quinta-feira, 25 de julho de 2024

 

Eça & Outras, quinta-feira, 25 de julho de 2024

500 anos do nascimento de Luís de Camões;

100 anos do passamento de Teófilo Braga

 

500 anos da Rua das Flores no Porto

 

No passado dia 15 de julho o Museu da Misericórdia do Porto (MMIPO) celebrou os seus nove anos de existência com o lançamento de duas obras de excecional importância para a memória da instituição, do espaço onde se implantou, e da própria História da Cidade do Porto. À cerimónia estiveram presentes o Provedor da Misericórdia, Dr. António Tavares, o Presidente da Comissão Organizadora das Comemorações dos 500 anos da Rua das Flores, Professor Doutor Francisco Ribeiro da Silva, a Diretora da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Professora Doutora Paula Pinto Costa, a Coordenadora Científica do CITCEM, Professora Doutora Inês Amorim, o Provedor da Misericórdia de Gaia, Dr. Manuel Moreira, representantes de diversos outros organismos e personalidades a título pessoal e o presidente da associação Amigos do Solar Condes de Resende – Confraria Queirosiana e outros confrades, alguns dos quais autores de textos nos livros apresentados.

         Associando-se à celebração dos 500 anos da abertura da Rua de Santa Catarina das Flores, atual das Flores (1521-2021) a Faculdade de Letras da Universidade do Porto, através do seu Centro de Investigação Transdisciplinar Cultura Espaço e Memória (CITCEM) e a Santa Casa da Misericórdia do Porto, através do Museu da Misericórdia do Porto (MMIPO) estabeleceram um protocolo de colaboração científica que realizou o Colóquio Internacional A Rua na Estrutura Urbana e a Exposição Rua das Flores: Passagem e Permanência, dos quais foram agora lançadas em livro uma seleção das comunicações no volume História da Arquitetura. Perspetivas Temáticas (III). A Rua na Estrutura Urbana, editado pelo CITCEM, e o catálogo Rua das Flores 500 anos. Passagem e Permanência 1521-2021, editado pelo MMIPO.

         A primeira obra foi apresentada pelo Prof. Doutor Manuel Joaquim Moreira da Rocha, Professor Associado de História da Arte e um dos seus coordenadores, que salientou que desde o século XVIII esta rua «…foi conquistando o estatuto de rua comercial de artigos sumptuários e de luxo, influenciando a dinâmica comercial da cidade». Apresentando os resultados da investigação do grupo «Património Material e Imaterial» do CITCEM, a obra tem colaboração de investigadores das universidades de Barcelona, Berna, Brandenburg, Coimbra, Católica Portuguesa – Porto, Complutense de Madrid, Hamburg, Lisboa, Málaga, Nápoles Federico II, Nova de Lisboa, Oviedo, Politécnico de Viseu, Porto (Faculdades de Arquitetura e de Letras), Santiago de Compostela e Udine, para além de profissionais da História, da Arqueologia, do Património e da Arquitetura da Câmara Municipal do Porto e da Misericórdia de Barcelos e alguns outros a título pessoal. Pelas suas quinhentas páginas passam muitos estudos sobre Urbanismo e matérias associadas em várias cidades e também nesta rua emblemática, numa boa metodologia comparativa pelo universo europeu ou de influência europeia, de casos similares em Barcelona, Calábria, Compostela, Ferrara, Granada, Guimarães, Lisboa, Mileto, Nápoles, Palma, Pontevedra, Recife, Udine, Vila do Conde e Viseu.

Ainda que integrados noutras instituições, também neste volume participaram diversos associados e confrades membros do Gabinete de História, Arqueologia e Património dos Amigos do Solar Condes de Resende – Confraria Queirosiana, ou professores nos seus cursos livres, de que destacamos Francisco Ribeiro da Silva – A Rua das Flores, palco privilegiado de rituais urbanos e da religiosidade fora dos templos (séculos XVI-XIX); Laura Sousa – Arqueologia na Rua das Flores, Porto (2000-2021); (com Manuela Ribeiro, Carla Stockler e Sérgio Gomes); e Nuno Resende, co-coordenador do volume.

A segunda obra, por natureza mais monográfica, foi apresentada pelo Prof. Doutor Nuno Resende, professor da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, também ele, com o apresentador da obra anterior, coordenadores científicos deste «catálogo [que] é uma homenagem à emblemática rua do Porto, que há cinco séculos liga história, arte e cultura» e que teve coordenação geral do Doutor José Ferreira e Silva da SCMP. Na sua apresentação destacou que «…a cidade do Porto ganha uma obra absolutamente inédita e importante na sua História e até na historiografia portuguesa (…). Depois, porque a História da cidade, conquanto tenha uma longa genealogia de estudos históricos, a prevalência do amadorista sobre o científico tem trazido o pitoresco, o anedótico e a curiosidade por vezes mórbida sobre a cidade e seus cidadãos, algo que cada vez mais se evidencia como supérfluo e desnecessário num universo de visitantes que não procuram apenas o óbvio. A História da Cidade é suficientemente rica, interessante e densa, sem que seja necessário transformá-la em estória».

Como na obra anterior, também nesta participaram diversos profissionais queirosianos: Francisco Ribeiro da Silva - Apresentação; A cidade do Porto e o poder central nos tempos de D. Manuel I. A Confraria da Misericórdia; Notas sobre o Regimento do Hospital de D. Lopo de Almeida; O Bairro da Rua das Flores; Inês Vinagre – Papelaria Araújo & Sobrinho; Livraria Chaminé da Mota; Pérola da Índia; Banco Carregosa; J. A. Gonçalves Guimarães – A Rua das Flores no período constitucional; e Nuno Resende – Introdução. Rua das Flores Passagem e Permanência (com Manuel Joaquim Moreira da Rocha); Pintura representando Santa Catarina; «Rua de ourives e poetas»: a Rua das Flores nos séculos XIX e XX; O Álbum da Santa Casa da Misericórdia do Porto (1891); Desenho representando o Largo da Feira e a Porta de Carros (com MJMR); A arte urbana na Rua das Flores; Edifício Mota & Faria, Lda.; Papelaria Reis Cidade das Profissões.

Se é certo que a Rua das Flores do Porto, com o seu meio milénio, não teve nunca «armazéns servidos por três mil caixeiros», nem «mercados onde se despejam os vergéis e lezírias de trinta províncias», nem «bancos em que retine o ouro universal», nem «fábricas fumegando com ânsia, inventando com ânsia», nem «bibliotecas abarrotadas, a estalar com a papelada dos séculos» e hoje, como outrora, continua a ter todos os dias «…uma vaga humanidade, fervilhando, a ofegar, através da Polícia, na busca dura do pão ou sob a ilusão do gozo» (Eça de Queirós, A Cidade e as Serras), tem, contudo, um inegável caráter único que a presença da Santa Casa da Misericórdia do Porto e do seu Museu trazem das brumas do passado a dar qualidade aos dias de hoje e do futuro.

