terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Eça & Outras

Mar bravo

Foi há dias apresentado o mapa “Portugal é Mar” como um dos desígnios territoriais que vão orientar a vida dos portugueses para o futuro. Andamos nisto desde sempre, ou, pelo menos, desde que no século XIV fomos às Canárias e depois por esse mar aí fora. Não, este mapa não é, nem pode ser, o “Portugal não é um país pequeno” do tempo do Estado Novo que tínhamos pendurado na parede da escola primária e em que as colónias portuguesas se sobrepunham a uma Europa inteira quase até aos Urais.
Mas isto de ter mar implica duas pequenas verdades que os soldados de Monsieur de La Palice não desdenhariam: ele há que ter marinheiros; ele há que ter embarcações. Sem isso restam-nos as inúteis gaivotas, a que sempre poderemos chamar nossas, pois ninguém as quer. E o anticiclone dos Açores, que também é de graça. O resto tem-nos custado muito dinheiro.
Sobre a nossa marinha de guerra, face às realidades de hoje, já estaremos longe deste texto de Eça de Queirós, com quase 150 anos: «…uns poucos de navios, velhos, decrépitos, defeituosos, quase inúteis, sem artilharia, sem condições de navegabilidade, com cordame podre, mastreação carunchosa, e história obscura. É uma marinha inválida…». Sobre as corvetas da frota «Há ideia de as alugar – como hotéis. A nossa esquadra é uma colecção de jangadas – disfarçadas! Este grande povo de navegadores acha-se reduzido – a admirar o vapor de Cacilhas.
Têm um único mérito estes navios perante uma agressão estrangeira: impor pelo respeito da idade. Quem ousa atacar as cãs de um velho?» (As Farpas [Julho de 1871], I, 2004, 117). Hoje já estamos melhor, senão em quantidade, pelo menos em qualidade.
Um dos maiores equívocos sobre o Portugal marinheiro tem sido alimentado pela classe plumitiva: não há almirante reformado que, após longo tempo na “nau de pedra” (Ministério da Marinha), não se meta a historiar sobre as façanhas da nossa frota guerreira, e nicles sobre a nossa frota mercante e pesqueira (com exceção da do bacalhau), aquela que do mar realmente nos trouxe trabalho, proveito, pão e sardinhas e poucos dissabores. Mas os filhos, netos e bisnetos dos Gamas e Cabrais, arrumado no canto da sala de estar o pote de porcelana da China trazido como recuerdo das façanhas navegadoras, enjoaram de tal modo que não querem mais ouvir falar de barcos. Querem exemplos? Olhem à vossa volta: a cidade do Porto, por exemplo, que tudo, perdão TUDO, deve ao mar e à sua frota mercantil, não tem sequer um museuzito naval, e quando o pôde criar, por insistência do saudoso Lixa Filgueiras, fez um Museu dos Transportes… Terrestres, não fosse alguém querer atracar, mesmo de graça, um velho rebocador no cais da Alfândega. Explicações? Para mim foi enjoo de mar. Chegam-lhes os rabelos de Gaia no dia de S. João a fugirem da barra com as velas enfunadas. Mas valha-nos, para além do Museu da Marinha (de Guerra) em Lisboa, e pouco mais, ao menos Ílhavo e Vila do Conde com os seus museus que nos não envergonham, os quais estão muito bem divulgados numa recente obra sobre todos os museus navais ibéricos publicada… pelos espanhóis, também eles grandes pândegos neste assunto, pois o seu Museu Marítimo Nacional é em Madrid, que é sítio onde também as gaivotas chegam à procura de lixeiras. Não existem em Portugal praticamente estudos sobre a nossa marinha mercante; a arqueologia subaquática, depois de episódios pouco edificantes paridos nos anos noventa no Parlamento com um deputado em conluio com um pirata americano, parou na Ria de Aveiro e pouco avançou para norte. Os nossos naufrágios históricos, tal como o nosso peixe, continuam pois à mercê de quem tiver barcos e licenças para os pescar.
Todos os anos ouvimos que se vão deitar ao mar milhões de euros transformados em camiões de areia e de pedra para “repor a linha de costa”, e isto para proteger construções privadas ou públicas, a maior parte delas, se não tolas, pelo menos de duvidosa ou comprovada ilegalidade à luz da legislação que desde 1863 se produziu para ordenamento da orla marítima e fluvial, teimosia essa a que o mar oferece sonoras gargalhadas no inverno seguinte.
Existem estudos sólidos e credíveis para os decisores nacionais, regionais e locais saberem com segurança onde estará o nível do mar daqui por cinquenta ou cem anos e declararem de vez a zona costeira atual abaixo dessas cotas como zona de calamidade pública com as devidas consequências a assumir pelo Estado e pelos privados.
Mas ninguém de tal quer saber e por isso vamos continuar a brincar aos castelos na areia que a próxima invernia se encarregará de desfazer de novo. E assim se gasta o nosso dinheiro.
Para olhar por este nosso mar são precisos então barcos, aviões e submarinos. Mas não há unidade deles que se construa ou compre sem que tal dê origem a um romance policial caríssimo para o erário público. Será que também aqui estaremos ainda quase como no tempo de Eça: «O Índia, o melhor navio que temos, o navio novo, expressamente feito para uso do país, comprado com madura reflexão, examinado com escrupulosa ciência, glória da nossa marinha, defesa das nossas colónias, garantia da nossa honra, o Índia que sábias comissões aprovaram, que uma reta imprensa exaltou, que professores da Escola Normal celebraram, que é o nosso transporte para a Índia, que custou muitas mil livras, que é novo, perfeito, impecável, o Índia, - mete apenas cinco polegadas de água por dia!» (As Farpas [Janeiro de 1872], II, 2004, 329). Claro que no tempo de Eça os submarinos ainda estavam a nascer e por isso ele não fala neles. O escritor, que diabo, não pode prever tudo
Mas também não vamos longe no mar com aqueles marinheiros sessentões, com imponentes chapéus de pala com estrelas douradas, com iate ancorado em marina com amarras cuja laçada raramente se larga, cuja navegação se resume à leitura balançada do jornal de fim de semana enquanto bebem o seu whisky e um pescador local à espera de melhores dias lhes limpa o convés por meia dúzia de euros. É “isto” que se tem semeado pelos melhores atracadouros da costa.
Muito gostaríamos que o «Tanto mar! Tanto mar!» da canção de Chico Buarque da Holanda não servisse só para surfistas, fotógrafos, praiistas do lume brando do sol de verão, os poetas e os idealistas. É que não se exportam nem ondas, nem fotos amadoras, nem tempos de papo para o ar, nem versos, nem fantasias. Terão de ser outros os desígnios para Portugal “voltar ao mar”, se possível com uma nova geração que ainda não tenha “enjoado”. Então o mapa estará certo e será útil.

