quarta-feira, 24 de julho de 2013

Eça & Outra

Viaje com Eça

Não sei se você, meu caro leitor, ainda é um daqueles felizardos que, além de não trabalhar um mês por ano, vulgarmente conhecido por “estar de férias” ou “ir de férias”, durante o qual continua a ganhar o que a sua empresa ou o Estado lhe pagam e ainda lhe acrescentam uma remuneração idêntica chamada “subsídio de férias”. Na prática recebe dois meses de salário fazendo nada durante um mês para quem lhe paga a dobrar. Esta “bondade” social já o devia ter incomodado, levado a refletir sobre o seu porquê e, no mínimo, já deveria ter desconfiado da aparente passividade da sua existência, da sociedade em que temos vivido dar este facto como adquirido, de os sindicalistas (e os usufrutuários) o considerarem um “direito” e de o mesmo ser extensivo a muitos daqueles que já nada produzem ou asseguram. Temos ainda outra bizarria social no chamado “subsídio de Natal”, um bónus que lhe dão em nome do Menino Jesus ter nascido em Belém há dois mil anos, o que também já o deveria ter levado a desconfiar da sua “justificação”. Mas este não vem agora ao caso. Se ainda recebe ambos e apenas não trabalha por ano durante um mês, então parabéns e considere-se um felizardo. Pagassem-lhe bem o seu trabalho efetivo, descontassem-lhe impostos sensatos, e você seria completamente capaz de atribuir subsídios a si próprio, de aniversário, de carnaval, de inverno, sem precisar da bizantinine daqueles outros. Mas agora pretendo falar de férias, conceito social e económico que se começou a desenvolver no século XIX entre as famílias burguesas e que, no século XX, com o aumento exponencial dos assalariados, o declínio das estações balneares famosas, o desenvolvimento dos transportes e a tentativa de racionalizar o trabalho, se tornou “universal” no mundo ocidental ou ocidentalizado. Claro que em tempos anteriores sempre houve breves períodos de pausa no trabalho e feriados religiosos no mundo rural, com o calendário muito marcado pela sazonalidade das sementeiras e das colheitas. Mas na sociedade industrial e urbana o ritmo de produção e a economia impunham outras regras e outros interesses. E assim nasceram as férias.
Para a maior parte dos cidadãos tal período significa hoje o estar deitado numa praia mais ou menos apinhada de gente, expor a pele aos maléficos raios do sol, tomar banhos regulares numa água do mar que se deseja sem muita poluição, e assim alimentar a “época alta” do chamado Turismo, atividade que tudo nivela e banaliza e cujo grande mérito talvez seja aumentar a possibilidade da mistura pacífica das multidões e o consequente desmotivar das hipotéticas ou previsíveis guerras, o que já não é mau.
Tal como no tempo de Eça, ele há quem faça férias «… com a esposa, a cunhada, uma amiga da cunhada, uma conhecida desta amiga, sete filhos, seis criados, dez cães, e outros cães conhecidos destes cães…» (Cartas de Inglaterra), só que agora os criados são menos ou já lá estão no resort, no bungalow, enfim, no destino turístico. Os viajantes singulares ou em grupos «… trotam, assobiam, dão obviamente a volta ao Mundo… Mas estes sujeitos trotam pelo gosto corporal de trotar… e no seu trote continuo através dos continentes vão assobiando, porque não vão pensando. Na realidade são vagabundos» (Notas Contemporâneas). Quer explicações para tal fenómeno? «Todos os filósofos e todos os donos de hotéis são unânimes em dizer que se viaja para ver o que há de interessante no mundo. Ora, no mundo, só há de interessante, verdadeiramente, o Homem e a Vida» (Correspondência, carta ao Conde de Arnoso, 1885). Porque, as mais das vezes e para o comum dos mortais, «viajar é… deixar um sítio onde se estava comendo num hotel triste… para ir, através da poeira, confusão, e bagagens, comer a outro hotel mais triste… e as igrejas, as lojas, os homens, sendo por toda a parte iguais, não vale a pena partir para ir apenas e em definitivo, sentir a melancolia infinita que inspiram as multidões estranhas». (Correspondência, carta à Condessa de Ficalho, 1885).
Alguns, poucos, aproveitam as férias para verem o que nunca viram, aprender o que ainda não foi possível, entenderem melhor o seu mundo e o dos outros. Gastam, sem se endividarem, o tal subsídio para se tornarem melhores pessoas e melhores cidadãos. Mas são poucos.
Por isso, caro leitor ainda com férias e respetivo subsídio, aqui lhe deixo a sugestão já tardeira (mas este ano terá Verão até dezembro) de fazer férias nos roteiros queirosianos, desde a Póvoa até Coimbra, Leiria, Lisboa, Cascais, Sintra, com uma incursão ao Vale do Douro, a Gaia, a Évora e a Serpa, ou ainda a Cuba e States, Inglaterra, Paris e outros locais por onde Eça andou, sobre os quais escreveu ou deles se utilizou como cenário para a sua ficção, o que, como sabe, o pode levar à China à procura da família do mandarim para se redimir das campainhadas pouco honestas que tem vindo a tocar na vida.
Este seu amigo e confrade deseja-lhe umas queirosianas férias.
J. A. Gonçalves Guimarães

