terça-feira, 25 de junho de 2019

Eça & Outras, terça-feira, 25 de junho de 2019


Homenagens a Maria Alberta e Sofia, duas mulheres poetas
         A Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia iniciou no mês de junho duas homenagens a duas mulheres poetas contemporâneas. No primeiro caso, Maria Alberta Rovisco Garcia Menéres, aqui nascida em 1930, professora, autora e apresentadora de programas infantis na RTP, mas também tradutora de clássicos de Literatura para a Infância e Juventude e autora consagrada nessa área, sendo Ulisses o seu livro mais conhecido, com várias edições e reimpressões. Foi também poeta maior consagrada em antologias internacionais. Tendo falecido no passado dia 15 de abril, já não esteve presente no programa “Rosto das Letras” que a autarquia lhe dedicou, com uma exposição retrospetiva da sua obra exposta na Biblioteca Pública Municipal (a quem ficaria bem o seu nome) até 29 de junho.
         No passado dia 14 de junho o Arquivo Municipal de Vila Nova de Gaia prestou também uma homenagem a Sophia de Mello Breyner Andresen, de quem ostenta o nome, com uma sessão pública e a abertura de uma exposição intitulada “Um Porto a Sophia Andresen”, a que se seguiu uma noite com a sua poesia acompanhada ao piano, bem assim como e testemunho de vários dos seus descendentes e familiares, na vizinha Casa Museu Teixeira Lopes. Tendo nascido no Porto em 1919 e morrido em Lisboa em 2004, a sua vida e obra estão indissoluvelmente ligadas à Praia da Granja, em S. Félix da Marinha, Vila Nova de Gaia, onde ainda existe a casa onde habitou, pensou e escreveu.
Independentemente da singularidade da vida e obra de cada uma destas duas mulheres poetas, existem em ambas algumas convergências ancestrais que por certo as marcaram. Para além da sua íntima ligação a Gaia, por variados locais e afetividades, ambas descendiam de famílias de negociantes da praça do Porto em ascensão no século XIX, com instalações e negócios no município gaiense, no primeiro caso, de Clemente Menéres, produtor, industrial e exportador de cortiça, azeite e vinhos de Trás-os-Montes e Alto Douro, no segundo caso do dinamarquês João Henrique Andresen, de cuja importância como armador de navios, negociante e industrial adiante falaremos. Destas atividades familiares, restou a memória de vinho do Porto com nome de família (Andresen; Menéres), mas tal está muito longe de representar o universo de negócios a que os seus antepassados se dedicavam. Para ambas o apego ao Mar e ao seu convite à viagem foi fundamental, bem assim como a revisitação dos antigos heróis de uma Grécia idealizada. Como é sabido, em ambas houve a preocupação pela formação das novas gerações, tendo elevado a Literatura para a Infância e Juventude a um patamar maior.
Regressando a Sofia, na referida sessão evocativa tive ocasião de recordar o que é que os Andresen têm a ver com Vila Nova de Gaia, muito para além da tal marca de vinhos que ainda existe. João Henrique Andresen, seu antepassado chegado a Portugal por volta de 1840, em 1845 já tinha a sua empresa de navegação para diversos destinos, sobretudo Manaus no Brasil, para onde exportava, primeiro através de veleiros e depois de vapores, muitos produtos portugueses e estrangeiros, como o cimento Portland, e de onde importava borracha e outros produtos locais. Comprou entretanto uma vastíssima propriedade na Afurada, conhecida por Quinta ou Tapada do Andresen, de onde poderia ver os seus navios entrarem e saírem a barra do Douro, na qual instalou uma fábrica de Moagem e Destilaria e uma Destilaria de Combustíveis Fósseis (refinaria de petróleo). No atual Centro Histórico de Gaia, na Praia da Cruz, possuía tanoaria, caixotaria e oficina de produção de aduelas, com máquina a vapor e as primeiras a serem iluminadas com eletricidade montada pela empresa de Emílio Biel em três armazéns onde igualmente acolhia as suas importações e de onde expedia as exportações de aguardente, azeite, vinhos licorosos e comuns vindos das suas quintas do Douro, para o que possuía também uma prancha de embarque exclusiva.
Tendo falecido em Lisboa no seu palácio, que fora dos Condes de Penafiel, em 1894, J. H. Andresen foi trasladado para o Porto onde ficou sepultado no Cemitério de Agramonte num imponente e simbólico jazigo da autoria do escultor António Teixeira Lopes, com cujo pagamento o escultor mandou construir a Casa-Museu que hoje conhecemos com o seu nome onde se realizou esta sessão evocativa. Entretanto os seus herdeiros adquirem uma casa na Granja, que mandam aformosear, tendo passado a frequentar aquela praia a partir de 1887. Deste convívio resultou o casamento do pai de Sofia (J. H. Andresen III) com uma das filhas do 4.º conde de Mafra, Tomás de Mello Breyner. Naquela casa da Granja, entretanto vendida à família Cabral em 1925, viria a falecer em 1934 D. Emília de Castro Pamplona, mulher de Eça de Queirós e, talvez por isso, quando em 2007 foi demolida apareceu erradamente designada na imprensa como “a casa de Eça de Queirós”, que efetivamente também veraneou nesta praia com seus pais, irmãos, amigos e familiares da futura noiva, mas que nunca aí (nem em qualquer outro lado) possuiu qualquer propriedade, a não ser em comunhão de bens.
A Granja de Sofia era também frequentada por outras figuras literárias, hoje geralmente esquecidas: para além de Pedro Homem de Mello, ali conviveu com António Miguel da Silva Vasconcelos Porto (o poeta António-Além, curiosamente da família proprietária do palacete onde hoje está instalado o arquivo com o seu nome) e sobretudo com António Eugénio Ramos Pinto Calém (o poeta António Lousada) este último, para além de referir tal convívio nas suas memórias, escreveu muitos dos versos cantados por Teresa de Noronha, João Braga e outros fadistas.
À poesia de Sofia, única por certo, mas também à daqueles seus vizinhos das ondas da Granja e da vida, se poderá aplicar o que Eça disse sobre outros poetas: «…naquelas almas, todo o século com as suas dúvidas, as suas lutas, as suas incertezas, as suas tendências, as suas contradições, se retrata. São grandes almas sonoras onde vibra em resumo toda a vida que as cerca. Estuda-se ali, como num sumário, a existência de uma época» (Eça de Queirós, O francesismo).