 

J. A. Gonçalves Guimarães

historiador


Palestras e Conferências

No próximo dia 1 de agosto, quinta-feira, decorrerá a título excecional no Solar Condes de Resende (deveria ser no dia 25 de julho, mas foi adiada para essa data), entre as 18,30 e as 19,30 horas, presencial e por vídeoconferência, uma palestra-concerto sobre Das ruas e dos salões do Império à Era da Rádio: um século de canções do Brasil (1830-1930), pelo historiador Henrique Guedes, com a atuação do grupo musical Eça Bem Dito dirigido pela pianista Maria João Ventura. Para além da lição histórica serão interpretadas canções desde D. Pedro IV incluindo alguns clássicos da música popular brasileira até meados do século passado.

Presença da associação

A associação ASCR-CQ tem marcado a sua presença em diversos acontecimentos culturais desde a última edição desta página: assim, a dois de julho passado o presidente da direção e Maria de Fátima Teixeira, curadores do espólio do escritor J. Rentes de Carvalho, voltaram a casa do escritor em Estevais do Mogadouro onde receberam de suas mãos mais algum espólio pessoal para acrescentar ao já recebido e atualmente em tratamento arquivístico na sede. Na ocasião e dado que igualmente foram tratar da concretização de um roteiro rentesiano que envolverá esta aldeia transmontana, percorreram com o escritor, sua esposa Löeckie Carvalho e o atual proprietário, Dr. Jorge Noronha Alves, a Casa Grande de Estevais, em fase de adaptação do complexo edificado para agroturismo e biblioteca Dr. Armando Pimentel. Seguindo para Moncorvo, sobre o mesmo assunto reuniram ainda com o Dr. Nelson Campos, do Projeto Arqueológico da Região de Moncorvo (PARM), dado que têm em curso um projeto candidato à CCRD-N ainda no presente ano.

No dia oito o presidente da direção esteve presente numa reunião de associações culturais e recreativas na sede da Federação das Coletividades de Vila Nova de Gaia convocada por esta estrutura associativa e pelo jornal O Gaiense, tendo sido dirigida por Paulo Rodrigues, dirigente da primeira e Anabela Carvalho, da redação daquele semanário, para darem conta do andamento dos trabalhos para a concretização do concurso e gala da edição deste ano do Gaia é Fado.

No dia 14 o presidente esteve a representar a associação no Lycée Français International de Porto na comemoração o dia 14 de Julho por convite do Cônsul Honorário de França no Porto, Dr. Manuel Cabral.

No dia 15 o presidente e vários associados e confrades estiveram presentes na Igreja da Misericórdia do Porto no lançamento de duas obras comemorativas dos 500 anos da Rua das Flores (ver editorial e secção Livros)


Nova direção, cumprimenta e reúne

A atual direção da ASCR-CQ, para além da totalidade dos associados, tem vido a apresentar cumprimentos e a solicitar reuniões de trabalho a diversas entidades com quem normalmente tem programas comuns, nomeadamente a Academia Alagoana de Letras, a Assembleia Municipal de Vila Nova de Gaia, a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, a Federação de Amigos dos Museus de Portugal (FAMP), a Federação Portuguesa das Confrarias Gastronómicas, o jornal O Gaiense, os partidos políticos Bloco de Esquerda, CDS-PP, CDU, CHEGA, Iniciativa Liberal, LIVRE, PAN, PSD, e PS, além da vereadora da Cultura e da Programação Cultural da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, Eng.ª Paula Carvalhal e do vereador do Associativismo, Dr. Elísio Pinto, a que outros se seguirão.


Prémios e distinções

Revista de Portugal

Por declaração da Senhora Ministra da Cultura, Professora Doutora Dalila Rodrigues, a edição da Revista de Portugal – 2024, a publicar em novembro próximo e dedicada aos 500 anos de Luís de Camões, aos 100 anos de Teófilo Braga, aos 50 anos do 25 de Abril e à homenagem de Mogadouro a J. Rentes de Carvalho, foi declarada em 18 de julho passado, como «projeto de interesse cultural» podendo os seus patrocinadores «usufruir dos benefícios fiscais previstos no regime de Mecenato Cultural».

Prémio Literário Guerra Junqueiro

Integrado no encerramento das sessões evocativas do centenário da morte de Guerra Junqueiro (1850-1923), no passado dia 7 de julho o presidente da Câmara Municipal de Freixo-de-Espada-à-Cinta, Nuno Pereira entregou ao escritor Mário Cláudio o prémio literário Guerra Junqueiro Lusofonia.

Prémio “Cultura Sustentável – ODS”

         A Federação dos Amigos dos Museus de Portugal (FAMP) acaba de divulgar o regulamento do seu Prémio Cultura Sustentável – ODS, que tem o patrocínio da Fundação Millennium BCP e que «pretende contribuir de uma forma ativa para a promoção de uma Cultura sustentável inspirada pelos desafios propostos nos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da Agenda 2030 das Nações Unidas. Este Prémio visa distinguir projetos e iniciativas desenvolvidos pelos Amigos dos Museus, que, pelo impacto no seu Museu e/ou na comunidade, correspondam à implementação de pelo menos um dos 17 ODS. Podem candidatar-se os Grupos de Amigos dos Museus, associados da FAMP, que poderão contar com a colaboração dos próprios Museus ou de outras entidades, cuja participação seja fundamentada. A apresentação das candidaturas decorrerá entre 2 e 15 de janeiro de 2025.

         São os seguintes os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável: ODS 1 – Erradicar a Pobreza; ODS 2 – Erradicar a Fome; ODS 3 – Saúde de Qualidade; ODS 4 – Educação de Qualidade; ODS 5 – Igualdade de Género; ODS 6 – Água Potável e Saneamento; ODS 7 – Energias Renováveis e Acessíveis; ODS 8 – Trabalho Digno e Crescimento Económico; ODS 9 – Indústria, Inovação e Infraestruturas; ODS 10 – Reduzir as Desigualdades; ODS 11 – Cidades e Comunidades Sustentáveis; ODS 12 – Produção e Consumo Sustentáveis; ODS 13 – Ação Climática; ODS 14 - Proteger a Vida Marinha; ODS 15 – Proteger a Vida Terrestre; ODS 16 – Paz, Justiça e Instituições Eficazes; ODS 17 – Parcerias para a Implementação dos Objetivos.