Livros, Revistas e Jornadas

“Eça Agora”

Nos 125 anos da publicação de Os Maias e nos 40 da edição do Expresso, este semanário põe à disposição dos seus leitores uma interessante coleção de 7 volumes de bolso contendo uma nova edição deste romance no qual, como já em 2001 J. Rentes de Carvalho escreveu no pós-fácio da sua edição neerlandesa «atente-se apenas nos personagens e ver-se-á que o romance de 1888 espelha grosso modo os vícios e as virtudes da sociedade portuguesa contemporânea. É como se, com a sua arte, o escritor tivesse sido capaz de tornar visível a presença daqueles elementos que, misteriosos e imutáveis no tempo, parecem formar a essência de um povo» (Leia a totalidade deste texto no blogue Tempo Contado de 20 de julho passado).
Para além do romance de Eça, aquele semanário desafiou seis escritores contemporâneos a “completarem” a obra, ou seja a darem-lhe mais tempo e mais vida para além do texto eciano, em três livros intitulados Os Novos Mais, tendo para tal José Rentes de Carvalho escrito O Rio Somos Nós, onde põe Carlos da Maia e João da Ega a passarem os seus últimos dias de vida numa Quinta do Douro nos finais dos anos trinta do século passado. O texto, para além de tudo o mais que se lhe possa enaltecer, tem também aquele encanto literário de a mais delirante ficção ter foros de inatacável verosimilhança.
A coleção finaliza com o livro de um outro autor também nosso confrade, Carlos Reis, com um seu notável estudo intitulado Introdução à leitura de Os Maias.
Entretanto o livro Portugal, a Flor e a Foice, de José Rentes de Carvalho, uma das mais lúcidas visões sobre o golpe militar de 25 de Abril de 1974 e os equívocos da revolução consequente, que geraram as ilusões e os poderes ainda hoje em presença no nosso país quarenta anos passados sobre aqueles acontecimentos, vai ter uma segunda edição na Holanda no próximo ano, o que não acontecerá tão cedo em Portugal, onde os devotos cultores dos mitos revolucionários continuam a preferir as suas profissões de fé à análise histórica e social.

30 anos do Parque Biológico

No passado dia 15 de Julho foi lançado no Parque Biológico de Gaia o livro comemorativo dos 30 anos da instituição, coordenado pelo seu criador, diretor e nosso sócio Nuno Gomes Oliveira. Apresenta textos e ilustrações de vários autores, não apenas sobre a história da instituição, mas também as espécies vegetais e animais presentes e aquelas que, numa visão global, os diversos serviços do Parque põem à disposição dos visitantes e dos estudiosos, desde a Pré-história até à atualidade, passando pela História Natural no nosso país e as suas relações internacionais.


