

Estamos a evocar o centenário da I Grande Guerra, aquela que foi feita «para acabar com todas as guerras» e para durar «seis meses». Não consta que então algum dos beligerantes invocasse que ia rechaçar o inimigo em nome de Deus, porque se algum o fizesse ninguém o teria levado a sério. Mesmo assim, ainda se invocou a Santa Rússia, e os exércitos em confronto, perante a visão das mortes horríveis, foram acometidos de fenómenos de religiosidade espontânea, às vezes pouco ortodoxos, que os religiosos fardados, capelães católicos, protestantes e ortodoxos, tentaram enquadrar. Por toda a Europa, dentro e fora do teatro de guerra, ocorreram aparições da Virgem Maria, nomeadamente em Fátima, mas também, pelos vistos, se registaram fenómenos OVNI. A desgraça dos povos e a mortandade dos militares, dos civis e dos animais proporcionaram o extremar das crenças. Como ficou então muita coisa por clarificar, veio depois a II Grande Guerra.
Se na primeira ainda havia imperadores e impérios, vindos do século XIX, a segunda realizou-se já em plena soberania do povo, que, através de eleições, colocou no poder os governantes que a declararam e que a legitimaram, como foi o caso de Franco, Hitler, Mussolini, e outros governantes dos Aliados ou do Eixo. O povo podia ter vetado a guerra, mas estando então preocupado com as consequências da crise económica, do desemprego e da falta de perspetivas sociais, deixou isso na mão dos seus escolhidos, eleitos ou tolerados governantes. Depois foi morrer nos combates. Portugal, tendo entrado na primeira, fez-se neutro na segunda. E aqui, curiosamente, não foi o povo quem decidiu, mais o ditador de Santa Comba. Entretanto chegaram-nos mais algumas guerras avulsas depois, as da Coreia, do Vietnam, do Biafra e das colónias portuguesas de Angola, Guiné e Moçambique, além das do Médio Oriente, que continuou em guerra devido aos problemas ali deixados pelos intervenientes no segundo conflito mundial, nomeadamente os ingleses. Depois as guerras do Golfo, do Afeganistão, da Líbia, da Síria e, recentemente a da Ucrânia, feitas em nome da sociedade ocidental (leia-se interesses ingleses, alemães, franceses, russos e, sobretudo, americanos) contra os “ditadores locais”, então muito mais “ocidentalizados” do que os que se lhes seguiram e estão agora no poder, os quais, como se tivessem permanecido ou regressado à Idade Média, dizem que estão a fazer a guerra «em nome de Deus», o que até agora só era feito pelos judeus, que não abdicaram aindado projeto imperialista religioso do “Grande Israel”, que Jeová lhes terá prometido, mas que se esqueceu de combinar com os palestinianos, o que mostra que alguns povos ainda têm um deus totémico, mas não universal. Mas foi em nome desse ente universal que recentemente o Papa Francisco proclamou que não se fazem guerras em nome de Deus, talvez a sua declaração mais teológica, mais polémica, mais carregada de esperança futura de todo o seu pontificado, até porque ele é hoje o chefe de um estado europeu e de uma religião que, até ao século XVIII, patrocinou guerras em nome de Deus contra os muçulmanos, os hereges, os animistas, os de qualquer outra crença diferente. Trata-se não apenas de uma mudança radical da política da Igreja Católica, como esta declaração terá provavelmente um grande efeito civilizacional que influenciará os homens e mulheres bons de todo o mundo, pois daqui para a frente só os fanáticos, os intolerantes, os fundamentalistas, ou seja, só os criminosos à luz do direito e da ética universais, continuarão a fazer guerras em nome de Deus, do seu deus étnico, o que a Humanidade já não tolerará. Provavelmente ainda teremos mais algumas guerras locais, para definir direitos territoriais e fronteiras, para proteger o acesso a bens e produtos pelos seus proprietários, para conter e reprimir bandos armados, para meter na ordem internacional ditadorzecos de circunstância, para reprimir a pirataria e o banditismo localizados ou internacionais, para reprimir o tráfego de produtos não controlados, sejam eles os medicamentos, o tabaco, a droga, ou o dinheiro sujo dos banqueiros de colarinho branco, que já em grande parte dominam os governos de muitos países e a política internacional.
Tudo isto me lembra o que Eça de Queirós escreveu há mais de cem anos:
«Por todo o universo a religião desaparece das almas; e apenas lá fica essa vaga religiosidade, feita em parte do abalo que deu ao nosso coração uma tão longa sujeição ao sobrenatural, em parte do confuso terror que impera neste grande universo que nos cerca, tão simples e tão mal compreendido. Neste estado negativo, de passividade na dúvida, não se gera facilmente um impulso de ação forte. Um jehad no Islão é tão impraticável – como uma cruzada no cristianismo. Pedro Eremita hoje iria acabar na polícia correcional, por perturbador da ordem pública e das relações internacionais; e os fanáticos que, ainda hoje, às portas das mesquitas do Cairo, bradam contra o touriste estrangeiro as injúrias aconselhadas pela boa doutrina, são imediatamente levados para a enxovia, por fazerem alarido nas ruas!
Maomé, nas suas mesquitas, Cristo, nas nossas capelas, vão singularmente envelhecendo; o nosso Messias vai-se cobrindo pouco a pouco do pó que levanta o forte arado da razão, lavrando um mundo novo; e o profeta do Islão, tendo perdido a força da sua unidade, subdividido em mil profetas menores que presidem a mil seitas diferentes, mal pode resistir à lenta avançada da civilização ocidental. E com Cristo e Maomé, que eram os princípios militantes e vivos das suas religiões, desaparece o que nessas religiões havia de vivo e de militante. Resta Deus, resta Alá. Sublimes abstrações, incapazes de inspirar amor ou heroísmo» (Eça de Queirós, Cartas de Inglaterra).
Hoje, no Iraque, na Síria, na Palestina, na Argélia, no Afeganistão e no Egito, onde os EUA e o “mundo ocidental” têm ido abanar o vespeiro fundamentalista islâmico e judeu, há de novo guerreiros assassinos a fazerem a guerra em nome de Alá e de Jeová. Como pediu o Papa, não lhes juntemos Deus, e que impere o bom senso armado para conter os loucos que ali estão diariamente a assassinar seres humanos em nome de outro deus, só porque querem roubar-lhes a terra, a casa, a sua vida simples, pensando assim justificar os seus crimes aos olhos, quase sempre muito distraídos, da Humanidade, que já não acredita nem aceita esta justificação: os crimes cometidos têm autores, que deverão ser levados como réus aos fóruns internacionais.