J. A. Gonçalves Guimarães
mesário-mor da Confraria Queirosiana



Confrade Queirosiano agraciado
         O júri da 15.ª edição do Prémio Eduardo Lourenço, constituído pelo presidente da Câmara Municipal da Guarda, os reitores das universidades de Coimbra e Salamanca, como membros da comissão científica e executiva do Centro de Estudos Ibéricos (CEI) com sede naquele município, e também pelos membros convidados Emílio Rui Vilar e Rui Vieira Nery, pela Universidade de Coimbra, e Maria Ángeles Pérez López e Lúcia Rodil, pela Universidade de Salamanca, distinguiram este ano o Professor Doutor Carlos Reis com o referido prémio no valor de 7.500 euros. Investigador e professor universitário especializado em Eça de Queirós e José Saramago, para além de outros estudos sobre Literatura Portuguesa e de Teoria Literária com ampla divulgação, não apenas em Portugal e Espanha (proferiu uma conferência sobre “Dinâmicas da Personagem: o Projeto Figuras de Ficção” no passado dia 19 de junho na Universidade de Cáceres), mas também na restante Europa, Brasil e Estados Unidos. Publicou numerosos ensaios e livros sobre estas matérias, sendo ainda coordenador da História Crítica da Literatura Portuguesa e da Edição Crítica da Obra de Eça de Queirós.

Eventos passados 
Dia de Itália
            Como habitualmente, decorreu no passado dia 2 de junho na Pousada do Palácio do Freixo, no Porto, as celebrações do Dia Nacional de Itália, organizadas pelo Consulado desta cidade, que tem como cônsul Paolo Pozzan, e pela Associazione Socio-Culturale Italiana del Portogallo Dante Allighieri, de que é presidente o general Ângelo Arena, tendo presidido o embaixador de Itália em Portugal, Uberto Vanni d’Archirafi. Também presentes, em nome próprio ou em representação de diversas instituições vários confrades queirosianos.

