terça-feira, 25 de julho de 2017

Eça & Outras, terça-feira, 25 de julho de 2017

Património Cultural em Eça de Queirós

O conceito de Património Cultural, ao contrário do que geralmente se crê, não é óbvio, nem intuitivo, nem fácil. Requer uma grande dose de conhecimento, de sabedoria, de descomprometimento com coisas afins que com este conceito se atravessam, como Cultura, Educação, Turismo, Economia e Gestão. Anda geralmente confundido com História, Arqueologia, Arte, Arquitetura, Urbanismo, Geografia e outras disciplinas afins, que sem elas não existe, mas às quais não se reduz. Desde pelo menos o século XIX que o Património, como ciência humana e social, vem desenvolvendo teoria, metodologia e objetividade que lhe são próprias, numa sociedade que cada vez mais o invoca e utiliza, mas que, como em tudo o resto, nem sempre da melhor maneira, ou com a necessária clareza. Como muito bem definiu Carlos Alberto Ferreira de Almeida, Património Cultural é, antes de mais, Memória, não uma memória qualquer ou “toda” a memória, mas aquela que é selecionada pelo conceito de Qualidade, e que lhe é dada pela capacidade de preservação, escolha, seleção, valorização de conteúdos e aptidão para ser mais valia cultural e social. E tal tanto se aplica a um modesto cruzeiro de berma de estrada, a uma catedral ou castelo ou a um centro histórico, com a devida salvaguarda das diferenças dos seus “pesos” culturais próprios.
O vestígio, ruína, monumento, conjunto ou sítio que não é conhecido, não foi profissionalmente intervencionado, não foi tecnicamente preservado para as gerações atuais e futuras, cujos conteúdos arqueológicos, históricos ou artísticos não foram estudados, cuja mensagem não foi sintetizada, e que não foi preparado para um correto e duradouro usufruto público, não poderá ser considerado Património Cultural. Podem ser elementos em potência para um futuro enquadramento no que atrás se disse, mas não são na realidade Património, assim como não o são as memórias históricas, lendárias ou literárias sem a respetiva materialização. Serão outra coisa qualquer, ainda que muito erudita, mas não serão Património, mesmo recorrendo ao sofisma diferenciador do material e do imaterial. Mesmo o imaterial, como por exemplo o fado, para ser Património precisa de estudos, definições, arquivos, museus e o seu exercício por músicos e cantores, ou seja, de se materializar para ser Património. Este não existe pois em função de si próprio, como uma teologia qualquer, mas sim em função do que foi, do que é e daquilo que a sociedade quer que venha a ser. A sociedade como um todo, e não apenas os seus interventores, ainda que profissionais. Mas convém que todos estejam presentes. É assim que na clarificação dos conteúdos do Património de uma cidade histórica se só estiverem presentes no processo os empresários, os decisores políticos, os gestores, os empreiteiros e os organizadores da utilização económica imediata, leia-se o sector Turismo, quase de certeza que o seu Património vai sair menorizado, distorcido, desgastado e a breve prazo destruído, deixando de ter hipóteses de consolidação da sua Memória, que é uma das suas características fundamentais, uma certa eternização sustentável. Ainda que se criem situações artificiais de aparente qualidade, quase sempre em volta de mistificações elas não passarão de uma moda passageira. Os bocados de cópias de património mundial existentes em casinos e hotéis de Las Vegas ou de Macau são uma aberração pseudocultural, que aliás prefigura uma situação de roubo de Património Cultural alheio, pois Veneza ou o Vaticano não ficam para aqueles lados e de certeza que os seus promotores destruíram ou apagaram a memória local dos ameríndios ou dos portugueses. A “praga”, como J. Rentes de Carvalho chamou aos turistas acéfalos que percorrem todo o mundo sem nada realmente verem ou entenderem, talvez temporariamente gostem e paguem essas mistificações, mas Património Cultural é seguramente outra coisa. E esse é que, ou fica e valoriza-se, ou é destruído e desaparece. Cabe aos cidadãos a escolha.
Um dia escreveu Eça de Queirós. «As coisas mais úteis, porém, são importunas e mesmo escandalosas, quando invadem grosseiramente lugares que lhe não são congéneres. Nada mais necessário na vida do que um restaurante: e, todavia ninguém, por mais descrente ou irreverente, desejaria que se instalasse um restaurante com as suas mesas, o seu tinir de pratos, o seu cheiro a guisados – nas naves de Notre-Dame ou na velha Sé de Coimbra» (Eça de Queirós, A Correspondência de Fradique Mendes). O Património Cultural é o respeito criativo para com a Memória dos que nos precederam. Essa criatividade nos limites desse respeito é a Qualidade. Se tal houver temos efetivamente Património Cultural.  
 