Para mais informações consultar https://unric.org/pt/objetivos-de-desenvolvimento-sustentavel/

Livros

Diário Incontínuo, de Mário Cláudio

         Publicado pela D. Quixote, Mário Cláudio apresenta aos seus leitores o seu Diário Incontínuo, cuja escrita iniciou em 1958 aos dezasseis anos e que desde então prosseguiu, com algumas interrupções, nesta edição até 10 de setembro de 2019, num diálogo consigo próprio, como é próprio de um diário, embora neste caso, e devido à personalidade multifacetada do autor, seja interessante o leitor procurar descobrir as conversas entre o Doutor Mário Cláudio e o Dr. Rui Barbot Costa. Ligado a uma família de Vila Nova de Gaia, será também interessante acompanhar as suas reflexões sobre o tempo em que foi diretor da Biblioteca Pública local, numa fase de transição entre o acanhado espaço que ocupava na Casa-Museu Teixeira Lopes e a sua transferência para o novo edifício construído de raiz e inaugurado em 1979, de que ficou o livro Cale. Antologia e textos sobre Gaia, de que foi o organizador e prefaciador, publicado pela autarquia em 1976. E depois, muitos mas mundos.

 


Noventações, de César Fonseca Veloso

Dez anos depois de Oitentações, este autor apresentou no passado dia 29 de junho, na Casa do Concelho de Tomar em Lisboa, a sua mais recente obra sobre a mais rente década da sua vida. Apresentado pela Prof.ª Doutora Maria Alexandra Leandro, a sessão contou com momentos de leitura e também musicais a que se associaram diversos familiares e amigos do autor que entre si procuravam alvitrar o título que o livro dos cem anos terá: Cemsações foi o mais sugerido.


ROCHA, Manuel Joaquim Moreira da; RESENDE, Nuno, coordenadores (2024) – História da Arquitetura Perspetivas Temáticas (III). A Rua na estrutura urbana. Porto: CITCEM/ MMIPO, 500 páginas; ver notícia acima.



SILVA, José Ferreira e, coordenação editorial; ROCHA, Manuel Joaquim Moreira da; RESENDE, Nuno, coordenadores científicos (2024) - Rua das Flores 500 anos. Passagem e Permanência 1521-2021. Porto: MMIPO; ver notícia acima

 

ANA MAGALHÃES RODRIGUES, FOTÓGRAFA

Entre 13 e 18 de abril passado decorreu em Matosinhos e no Museu Soares dos Reis no Porto o Congresso «Aurélio de Souza. Mulheres artistas em 1900», em cujas atas, em vias de publicação, Nuno Resende, professor da FLUP e secretário da ASCR-CQ publica o estudo «Ana Magalhães Rodrigues (1869-1937). Uma fotógrafa através da sua fotografia»

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Eça & Outras, III.ª série, n.º 191, quinta-feira, 25 de julho de 2024; propriedade da associação cultural Amigos do Solar Condes de Resende - Confraria Queirosiana (Instituição de Utilidade Pública), Solar Condes de Resende, Travessa Condes de Resende, 110, 4410-264, Canelas, Vila Nova de Gaia; C.te n.º 506285685; NIB: 0018000055365059001540; IBAN: PT50001800005536505900154; email: queirosiana@gmail.com; www.queirosiana.pt; confrariaqueirosiana.blospot.com; eca-e-outras.blogspot.com; vinhosdeeca.blogspot.com; coordenação do blogue e publicação no jornal As Artes Entre As Letras: J. A. Gonçalves Guimarães (TE-164 A); redação: Fátima Teixeira; inserção: Amélia Cabral.







terça-feira, 25 de junho de 2024

 

Eça & Outras, terça-feira, 25 de junho de 2024

 

500 anos do nascimento de Luís de Camões;

100 anos do passamento de Teófilo Braga

 

Ainda o Castelo de Gaia

No Solar Condes de Resende no passado dia 14 de junho decorreu uma sessão das Jornadas Europeias de Arqueologia 2024 sob o tema “O Castelo de Gaia na Antiguidade Tardia”, organizada por esta instituição municipal com a colaboração do Gabinete de História, Arqueologia e Património da associação Amigos do Solar Condes de Resende - Confraria Queirosiana, as quais contaram com comunicações de Andreia Arezes do CITCEM/ Faculdade de Letras da Universidade do Porto, sobre «Perspectivas em torno da Antiguidade Tardia no Noroeste», de André Nascimento, Filipe Pinto, Mário Gonçalves e Sofia Soares, da Empatia – Arqueologia Conservação e Restauro, L.da, sobre «Um batistério no Castelo de Gaia» do século VI, recentemente encontrado nas obras de acompanhamento da instalação de uns mastodônticos elevadores aí em construção e logo desmontado a seguir, não obstante a sua importância civilizacional e de exemplar único a norte do Mondego. Pela minha parte, como arqueólogo que nos anos oitenta do século passado realizou escavações no sítio e também como participante no «Programa de salvaguarda arqueológica a desenvolver para a área do Castelo de Gaia» em realização por aquele Gabinete, apresentei a comunicação «Em busca dos vestígios paleocristãos de Portuscale: as escavações arqueológicas da Igreja do Bom Jesus de Gaia (1989-1992)». Numa rápida alusão lembrei que o cenário deste lugar mítico, para além de cartografia antiga, tem uma excelente e clara gravura datada de 1848 da autoria de Cesário Augusto Pinto que nos permite aferir as alterações urbanísticas desde então aí ocorridas, as mais das vezes, desastrosas. Mas esta área, também conhecida desde longa data pela ocorrência de vestígios arqueológicos que revelam uma longa ocupação desde a Idade do Bronze até à Contemporaneidade, com particular incidência na Antiguidade Tardia, quando estava em curso a difusão do cristianismo, em vez de ações de Arqueologia preventiva, como acontece em lugares idênticos em toda a Europa, apenas tem tido intervenções de emergência ou de salvamento, que as administrações públicas responsáveis pelo Património, a nível nacional, regional e local, e ocupadas por políticos, autarcas, arquitetos, engenheiros e gestores vários, e nunca por arqueólogos, historiadores ou patrimoniólogos com curriculum académico e profissional credíveis, sistematicamente ignoram, menosprezam ou vilipendiam.

Lembrei ainda as escavações do Professor Armando Coelho Ferreira da Silva aí realizadas nos anos oitenta, que então detetaram os vestígios mais antigos do lugar e, no que diz respeito ao Paleocristianismo portucalense neste lugar as antigas referências lendárias que ainda não foram tratadas pela Antropologia ou pela Historiografia, como a lenda de Santa Liberata; a existência de dois bispos portucalenses, um Suevo outro Visigodo; a paróquia de Portucale Castum Antiquum da sé conimbricensis; o mosteiro de Santa Marinha (897); a villa de Portugal entre Mafamude e Coimbrões (922); a sé portucalense de S. Basílio e outras que perpetuaram uma tradição que a Arqueologia vem clarificando. Os resultados das minhas escavações na Igreja do Bom Jesus de Gaia foram entretanto publicados e o melhor do seu espólio esteve mesmo exposto em Ourense em 2017 numa exposição de nível europeu sobre os Suevos. Mas enquanto isso acontecia o Castelo de Gaia, mesmo então classificado como imóvel de interesse público, foi sendo sistematicamente descaraterizado, o que me levou logo em março de 1989 a pronunciar-me publicamente contra a demolição de um imóvel classificado e, nas imediações a construção de um edifício gigantesco, hoje de pouca utilidade, sem o prévio cumprimento da lei, o que deu lugar a um processo disciplinar que me moveu o então presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia numa tentativa de me calar. Nesse espaço em questão, e numa das então intervenções arqueológicas “por obrigação” viriam a ser descobertas em 2007 umas notáveis ruinas paleocristãs cuja escavação total tem vindo a servir de “moeda de troca” para a implantação de uma desmesurada urbanização, processo esse que está nas mãos da Justiça.