J. A. Gonçalves Guimarães
Mesário-mor da Confraria Queirosiana


“Os Maias” por João Botelho

A 11 do próximo mês de setembro estreia nos cinemas a nova versão de “Os Maias – alguns episódios da vida romântica”, do realizador João Botelho, produzido pela Ar de Filmes, tendo as filmagens decorrido em Lisboa e Ponte de Lima com um elenco que integra grandes atores. Além da versão cinematográfica, haverá uma outra para série televisiva, com estreia garantida no Brasil.
Eça continua na ribalta nacional, agora “num cinema perto de si”.






Carta inédita de Eça

Tendo já publicado 913 cartas de Eça de Queirós, a maioria inéditas, A. Campos Matos acaba de divulgar mais uma, desta feita encontrada na Fundação Guerra Junqueiro no Porto, datada de 1878 e dirigida pelo primeiro ao patrono daquela fundação, a propósito do texto que o autor de “A Velhice do Padre Eterno” escreveu sobre “O Primo Basílio”. Esta carta está publicada na última página do “JL – Jornal de Letras, Artes e Ideias”, dirigido por José Carlos de Vasconcelos, n.º 1145 de 20 de agosto passado, sendo um notável exemplo, entre outras razões, da admirável prosa queirosiana.


J. Rentes de Carvalho

Também o escritor J. Rentes de Carvalho continua “em grande”: para além do seu incontornável blogue “Tempo Contado”, onde posta notáveis textos e imagens imperdíveis, temos agora a segunda edição neerlandesa de “A Flor e a Foice” já no mercado (na Holanda e na FNAC de Bruxelas). Por sua vez “Ernestina” tem entre nós uma nova edição da Quetzal com uma capa bem apelativa.
No próximo mês de setembro, a 5, nova edição de “Montedor” chega às livrarias, aquele que foi o seu primeiro romance publicado em 1968 pela Prelo, no qual o prefácio de António José Saraiva então anunciava que «…o Autor, com essa matéria que é a vida portuguesa, inventando um símbolo, uma presença, [conseguiu] ter enriquecido o Olimpo literário com mais uma figura e uma fábula que lá não existiam», acrescentando então que « o maior elogio do livro que tenho o gosto de prefaciar, é que não é uma repetição, mas uma invenção» (Nota prefacial da 1ª edição).