J. A Gonçalves Guimarães
Mesário-mor da Confraria Queirosiana

Livros & Revistas

No passado mês de maio foi lançada a 3ª edição de Eça. Uma biografia, de A. Campos Matos, pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda, de novo revista e aumentada, já premiada nas edições anteriores pela Associação Portuguesa de Escritores e pela Associação de Críticos Literários. Tratando-se de uma biografia «onde o biógrafo pôs muito de si próprio, expondo a sua visão pessoal do biografado» e prevenindo que se trata de «um género literário sempre inacabado, sempre em permanente evolução, no caso de Eça em constante mutação», esta obra, complementada pelo Dicionário organizado pelo mesmo autor, ficarão por certo por muito tempo como fundamentais para qualquer abordagem ao universo queirosiano.
Ultimamente este investigador tem-se também debruçado sobre um aspeto inédito da via e obra de Teixeira Gomes, tendo recentemente feito uma conferência sobre este tema na Academia Portuguesa de História, de que é membro honorário. A sua análise debruça-se não tanto sobre os aspetos biográficos mas sobretudo sobre a «apreciação desvairada das artes plásticas» por parte deste antigo presidente da República.




Apresentado no 1.º Encontro Nacional de Literaturismo que decorreu nos dias 30 de junho e 1 de julho no Forte de S. João da Foz do Douro, este Roteiro Literário da Foz, de José Valle de Figueiredo que se apresenta acompanhado de um Mapa Cultural da Foz, apresenta de forma exaustiva os locais relacionados com Camilo Castelo Branco, Eça de Queirós, Ramalho Ortigão, Arnaldo Gama, Raúl Brandão, Guerra Junqueiro e outros cultores literários, para além de artistas, desportistas, políticos e outras personalidades marcantes desde o século XIX.



           

No passado dia 7 de julho foi lançada nas instalações da Quinta da Boeira em Vila Nova de Gaia o número 5 da revista Douro. Vinho, História & Património. Wine, History and Heritage, publicada pela Associação Portuguesa de História da Vinha e do Vinho (APHVIN/GEHVID) sediada no Porto e de que é diretor o Prof. Doutor António Barros Cardoso, da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. O presente volume foi apresentado pela Prof.ª Doutora Helena Pina da mesma faculdade que se referiu aos vários artigos desta publicação, entre eles o intitulado «O Centro Histórico de Gaia, como estrutura portuária atlântica», da autoria de J. A. Gonçalves Guimarães historiador e professor de Património, tema esse que tem vindo recentemente a ser debatido na comunicação social portuense, sobre os mais variados pontos de vista, por políticos, arquitetos, urbanistas e empresários. Este artigo é uma síntese da carga histórica e patrimonial do sítio, normalmente tão ignorada quanto distorcida.




No passado dia 12 de julho no salão nobre do Museu Nacional de Arqueologia em Lisboa foi lançado um novo livro do egiptólogo Luís Manuel de Araújo pela editora A esfera dos livros, intitulado Os Grandes Mistérios do Antigo Egito, apresentado pelo Doutor Telo Ferreira Canhão, egiptólogo e investigador do Centro de História da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Muitos são os aspetos ainda não desvendados sobre esta civilização milenar passados que são dois mil anos sobre a sua dissolução noutras realidades políticas desde o Império Romano até aos nossos dias que o autor aborda com o seu habitual rigor científico numa prosa suscetível de agradar a todos os seus leitores.