Por tudo isto não posso aqui deixar de recordar o que em 1983 o falecido Professor Doutor Bernardo Xavier Coutinho o apresentou nas 1.as Jornadas de História Local e Regional e depois publicou: «É intuitivo que o “castelo de Gaia” (o Castrum antiquuum Romanorum), como tal, teve uma importância militar indiscutível; na história da romanização ocupa mesmo um lugar ímpar! (…). A verdade, porém, é que a sua conspurcação continua (…). A sua conspurcação no presente, a qual é uma pura e grande vergonha nacional (…). O Castelo de Gaia… deve ser preservado, defendendo-o contra o vandalismo de um casario anódino e amorfo que continua a poluí-lo… (COUTINHO,1984: 109-124).

Enquanto fui arqueólogo funcionário da autarquia, por diversas vezes me incumbiram da elaboração de programas para a criação de um Centro de Interpretação do Castelo de Gaia, que nunca deram em nada. Se hoje me perguntassem o que ainda se pode e deve fazer, como professor de Património, como arqueólogo e como cidadão, entre outras medidas, proporia que fossem demitidos de imediato os responsáveis pela sua degradação a nível nacional, regional e local.

Nestas coisas da Cultura e do Património, para além das considerações de caráter profissional, quantas vezes arredadas ou mesmo desprezadas, também se costuma falar de “consciência”. Ora, às vezes, ela é «… uma questão de educação. Adquire-se como as boas maneiras» (Eça de Queirós, Os Maias).

J. A. Gonçalves Guimarães

historiador

 



Falecimento

Ontem, dia 24 de junho, faleceu em Lisboa o nosso associado e confrade Eng.º Amílcar Barata Salgueiro (1952-2024). A direção da ASCR-CQ apresenta à Família na pessoa da nossa também confrade, sua irmã Dr.ª Alda Barata Salgueiro, e aos seus incontáveis amigos e colaboradores as suas sentidas condolências.

 

Eleições na ASCR-CQ

Na próximo quarta-feira, 26 de junho decorrerão no Solar Condes de Resende as eleições para o mandato dos corpos sociais 2024-2028, tendo sido apresentada uma única lista proposta pela direção cessante. A tomada de posse dos novos corpos sociais seguir-se-á de imediato ao ato eleitoral. A lista concorrente é composta pelos seguintes associados: Mesa da Assembleia Geral – presidente, José Manuel Alves Tedim – 028; vice-presidente, Carlos Alberto Dias de Sousa – 022; secretário, Henrique Manuel Moreira Guedes – 098; secretários suplentes, José António M. Moreno Afonso – 025; João Emílio S. Carvalho de Almeida – 358. Direção – presidente, Joaquim António Gonçalves Guimarães – 001; vice-presidente, Luís Manuel de Araújo – 027; secretário, Nuno Miguel de Resende Jorge Mendes – 101; tesoureiro, Fernando Rui Morais Soares – 204; vogais, Manuel Maria Moreira – 167; Manuel Guimarães da Fonseca Nogueira – 314; António Pinto Bernardo – 315; vogais suplentes, António Manuel Santos Pinto Silva – 294; Alexandre Barros Farinhote – 424. Conselho Fiscal – presidente, Manuel Filipe Tavares Dias de Sousa – 002; vogal, Marcus Vinicius C. Fernandes – 246; vogal, Licínio Manuel Moreira Santos – 286.

 



Palestras e Conferências

No dia 06 de junho decorreu no Solar Condes de Resende a habitual palestra das últimas quintas-feiras do mês, mudada para esta data, sobre o tema «Arte Nova em Portugal. Análise Gráfica» pelo Doutor arquitecto Pedro Luís Silva, da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia.

No dia 7 o secretário JAGG participou com uma conferência sobre «Trocas mercantis entre Brasil e Portugal» num painel do Brasil Origem Week, que decorreu no WOW em Vila Nova de Gaia.

No dia 14 pelas 21,30 horas, no Solar Condes de Resende decorreram as Jornadas Europeias de Arqueologia 2024, organizadas por esta estrutura autárquica com a colaboração do Gabinete de História, Arqueologia e Património da ASCR-Confraria Queirosiana, este ano sob o tema «O Castelo de Gaia na Antiguidade Tardia» e onde falaram Andrea Arezes da FLUP sobre «Prespectivas em torno Antiguidade Tardia no Noroeste»; J. A. Gonçalves Guimarães como membro do GHAP, sobre «Em busca dos vestígios paleocristãos de Portuscale: as escavações arqueológicas na Igreja do Bom Jesus de Gaia (1989-1992); e André Nascimento; Filipe Pinto; Mário Gonçalves e Sofia Soares, da Empatia – Arqueologia, Conservação e Restauro, L.da, sobre «Um Batistério no Castelo de Gaia», recentemente desmontado naquele lugar, não obstante a importância excecional do achado.

 

Inauguração da estátua de J. Rentes de Carvalho; fotografia de Fátima Teixeira

Presença da associação

No dia 25 de maio, com a presença do Presidente da República Professor Doutor Marcelo Rebelo de Sousa, decorreu no Fórum Municipal Luísa Todi em Setúbal o Congresso do Centenário da Confederação Portuguesa de Coletividades de Cultura Recreio e Desporto, durante o qual o osso confrade e tesoureiro da direção da ASCR-CQ, Dr. Manuel Maria Moreira, tomou posse como presidente da mesa do Congresso.

No dia 29 de maio no Pavilhão da Lavandeira, Vila Nova de Gaia, decorreu a Gala do concurso «Melhor Escola» promovido pelo jornal O Gaiense. Presentes, ente muitos outros convidados, professores e alunos, os confrades queirosianos, ainda que em representação de outras instituições: Albino Almeida, presidente da Assembleia Municipal de Vila Nova de Gaia; António Pinto Bernardo da direção da ASCR-CQ; Arménio Costa, presidente da Junta de Freguesia de Canelas; Eduardo Vitor Rodrigues, presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia; Joaquim António Gonçalves Guimarães, secretário da direção da ASCR-Q; Maria de Fátima Teixeira, do Gabinete de História, Arqueologia e Património (ASCR-CQ) e Manuel Filipe Dias Tavares, do conselho fiscal da ASCR-CQ.