J. A. Gonçalves Guimarães
mesário-mor

Livros, textos e programas

O Solar nos Caminhos da História

fotografia Porto Canal

Hoje, dia 25 de fevereiro, o Porto Canal apresenta no programa “Caminhos da História” do historiador Joel Cleto, uma reportagem sobre o Solar Condes de Resende e Eça de Queirós, e entrevistará em estúdio Isabel Pires de Lima e J. A. Gonçalves Guimarães sobre a Vida e Obra do nosso patrono. O programa será depois repetido em outros horários e ficará disponível na Internet.





Portugal. A Flor e a Foice


Aproximando-se a data em que o “25 de Abril” faz 40 anos, e não sendo o facto ainda História por falta do necessário distanciamento cronológico, convém ler um dos textos mais lúcidos, mais claros, mais exemplares do que foi e do que poderia ter sido o “25 de Abril” escrito em 1978 por J. Rentes de Carvalho e agora disponível em português em tempocontado.blogspot.com, intitulado “Tomada de Consciência em Portugal” enquanto se aguarda para daqui a dias o livro Portugal. A Flor e a Foice, a publicar em março pela Quetzal. Este autor esteve no mês de Fevereiro no Correntes d’Escritas na Póvoa de Varzim a convite da organização, onde conviveu com esotéricos e umbiguentos autores. Sobre o assunto ver o mesmo blogue.


Telheiras Cadernos Culturais

Acaba de sair o n.º 6, segunda série, referente a Novembro de 2013, desta revista editada pelo Centro Cultural Eça de Queiroz, Escola Secundária Eça de Queirós e Centro Cultural de Telheiras, dirigida por Fernando Andrade Lemos, com abundante colaboração de temática queirosiana, nomeadamente “Eça de Queirós e o Museu Egípcio do Cairo” de Luís Manuel de Araújo; “Eça de Queirós bem-amado no Brasil” de César Veloso; e “A formação iniciática de Maria Eduarda Maia” de Fernando Andrade Lemos e Rita Rebelo Andrade Lemos.