Castelo de Crestuma

Ainda no Parque Biológico de Gaia está também patente ao público a exposição itinerante “Castelo de Crestuma. A Arqueologia em busca da História”, para a qual foi editado por aquela entidade, em parceria com a Confraria Queirosiana, um catálogo ilustrado e elaborado por António Manuel S. P. Silva e J. A. Gonçalves Guimarães, os arqueólogos coordenadores do projeto, o qual tem vindo a ser implementado pelo Gabinete de História, Arqueologia e Património dos ASCR-CQ.
A abertura desta exposição e o lançamento do seu catálogo decorreram no passado dia 28 de junho durante as I.as Jornadas Arqueológicas do Castelo de Crestuma, que tiveram como conferencistas Álvaro Brito Moreira; António Carvalho Lima; António Manuel S. P. Silva; Carlos Fabião; J. A. Gonçalves Guimarães; José Carlos Sanchez Pardo; Laura Sousa; Luís Carlos Amaral e Luís O. Fontes, que ali apresentaram os mais recentes resultados sobre a História e as intervenções arqueológicas do período suévico-visigótico em Portugal e em Espanha, algumas completamente inéditas, como foi o caso da também recente descoberta de uma basílica paleocristã no Castelo de Gaia. As jornadas terminaram com uma visita ao Castelo de Crestuma no dia 29.

Boletim dos Amigos de Gaia

Está em distribuição aos sócios o Boletim da Associação Cultural Amigos de Gaia, entidade com protocolo de colaboração com os ASCR-CQ. O n.º 76, referente a junho de 2013, tem colaboração de vários dos nossos sócios e confrades, nomeadamente do seu diretor, Francisco Barbosa da Costa, e J. A. Gonçalves Guimarães, Abel Barros, Fátima Teixeira e Eva Baptista. Refira-se que os trabalhos apresentados por estas duas últimas foram feitos no âmbito do projeto dos investigadores tarefeiros do Solar Condes de Resende.

Outras

7 Maravilhas de Gaia

O Solar Condes de Resende foi nomeado pelo júri deste concurso, promovido pelo jornal O Gaiense, como uma das “Maravilhas de Gaia”, agora postas a concurso junto do público para eleger as sete finais. Como salienta o texto distribuído, é nesta Casa que a Confraria Queirosiana tem a sua sede e a partir daí desenvolve a sua atividade cultural por todo o Portugal e todo o mundo lusófono.

Cursos

Entre os dias 10 e 31 de julho decorre na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa o curso de Verão “Erotismo e Sexualidade no Antigo Egito”, coordenado pelos professores Luís Manuel de Araújo, nosso confrade, e José Varandas, organizado pelo respetivo Centro de História e com sessões no Anfiteatro III.
Prossegue também na cidade do Porto o curso “Porto Arte e História” com direção científica do nosso confrade José Manuel Tedim, no qual participa também o confrade Francisco Ribeiro da Silva, entre outros professores. O curso abriu no dia 27 de junho na Casa do Infante e prosseguirá todas as quartas-feiras até Dezembro próximo.

Exposições



Desde 4 de julho e até 30 de agosto, a nossa confrade Beatriz Pacheco Pereira expõe um conjunto de esculturas em bronze denominado “Barrocos” na Casa Barbot em Vila Nova de Gaia.



Concerto

No passado dia 21 de julho decorreu na Fundação Eça de Queiroz em Baião o habitual Concerto de Verão com a Orquestra do Norte, de que é maestro titular José Ferreira Lobo, onde foram executadas obras de Mozart, Bottesini e Elgar sob a direção de Artur Pinho Maria, formado pelo Conservatório de Música de Gaia, tendo como solistas o violinista Rómulo Assis e o contrabaixista Bruno Carneiro.

Eça & Outras, IIIª. Série, n.º 59 – Quinta-feira, 25 de Julho de 2013
Cte. n.º 506285685 ; NIB: 001800005536505900154

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