No dia 31 de maio decorreu em Mogadouro a sessão de homenagem deste município ao escritor José Rentes de Carvalho, consubstanciada na atribuição do seu nome ao seu complexo cultural no átrio do qual foi erguida uma sua estátua em bronze da autoria do confrade escultor Hélder de Carvalho. No átrio da biblioteca está patente ao público uma exposição de iconografia inédita, objetos pessoais e edições de sua autoria integradas no seu espólio pessoal à guarda da Confraria Queirosiana, que esteve representada na homenagem por JAGG e Maria de Fátima Teixeira e ainda por outros confrades em representação de outras entidades, como foi o caso da Eng.ª Paula Carvalhal em representação da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia. Os discursos proferidos pelo homenageado e pelos diversos convidados serão publicados na próxima edição da Revista de Portugal.

No dia 2 de junho nas comemorações do Dia Nacional de Itália como habitualmente organizado pelo Consulado do Porto no Palácio do Freixo, estiveram presentes os dirigentes António Pinto Bernardo, JAGG, José Manuel Tedim e Maria de Fátima Teixeira, além de outros confrades em representação de outras entidades

No dia 4 de junho o dirigente Dr. Manuel Nogueira representou a ASCR-Confraria Queirosiana como entidade parceira na cerimónia da apresentação das Comemorações do V Centenário de Camões, organizadas pela Matriz Portuguesa, que decorreu no Grémio Literário em Lisboa, tendo na ocasião discursado o confrade Prof. Doutor Guilherme d’ Oliveira Martins, cujo texto será também publicado na próxima edição da Revista de Portugal.

Na noite de 22 de junho passado, o secretário da direção foi o padrinho da Marcha do Centro Recreativo de Mafamude que representou a União de Freguesias de Mafamude e Vilar do Paraíso no Desfile das Marchas de São João no Parque de São Caetano nesta ultima freguesia gaiense.

No próximo dia 27 de junho, na habitual palestradas últimas quintas-feiras do mês no Solar Condes de Resende e via zoom entre as 18,30 e as 19,30, J. A. Gonçalves Guimarães falará sobre «A Cultura a nível local antes, após o 25 de Abril e hoje: conceitos, instituições e agentes», durante a qual analisará os conceitos de Cultura apresentados nos programas eleitorais dos partidos concorrentes às últimas eleições autárquicas no município de Vila Nova de Gaia.

No dia 28, sexta-feira, na Casa-Museu Eng.º António de Almeida no Porto, a Dr.ª Nassalete Miranda, jornalista e diretora do quinzenário cultural vai realizar uma palestra sobre «…a génese e a evolução da Connaissance des Arts e, a partir desses números repletos de artigos ilustrados (a preto e a cores) – sobre mobiliário, têxteis, cerâmica, pintura, gravura, artistas e exposições – refletir sobre a importância das revistas, dos suplementos e dos jornais culturais». A entrada é livre, sujeita à inscrição prévia através de correio eletrónico (fundacao@feaa.pt) ou telefone (226 067 418).

Tudo leva a crer que a ASCR-CQ estará também presente entre 15 e 18 de agosto no evento Portugal Wowtêntico 2024 que decorrerá no WOW, Vila Nova de Gaia, bem assim como na Feira do Livro do Porto que decorrerá entre 23 de agosto e 8 de setembro próximo no Palácio de Cristal no Porto, conjuntamente com a Associação Portuguesa da História da Vinha e do Vinho (APHVIN/GEHVID).

 

Comunicação Social

 

Para além da habitual colaboração no quinzenário As Artes Entre As Letras, da publicação desta página no eca-e-outras.blogspot.com, das publicações Revista de Portugal e Gaya. Estudos de História, Arqueologia e Património, a ASCR-CQ tem vindo a ser regularmente solicitada para colaborar com diversos órgãos de comunicação social sobre os temas próprios da sua atuação. Assim, no passado dia 18 de junho o secretário foi convidado a gravar para o programa «Viver Aqui» do Porto Canal uma entrevista sobre o património das duas margens do Douro que se avistam da esplanada da Serra do Pilar, onde no mesmo local, mas desta feita a convite do Coronel Homero Abrunhosa, comandante da unidade militar ali aquartelada, no dia 21participou no programa Sociedade Civil da RTP2 sobre a História daquele monumento, a emitir em setembro; ainda para o Porto Canal e, como habitualmente, na noite de São João, o mesmo historiador participou no programa em direto comentando as festividades tradicionais as duas margens.

 

Livros



Da autoria de diversos associados e confrades foram publicados os seguintes livros:

Da autoria de Ricardo Charters d’ Azevedo foi lançado no dia 8 de junho na Casa do Terreiro, em Leiria, o n.º 16 dos Anais Leirienses, com o Dossiê «Nos 50 anos do 25 de Abril de 1974», editado pela Hora de Ler com o apoio da Fundação Caixa Agrícola de Leiria.




De Olga Cavaleiro, ex-presidente da Federação Portuguesa das Confrarias Gastronómicas e professora, acaba de ser lançado o livro Portugal Gastronómico. A Gastronomia Portuguesa e as Cozinhas Regionais, editado pela Âncora Editora.

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Eça & Outras, III.ª série, n.º 190, terça-feira, 25 de junho de 2024; propriedade da associação cultural Amigos do Solar Condes de Resende - Confraria Queirosiana (Instituição de Utilidade Pública), Solar Condes de Resende, Travessa Condes de Resende, 110, 4410-264, Canelas, Vila Nova de Gaia; C.te n.º 506285685; NIB: 0018000055365059001540; IBAN: PT50001800005536505900154; email: queirosiana@gmail.com; www.queirosiana.pt; confrariaqueirosiana.blospot.com; eca-e-outras.blogspot.com; vinhosdeeca.blogspot.com; coordenação do blogue e publicação no jornal As Artes Entre As Letras: J. A. Gonçalves Guimarães (TE-164 A); redação: Fátima Teixeira; inserção: Amélia Cabral.

domingo, 26 de maio de 2024

 

500 anos do nascimento de Luís de Camões

100 anos do passamento de Teófilo Braga

 

Hinos revolucionários

 