O Nosso Cônsul em Havana
            No passado dia 7 de Junho estreou na RTP 1 o primeiro episódio de uma série de treze intitulada “O Nosso Cônsul em Havana”, a qual, aliando a ficção à documentação, relata a passagem de Eça de Queirós por Cuba, então colónia espanhola, onde chega, como cônsul português, em dezembro de 1872.
         Realizada por Francisco Manso, com o apoio da Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, a série mostra como, “exorbitando de funções”, o escritor melhorou a vida de milhares de escravos chineses ali desembarcados para trabalharem como escravos nas fazendas de cana-de-açúcar. Desse seu conhecimento e acção resultou o ensaio que viria a ter o título A Emigração como Força Civilizadora, apenas publicado em livro em 1979 por Raúl Rego, e O Mandarim, publicado em livro logo em 1880. Esta série vem assim divulgar uma faceta pouco conhecida da vida de Eça de Queirós e da sua humanística ação também plasmada nas obras atrás referidas.

Cursos, conferências e palestras
A Utopia do Padre Himalaia
         No próximo dia 27 de junho pelas 21,30 horas, nas habituais palestras das últimas quintas-feiras do mês no Solar Condes de Resende, o Professor Doutor Jacinto Rodrigues, catedrático jubilado da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto, vai falar sobre “A Utopia do Padre Himalaya” (1868-1933), a partir da sua obra A Conspiração Solar do Padre Himalaya, edição Árvore, Porto, 1999, um dos maiores inventores portugueses, precursor dos movimentos ambientalistas.

Ao Andresen em Vila Nova de Gaia
         A palestra sobre “Os Andresen em Vila Nova de Gaia” acima referida (ver texto editorial desta página) será de novo apresentada também no Solar Condes de Resende, na quinta-feira, 29 de agosto próximo.

Cursos do Solar:
Azulejaria de Fachada
          No próximo dia 21 de setembro vai decorrer no Solar Condes de Resende uma formação em Azulejaria de Fachada ministrada pelo Prof. Doutor Francisco Queiroz, conhecido investigador e professor com diversas obras publicadas sobre esta temática, a qual decorrerá ao longo de sete horas, aberta a todos os interessados, que pagarão 35€ ou 45 € conforme se trate de sócios ou não sócios da associação Amigos do Solar Condes de Resende – Confraria Queirosiana.



Revoluções e Constituições
         Organizado pela Academia Eça de Queirós, o grupo de trabalho da ASCR-CQ para a investigação e ensino, com início previsto para 19 de outubro, vai decorrer no Solar Condes de Resende o curso “Revoluções e Constituições”, comemorativo dos 200 anos da Revolução de 1820. Do elenco de professores constam docentes das universidades do Minho, Porto, Coimbra e Nova de Lisboa e de outras instituições académicas, nomeadamente António Barros Cardoso, Eduardo Vítor Rodrigues, Fernando Rosas, J. A. Gonçalves Guimarães, Jorge Fernandes Alves, José António Oliveira, Manuel Loff, Pedro Aires Oliveira, Pedro Bacelar de Vasconcelos, Nuno Resende e Vital Moreira.
Este curso será certificado pelo Ministério da Educação através do Centro de Formação de Associação de Escolas Gaia Nascente. O calendário do curso e o boletim de inscrição serão divulgados em breve

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Eça & Outras, III.ª série, n.º 130, terça-feira, 25 de junho de 2019; propriedade dos Amigos do Solar Condes de Resende - Confraria Queirosiana; C.te. n.º 506285685; NIB: 0018000055365059001540; IBAN: PT50001800005536505900154; email: queirosiana@gmail.com; www.queirosiana.pt; confrariaqueirosiana.blospot.com; eca-e-outras.blogspot.com; vinhosdeeca.blogspot.com; coordenação da página: J. A. Gonçalves Guimarães (TE-164 A); redação: Fátima Teixeira e Amélia Cabral; inserção: Licínio Santos.