Revista Montepio

A edição de inverno 2013 da Revista do Montepio, que distribui 400.000 exemplares, é dedicada a Eça de Queirós, apresentando no interior um artigo de Elsa Garcia sobre a opinião de Fernando Pinto do Amaral, diretor do Plano Nacional de Leitura sobre a atualidade de Os Maias e o recente filme inspirado nesta obra realizado por João Botelho. Entretanto nas tertúlias queirosianas desenvolvidas pelos nossos confrades há uma questão à procura de uma boa e documentada resposta: quem foi a senhora que teve um filho do 5.º Conde de Resende, o companheiro de Eça à Terra Santa em 1869, ano em que a criança nasceu? Porque é que a família a apagou dos registos genealógicos? Em que factos reais Eça se inspirou para a questão do incesto em Os Maias? Mais uma vez a realidade pode ser mais fantástica do que a fantasia, neste caso, literária.


Roteiros queirosianos

Leiria: Eça 2014

A Câmara Municipal de Leiria apresentou recentemente o programa Eça 2014 em torno do romance O Crime do Padre Amaro, quase com 140 anos de publicação e talvez a obra que até hoje mais contribuiu para a mudança de mentalidades em Portugal. Em 2013 decorreram visitas ao Centro Histórico pelos cenários que o escritor descreve naquela obra, as quais irão continuar no presente ano. O programa conta com recriações de Leiria no século XIX, concertos musicais, teatro de rua, gastronomia de evocação queirosiana, um desfile com cerca de mil figurantes que irão recordar os tempos de Eça em Leiria nos dias 21 de maio e 1 de junho, e um baile da época no Mercado de Santana naquele primeiro dia. A Confraria Queirosiana irá divulgando a todos os sócios os pormenores deste programa.

500 anos do Foral de Ovar

No passado dia 10 de fevereiro decorreram em Ovar as comemorações dos 500 anos do seu foral manuelino, bem assim como os de Pereira Jusã e de Cortegaça, as quais se iniciaram com uma mostra documental na Biblioteca Municipal, a que se seguiu um encontro evocativo aberto por Salvador Malheiro, presidente da edilidade, e por S.A.R. o Duque de Bragança, Senhor Dom Duarte, comissário da evocação. Foram oradores Silvestre Lacerda, diretor da Torre do Tombo e Francisco Ribeiro da Silva, professor jubilado da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Para além destes conferencistas estiveram também presentes José Manuel Tedim, J. A. Gonçalves Guimarães e Susana Moncóvio dos corpos gentes da Confraria Queirosana e do seu Gabinete de Historia, Arqueologia e Património e da Academia Eça de Queirós.

O Egito na Europa

Todos os anos o Instituto Oriental da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa organiza, durante as férias da Páscoa, uma visita ao Egito liderada pelo nosso vice-presidente e diretor da Revista de Portugal, Prof. Doutor Luís Manuel de Araújo.
No presente ano, devido à insegurança que se faz sentir naquele país provocada por grupos extremistas islâmicos que atacam pacíficos turistas, esta 15ª viagem estender-se-á pela Europa em visita a museus com coleções egípcias.
Assim, entre 13 e 23 de Abril, os participantes irão de Lisboa a Berlim, e daí a Osnabruck, Hannover, Haia, Leiden, Gent, Paris, Londres e de novo regresso a Lisboa. Durante o trajeto serão feitas curtas palestras sobre civilização egípcia, os museus e as coleções visitadas. Como habitualmente, e por especial deferência daquele Instituto e daquele professor membro da academia Eça de Queirós, a viagem estará aberta à participação de membros da Confraria Queirosiana até ao limite das inscrições disponíveis.

Mercado solidário

No passado dia 22 de fevereiro a Federação Portuguesa das Confrarias Gastronómicas organizou no Cais de Vila Nova de Gaia, com a colaboração do Município, um Mercado Solidário cujo apuro se destinou à CerciGaia e à APPACDM.
Participaram numerosas confrarias com os seus produtos tradicionais e também a Confraria Queirosiana, com as suas edições e o seu Vinho do Porto.
No final deste dia de convívio e solidariedade o crítico de cinema Mário Augusto e a vereadora Elisa Cidade entregaram os donativos das confrarias às referidas instituições.
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Eça & Outras, IIIª. Série, n.º 66 – terça-feira, 25 de fevereiro de 2014
Cte. n.º 506285685 ; NIB: 001800005536505900154
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