Desde o 25 de Abril de 1974 que uma canção denominada «Grândola Vila Morena» se foi impondo como hino revolucionário em Portugal e fora do nosso país como marca identitária desse momento histórico por ter sido escolhida como sinal de confirmação para o início das operações que derrubaram o regime fascista. Interpretada pelo seu autor e pelos seus companheiros das «canções de intervenção», foi depois cantada por outros intérpretes e agrupamentos musicais, podendo encontrar-se versões de Amália Rodrigues a Joan Baez. Desde tempos antigos que as alterações sociais são acompanhadas por cantigas tradicionais sobre o trabalho ou a sociedade, quantas vezes satíricas ou adaptadas para uma atitude mobilizadora das classes em confronto. Sob a forma de “hinos”, palavra grega que significa “cântico de louvor”, uma sucessão destas canções revolucionárias começou com La Marseillaise, composta em 1792, com música e versos do militar e músico amador Claude Joseph Rouget de Lisle, e inicialmente intitulada Canto de Guerra para o Exército do Reno, o corpo militar da Revolução Francesa que ia enfrentar os invasores austríacos, mas que rapidamente passou a ser mobilizador da própria revolução. Depois de ter sido banido, só em 1879 foi adotado como hino nacional pela França. Enquanto outras revoluções eclodiam noutras latitudes, no Porto ocorre a Revolução Constitucional de 1820, com profundos reflexos no Brasil. E também ela teve os seus hinos, de que aqui recordamos a Canção Constitucional de Vila Nova de Gaia, ou Canção Vilanovense, com música do compositor liberal João António Ribas e versos de Manuel da Silva Passos, o depois famoso Passos Manuel, e impressa em 1826, um hino local que celebrava o apego â Constituição de 1822 a qual devolveu ao município a sua autonomia administrativa. Mas o período liberal, quer em Portugal quer no Brasil, haveria de ser pródigo em hinos, não só porque eles estavam na moda, mas porque D. Pedro I, imperador do Brasil em 1822 e depois momentaneamente rei D. Pedro IV de Portugal em 1826 e depois ainda Duque de Bragança regente em nome de sua filha D. Maria da Glória que sentou no trono após a guerra civil de 1832 – 1834, era compositor com alguns méritos. Recordemos aqui o Hino da Amélia (de Orleães, sua segunda esposa) ou de D. Pedro IV, com música e versos do rei-soldado e datado de 1832 quando as suas tropas de voluntários e mercenários lutavam contra o absolutismo do irmão D. Miguel. Mas uma das mais marcantes revoluções oitocentistas foi a Comuna de Paris, ocorrida entre 18 de março e 28 de maio de 1871, quando a Guarda Nacional e os cidadãos da capital francesa tomaram o poder pelas armas e questionaram qual deveria ser o papel dos cidadãos na organização do poder a todos os níveis da sociedade, não apenas em França, mas em todo o mundo. Recordemos que em 1867 tinha sido publicado O Capital. Crítica da Economia Política, de Karl Marx e nesse mesmo mês de março de 1871 tiveram lugar em Lisboa as Conferências do Casino em Lisboa, entretanto proibidas  pelo governo. É neste contexto que Eugène Pottier, militante anarquista e operário, escreve os versos de L´Internationale, que em 1888 seria musicada por Pierre de Gayter, passando este hino a ser considerado como a canção dos trabalhadores de todo o mundo, além de, entre 1922 e 1944, ter sido o hino da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.

         Em Portugal, na sequência do «Ultimato Inglês» de 1890, o músico Alfredo Keil e o poeta e escritor Henrique Lopes de Mendonça compõem o hino patriótico A Portugueza, logo impresso e largamente divulgado e tocado em todas as manifestações políticas, e que seria assumido, com adaptações nos versos, como hino republicano após a revolução de 5 de Outubro de 1910 e daí passar a hino nacional até à atualidade. Se quanto à música estavam todos de acordo, para além de várias adaptações na orquestração e arranjo coral para ser cantado a quatro vozes, já quanto aos versos as opiniões dividiam-se em tantas as versões quantos os partidos e correntes políticas. Uma das menos conhecidas será a proposta para uma versão anarquista da autoria do professor e depois exilado político Roberto das Neves, datada de 1924, que em vez de «heróis do mar» propôs um «herói plebeu».

Os anos vinte e trinta do século passado vão trazer à Europa o fascismo e o nazismo que redundaram na Guerra Civil Espanhola e na Segunda Guerra Mundial, e novos hinos revolucionários aparecem nesse contexto, como Le Chant des Partisans, da autoria de Anna Marly e versos de Maurice Druon e Josephe Kessel, uma das canções da Resistência Francesa em 1941. Após o segundo conflito mundial as potências ganhadoras procuram dominar o mundo: para além do bloco soviético, o imperialismo estadunidense deu origem à Guerra da Coreia (1945-1953), o francês à Guerra da Indochina (1946-1954) e, quando derrotado no campo de batalha, é substituído pelos primeiros que dão origem à Guerra do Vietname (1955-1975). Contra esta última, a juventude norte-americana e os seus cantores divulgam várias canções que se transformam em hinos anti-imperialistas e anti-coloniais, apelando a transformações profundas na sociedade, como foi o caso de We Shall Overcame, que tem as suas origens no século XVII numa canção de pescadores da Sicília depois levada para a Alemanha, onde passou a ser um hino protestante. Chegado ao sul dos Estados Unidos da América, foi a primeira vez publicado como hino afroamericano no início do século XX e nos anos quarenta divulgado como hino dos trabalhadores da Carolina do Sul e do Tenessee. Em 1963 a versão musical e versos de Zilphia Hart., Frank Hamilton, Guy Carawan e Pete Seeger foi divulgada por Joan Baez. Mas também na América do Sul apareceram ditaduras apadrinhadas pelos Estados Unidos que deram origem a regimes militares no Brasil (1964-1985); Argentina (1966-1976) e Chile (1973-1990), motivando canções-hinos como Para Não Dizerem Que Não Falei das Flores, composto em 1968 pelo jurista brasileiro Geraldo Vandré, mas que rapidamente galgou fronteiras na América Latina e em Portugal, mesmo em meios ligados à Igreja Católica.

Em 1974 a Revolução dos Cravos de 25 de Abril consagrou então a canção Grândola, Vila Morena, composta em 1971 pelo cantor de intervenção José Afonso, vindo da prática da canção universitária coimbrã. Se analisarmos a música de todos estes hinos é óbvio que ela tem muito da época em que foram criados, todos eles melodicamente impressivos. Quanto aos versos, entre A Marselhesa e Grândola Vila Morena perpassam as palavras Liberdade, Igualdade, e Fraternidade, um ideal que há mais de 200 anos se ouve cantar um pouco por todo o mundo.

Aos vinte e dois anos de idade Eça de Queirós escreveu: «As revoluções não são factos que se aplaudam ou que se condenem. Havia nisso o mesmo absurdo que em aplaudir ou condenar as evoluções do Sol. São factos fatais. Têm de vir. De cada vez que vêm é sinal de que o homem vai alcançar mais uma liberdade, mais um direito, mais uma felicidade. Decerto que os horrores da revolução são medonhos, decerto que tudo o que é vital nas sociedades, a família, o trabalho, a educação, sofrem dolorosamente com a passagem dessa trovoada humana. Mas as misérias que se sofrem com as opressões, com os maus regimes, com as tiranias, são maiores ainda. (…) As desgraças das revoluções são dolorosas fatalidades, as desgraças dos maus governos são dolorosas infâmias. (Eça de Queirós, Distrito de Évora, 1867). Mas não há revoluções sem hinos.