Curso do Solar

Abrirá no próximo dia 27 de setembro, sábado, o novo curso do Solar Condes de Resende, organizado pela Academia Eça de Queirós, o qual decorrerá até Março de 2015, num total de treze sessões que decorrerão ao ritmo de dois sábados por mês, entre as 15 e as 17 horas, desta vez intitulado “História e Carisma da Região do Douro Atlântico (Gaia, Porto, Matosinhos), de que esta é a 5.ª edição, com novos temas com investigação recente a apresentar. São professores Amândio Barros, António Manuel S. P. Silva, António Barros Cardoso, Fantina Tedim, Francisco Ribeiro da Silva, J. A. Gonçalves Guimarães, Joel Cleto, Jorge Fernando Alves, José Manuel Tedim, Manuel Luís Real e Nuno Oliveira.
O curso será certificado pelo Centro de Formação da Associação de Escolas Gaia Nascente do Ministério da Educação e a todos os inscritos será passado um diploma de frequência e fornecida a respetiva bibliografia, sendo ainda os interessados orientados para diversos temas de investigação inédita que poderão apresentar em mestrados ou doutoramentos.
O Solar Condes de Resende realiza cursos livres desde 1991.

Real Gabinete Português de Leitura

Localizada na Rua Luís de Camões n.º 30 no Rio de Janeiro, fundada em 1837 e aberta ao público desde 1900, a biblioteca do Real Gabinete Português de Leitura do Rio de Janeiro, possui a maior coleção de obras portuguesas fora de Portugal, incluindo algumas raridades como manuscritos de Eça de Queirós.
Em Julho passado foi classificada como uma das vinte mais bonitas, segundo a classificação da revista “Time”, aparecendo na quarta posição junto das mais famosas bibliotecas do mundo. É atual presidente da direção o nosso confrade honorário Dr. António Gomes da Costa.

Feira Medieval

No passado dia 4 de agosto, a convite da Confraria da Fogaça para uma visita à Feira Medieval de Santa Maria da Feira, ali se deslocou uma delegação da Confraria Queirosiana composta por Gonçalves Guimarães, Maria de Fátima Teixeira e Henrique Guedes, os quais constataram o enorme desenvolvimento desta realização e o fascínio que exerce sobre os visitantes.
Porém é pena que as entidades locais tenham abandonado o apoio à investigação científica sobre os temas medievais da Terra de Santa
Maria, a qual já existiu e com notáveis resultados, nos anos oitenta do século passado, quando então se publicaram obras de José Mattoso, A. de Almeida Fernandes e outros sobre a região. Supomos que a realização deste evento popular não prejudicaria um outro paralelo de caráter erudito. É que já temos visto feiras medievais com ciganos, beringelas e potes de ferro fundido de três pernas, estes últimos, como é sabido, um produto industrial do século XIX que não existia na Idade Média.

Palestras no Solar

Prosseguem no Solar as palestras das últimas quintas-feiras do mês, às 21,30 horas, entrada livre: no próximo dia 28 de agosto J. A. Gonçalves Guimarães falará sobre “As praias de Gaia como estâncias balneares” e, no dia 25 de setembro, sobre “O Jardim do Morro: um emplastro urbanístico?”.

Gastronomia em Vila do Conde





No passado dia 22 abriu ao público a 16.ª edição da “Cozinha à Portuguesa – Feira de Gastronomia de Vila do Conde”, organizada pela autarquia, este ano com renovada qualidade e apresentação de produtos de todas as regiões do país.
Na cerimónia de abertura estiveram presentes várias confrarias, entre as quais a Queirosiana que se fez representar por César Oliveira, Gonçalves Guimarães, Licínio Santos e António Pinto que se deslocaram àquele certame num automóvel histórico, marca Citroen, 1949, 11 BL, impecavelmente conservado e propriedade do presidente da MAG da confraria.

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Eça & Outras, IIIª. Série, n.º 72 – segunda-feira, 25 de agosto de 2014
Cte. n.º 506285685 ; NIB: 001800005536505900154

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