Chegou-nos recentemente às mãos o livro Diferenças e Semelhanças do Património Europeu, obra coletiva editada pela Onda Verde – Associação Juvenil de Ambiente e Aventura, sediada em Avintes, Vila Nova de Gaia, com prefácio e revisão histórica de Paulo Costa, onde são mostrados ruínas, edifícios e outros aspetos potenciais do Património edificado de Avintes e monumentos, museus e outros aspetos de Bucareste, Roménia (em inglês); Teo, Espanha (em castelhano) e Teramo, Itália (inglês e italiano). Aquele historiador elaborou os textos que contribuem para a memória dos elementos construídos avintenses.




O CITCEM – Centro de Investigação Transdisciplinar Cultura, Espaço e Memória da Faculdade de Letras da Universidade do Porto editou as comunicações apresentadas no colóquio A História da Educação em Vila Nova de Gaia, o qual decorreu a 20 de maio de 2016 no Arquivo Municipal de Vila Nova de Gaia. Dos nove estudos publicados neste volume, seis são de membros do Gabinete de História, Arqueologia e Património dos ASCR-Confraria Queirosiana, sediado no solar Condes de Resende, a saber: «A rede escolar protestante em Vila Nova de Gaia (1868-1930): uma panorâmica geral», por António Manuel S. P. Silva e José António Afonso; «A Educação em Vila Nova de Gaia (1880-1930): Projeto e balanço do estudo doutoral», por Eva Baptista; «A escola primária gaiense durante o Estado Novo na obra literária de Afonso Ribeiro e J. Rentes de Carvalho», por J. A. Gonçalves Guimarães; «A educação feminina pelas Belas Artes na sociedade de Oitocentos», por Susana Moncóvio; «As “escolas operárias” em Vila Nova de Gaia» por Licínio Santos; «Contributos educativos da Companhia de Fiação de Crestuma (Lever) para o ensino em Vila Nova de Gaia» por Fátima Teixeira.

Publicada pelo Abientes – Centro de Documentação e Investigação em História Local, será em breve lançada a brochura de Eva Baptista sobre A Festa escolar em Avintes na aurora do século XX, autora que se tem vindo a dedicar ao estudo da História da Educação em Portugal a partir de Vila Nova de Gaia, neste caso esta antiga tradição republicana do culto cívico pela natureza e pela metáfora do crescimento sustentado e útil das árvores e das crianças ambas amparadas pela escola como mater virtuosa da cidadania.



Palestras e eventos culturais

III.º Colóquio do Lumiar
No passado dia 15 de julho decorreu no auditório do Museu do Teatro em Lisboa o III.º Colóquio do Lumiar organizado pela Junta de Freguesia do Lumiar, Centro Cultural Eça de Queiroz/Telheiras/Escola Secundária Eça de Queirós, sob a coordenação de Fernando Andrade Lemos e com diversas intervenções.

Conferências do Noroeste
            No passado dia 20 de julho decorreu no auditório da Caixa de Crédito Agrícola – Caixa do Noroeste, em Viana do Castelo, a última de um primeiro ciclo de conferências mensais que ali decorreram praticamente durante um ano organizadas pela Associação Portuguesa de História da Vinha e do Vinho (APHVIN/GEHVID) com o patrocínio daquela instituição. A conferência de encerramento foi proferida por J. A. Gonçalves Guimarães intitulada «O Minho na obra de Eça de Queirós».

Palestras do Solar
         Prosseguem no Solar Condes de Resende na próxima quinta-feira, dia 27 de julho as habituais palestras da última quinta-feira do mês. Desta feita será palestrante J. A. Gonçalves Guimarães que falará sobre «Escritores de Gaia para ler no verão».

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Eça & Outras, III.ª série, n.º 104 – terça-feira, 25 de julho de 2017; propriedade dos Amigos do Solar Condes de Resende - Confraria Queirosiana; C.te. n.º 506285685 ; NIB: 0018000055365059001540; IBAN: PT50001800005536505900154; email: queirosiana@gmail.com; www.queirosiana.pt; confrariaqueirosiana.blospot.com; eca-e-outras.blogspot.com; vinhosdeeca.blogspot.com; coordenação da página: J. A. Gonçalves Guimarães (TE-638); redação: Fátima Teixeira; inserção: Licínio Santos; colaboração: A. Campos Matos.