J. A. Gonçalves Guimarães

historiador

 

Atuação dos Eça Bem Dito; fotografia Fátima Teixeira

Comemorações dos Cinquenta Anos do 25 de Abril

A associação ASCR-Confraria Queirosiana tem participado e realizado diversas atividades que se enquadram nestas comemorações. Assim, depois de no dia 25 de abril ter participado no desfile de associações e coletividades organizado pala Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia que desfilou entre o Jardim do Morro e os Paços do Concelho com a presença de alguns confrades trajados, no dia 26, a habitual palestra das últimas quintas-feiras do mês, mudada para este dia, teve por tema «Hinos Revolucionários dos séculos XVIII ao XX» proferida por J. A. Gonçalves Guimarães, com a atuação do grupo coral Eça Bem Dito dirigido pela pianista Maria João Ventura, com assistência presente e por videoconferência.

No dia 24 de maio, no Centro Recreativo de Mafamude, Vila Nova de Gaia, J. A. Gonçalves Guimarães participou no ciclo de Conversas no CRM sobre o tema «50 Anos de Revolução. A Génese do 25 de Abril» conjuntamente com a Dr.ª Manuela Aguiar, ex-deputada do PSD e ex-secretária de estado das Comunidades Portuguesas, com moderação do Dr. Jorge Filipe Ferreira, tendo a sessão sido abrilhantada com a atuação dos grupos musicais Eça Bem Dito e Intichaski.

 

Curso sobre História Local e Regional

No sábado, dia 4 de maio, decorreu no Solar Condes de Resende a última aula do curso livre «40 anos depois: História Local e Regional», organizado pela Academia Eça de Queirós, grupo de trabalho da ASCR-CQ – Confraria Queirosiana para o ensino, com o patrocínio da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia e a certificação do Centro de Formação de Associação de Escolas Gaia Nascente, proferida pelo Doutor Adrião Pereira da Cunha, doutorado em História Contemporânea pela FLUP, sobre o tema «Reformas e Revoluções do século XX» a que se seguiu um convívio entre professores e alunos presentes.

Apoio a programas associativos e escolas

No passado dia 11 de maio e para o Clube Unesco do Porto, o presidente da direção da ASCR-CQ, Prof. Doutor José Manuel Tedim, historiador da Arte e professor de Património da Universidade Portucalense Infante D. Henrique, apresentado pelo Dr. Manuel Real e integrada no ciclo de conferências «Olhar e sentir a época barroca», dissertou no Espaço Atmosfera M do Porto sobre o tema «Festa Barroca, Arquitetura Efémera». No dia 18 de maio o mesmo Clube, com a colaboração do Dr. Joaquim Pinto da Silva de O Progresso da Foz, realizou uma visita ao Solar Condes de Resende, onde foram recebidos pelo seu responsável, Dr. João Fernandes, que lhes apresentou a instituição e as suas valências e pelo Prof. Doutor J. A. Gonçalves Guimarães da ASCR-CQ que lhes falou desta associação e das suas atividades e publicações, tendo em seguida acompanhado os visitantes até o Coreto de Canelas onde lhes falou deste monumento musical e dos músicos gaienses de nomeada dos séculos XIX e XX, a que se seguiu um almoço convívio entre os participantes num restaurante das redondezas.

No dia 20 a Confraria Queirosiana foi convidada a participar num programa educativo sobre Os Maias organizado pelos professores e alunos da Escola Secundária Manuel Laranjeira de Espinho através da presença dos confrades J. A. Gonçalves Guimarães, Maria de Fátima Teixeira e João Fernandes, que para tal se deslocaram à Câmara Municipal de Espinho onde foram recebidos pela presidente da edilidade, Prof.ª Maria Manuel Barbosa Cruz no átrio dos Paços do Concelho, onde diversas turmas daquela escola evocaram textos de Eça de Queirós que ainda hoje estão atuais. Seguiu-se um desfile pelas ruas da cidade com paragem evocativa na casa onde viveu o médico e escritor Manuel Laranjeira, tendo igualmente sido recordados o pintor Amadeu de Souza Cardozo e o compositor e pianista Alfredo Napoleão, terminando o desfile com uma passagem pelas áreas protegidas das dunas nos limites entre os municípios de Espinho e de Vila Nova de Gaia. No dia 24 esta mesma escola visitou o Solar Condes de Resende e a estátua de Eça de Queirós aí existente, inteirando-se das atividades do Solar e do roteiro queirosiano divulgado pela Confraria que aqui tem a sua sede.

 



Homenagem ao escritor José Rentes de Carvalho

No passado dia 12 de maio o escritor J. Rentes de Carvalho, vindo pela primeira vez de avião de Amsterdam para Portugal, regressou a Estevais do Mogadouro com sua esposa Loëckie, tendo sido recebidos no aeroporto Francisco Sá Carneiro por uma delegação da ASCR-CQ que aí se deslocou para os cumprimentar e antecipar as felicitações pelos seus ativos 94 anos que se completaram no passado dia 15 de maio. Desde 1964 e até 2023, «duas ou quatro vezes por ano», sempre tinha feito esse percurso durante três dias a guiar o seu automóvel pelas estradas de Bélgica, França e Espanha. Entretanto o Município de Mogadouro prepara-lhe uma homenagem no próximo dia 31 de maio dando o seu nome â um equipamento cultural e inaugurando uma sua estátua no largo fronteiro da autoria do escultor Hélder de Carvalho. A ASCR - Confraria Queirosiana estará presente através de alguns membros da direção e vários confrades, tendo entretanto recebido no dia 21 a vereadora do pelouro da Cultura Dr.ª Marcia Barros e a chefe de divisão Dr.ª Marta Madureira daquela autarquia para selecionarem algum espólio à guarda da associação para ser mostrado durante esta homenagem na Biblioteca Pública local.

 

Arqueologia do Castelo de Crestuma

O Gabinete de História, Arqueologia e Património da ASCR – Confraria Queirosiana esteve representado no 7º Congresso da Sociedade de Estudos de Cerâmica Antiga na Hispânia (SECAH) que decorreu em Lisboa nos passados dias 15 a 18 de maio, através do arqueólogo António Manuel S. P. Silva, que em conjunto com o Prof. Doutor Rui Morais, docente da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, apresentaram ali um poster com o estudo das ânforas romanas provenientes das escavações arqueológicas que decorreram no Castelo de Crestuma (Vila Nova de Gaia) entre 2010 e 2015. O estudo revelou, essencialmente, a presença do comércio mediterrânico-atlântico naquela área portuária entre o século I a. C. e o século VII da nossa era.

 


As Artes Entre As Letras

No passado dia 18 de maio, no auditório da Fundação Engenheiro António de Almeida no Porto, decorreu a sessão comemorativa dos 15 anos do quinzenário cultural As Artes Entre As Letras, à qual compareceram, para além do seu corpo de profissionais da administração e redação, também muitos dos seus colaboradores desde o primeiro número e outros mais jovens que se apresentam regularmente com os seus textos nas páginas desta publicações que se tornou incontornável na vida cultural do país. Na mesa que abriu a sessão estavam o Dr. Augusto Aguiar Branco, presidente da instituição de acolhimento e apoiante desde a primeira hora deste projeto; o Prof. Levy Guerra, professor catedrático jubilado da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, a Dr.ª Nassalete Miranda diretora do jornal, e Rodrigo Magalhães, doutor em Estudos de Património – História da Arte pela FLUP e colaborador do jornal, tendo todos eles usado da palavra para falarem sobre alguns aspetos do panorama cultural português refletido nesta publicação. A diretora compartilhou a reflexão mais substancial sobre o que foram estes quinze anos referindo todos aqueles que passaram ou permanecem nas páginas que regularmente chegam às mãos dos leitores, recuando a sua atividade até a O Primeiro de Janeiro e o seu caderno literário, artístico e científico.

Este aniversário ficou também assinalado com a edição do número 362 do As Artes Entre As Letras datado de 15 de maio com textos alusivos e reflexivos de muitos dos seus colaboradores habituais. A este evento estiveram presentes o presidente e o secretário da associação Amigos do Solar Condes de Resende – Confraria Queirosiano e vários dos seus associados e confrades, ainda que em representação de outras instituições.

 

Livros

Da autoria de diversos associados e confrades foram publicados os seguintes livros:

Eça de Queirós - Textos de Imprensa III (d’ A Atualidade). Edição de Carlos Reis e Ana Teresa Peixinho. Lisboa: Imprensa Nacional.

«Ao escrever para o jornal portuense A Atualidade, Eça dirigia-se a um público específico e sobretudo fazia-o de um ponto de vista próprio. Vivendo em Inglaterra e colocando-se num específico lugar de enunciação (no caso, Londres, de onde os textos são datados), o cronista compunha uma “correspondência particular”, expressão epigrafada em cada uma das crónicas, e que resulta do nome dado à rubrica do jornal. Ou seja, trata-se de alguém que escreve a partir do centro para a periferia, fazendo-o num duplo registo epistolar e cronístico, uma combinação que encontramos em vários outros momentos e lugares da vida literária de Eça. A feição não propriamente intimista, mas simuladamente privada, destas correspondências estimula a desenvoltura do tom coloquial que nelas se revela. As 15 correspondências que Eça endereçou ao jornal A Atualidade, por encomenda do seu diretor, Anselmo Evaristo de Morais Sarmento, distribuem-se por um lapso de tempo que vai de abril de 1877 a maio de 1878. Ao longo desse período de pouco mais de um ano, o escritor ocupa-se de acontecimentos políticos, sociais, económicos e culturais, dando notícia, para um Portugal então longínquo, do que acontecia na Europa e também na sua periferia (por exemplo, a guerra russo-turca). Mesmo sabendo-se que uma parte substancial daqueles acontecimentos chegava ao conhecimento de Eça pela leitura quase compulsiva da imprensa britânica, fica evidente que os textos daí resultantes exibem muito do estilo e da visão de um grande escritor, então já na plenitude dos seus recursos literários». (Extrato da Nota Prévia)

 

Isabel Lacerda, Vila Nova de Gaia, o seu trajar em tempos idos. Vila Nova de Gaia: FCVNG.

«Este livro foi pensado com um enorme prazer para enaltecer a cultura popular portuguesa e deixar este legado aos vindouros e a todas pessoas que queiram preservar os seus usos, costumes e tradições. Forma dois anos de dedicação pensado para as gentes de Gaia. Todo o material referenciado no livro faz parte do meu espólio pessoal que fui adquirindo ao longo dos anos e que gostaria de oferecer à Câmara para consulta permanente. Este livro não seria possível sem a colaboração da autarquia, das juntas de freguesia e da Federação das Coletividades» (Isabel Lacerda).

O lançamento do livro foi acompanhado de uma exposição sobre o seu conteúdo no Arquivo Sophia Mello Breyner até ao dia 26 de maio.

 

Eduardo Vitor Rodrigues, Mundo em Mudança, 280 páginas. Porto: Ideias de Ler

«Os tempos atuais são muito desafiantes. As dinâmicas sociais nacionais e internacionais exigem uma atitude reflexiva, uma indagação constante e um projeto de enunciados que ousem responder às pessoas e às comunidades.
A Europa, em geral, e Portugal, em particular, constituem-se como territórios de múltiplos movimentos, uns mais evidentes do que outros, uns mais positivos do que outros. Estas dinâmicas ocorrem num contexto de inserção em processos económicos e sociais globais, exigentes em todas as suas vertentes. Importa conhecer, diagnosticar, inquietar e pôr em debate. Igualmente, importa apontar caminhos, definir estratégias, em ambiente mais ou menos académico, mas sempre num debate alargado, para o qual este livro pretende contribuir. O livro organiza-se numa lógica temática e de acordo com as diferentes escalas territoriais, mais ou menos globais, mais ou menos locais. Pretende discutir algumas das dimensões mais relevantes das sociedades atuais, sistematizando debates que importa aprofundar face aos enormes desafios com que nos deparamos, contribuindo dessa forma para o fundamental debate social» (Divulgação Porto Editora).

 

J. Rentes de Carvalho, Cravos e Ferraduras, 192 páginas. Lisboa: Quetzal Editores.

«Um retrato dos últimos anos da vida portuguesa através de personagens escolhidas a dedo. Nenhuma delas é conhecida. Nenhuma delas merece a nossa piedade. Entre o conto e a crónica, trocando os nomes e avariando as grandes teorias sobre o funcionamento da pátria, estes textos de J. Rentes de Carvalho retratam o país com humor, cumplicidade, atrevimento, ou uma compreensão que não pede distância, mas proximidade. Os comportamentos destas personagens não são, na maior parte das vezes, dignos de elogio ou de serem escolhidos como exemplo, não receberão medalhas no Dia de Portugal. Mas são, arrancados à vida desconhecida da província, das vilas e aldeias da pequena pátria, um dos melhores retratos de todos nós, frívolos ou sentimentais, mentirosos ou com um fingido amor pela verdade.» (Divulgação Quetzal).

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Eça & Outras, III.ª série, n.º 189, sábado, 25 de maio de 2024; propriedade da associação cultural Amigos do Solar Condes de Resende - Confraria Queirosiana (Instituição de Utilidade Pública), Solar Condes de Resende, Travessa Condes de Resende, 110, 4410-264, Canelas, Vila Nova de Gaia; C.te n.º 506285685; NIB: 0018000055365059001540; IBAN: PT50001800005536505900154; email: queirosiana@gmail.com; www.queirosiana.pt; confrariaqueirosiana.blospot.com; eca-e-outras.blogspot.com; vinhosdeeca.blogspot.com; coordenação do blogue e publicação no jornal As Artes Entre As Letras: J. A. Gonçalves Guimarães (TE-164 A); redação: Fátima Teixeira; inserção: Amélia Cabral; colaboração: António Manuel S. P. Silva.