terça-feira, 25 de novembro de 2014

Dia natalício de Eça de Queirós

O Diário Íntimo de A. Campos Matos

A. Campos Matos é sem sombra de dúvida o maior interlocutor de sempre entre a vida e a obra de Eça de Queirós e a sua realidade. Para defender tal afirmação bastaria lembrarmos a sua direção e participação no Dicionário de Eça de Queirós, de que se aguarda renovada edição, a que juntaríamos Eça de Queiroz. Uma biografia (2010), escrita após a publicação de 7 biografias de Eça de Queiroz (2004) e muitos outros ensaios. A. Campos Matos possuirá a maior biblioteca estritamente queirosiana do mundo, pois começou aos catorze anos a reuni-la a partir da biografia de Eça escrita por João Gaspar Simões e, desde então, coletou “tudo” sobre a matéria, a que juntou num arquivo pessoal tudo quanto é recorte de jornal, pagela, folheto, menu, etc. sobre temas queirosianos e ainda autógrafos do escritor e outra memorabilia.
Para escrever aquela sóbria e repensada biografia refletiu sobre a problemática do tema debatida por Holroyd, Virgínia Woolf, Maurois, Sartre, Kendall, Edel, Barthes e alguns autores portugueses na sua esteira, o que deu como resultado «não… um inventário de factos (da vida e obra) mas da tentativa de os conectar e de extrair deles escondidos significados, insuspeitados para o leitor desprevenido, de modo a criar uma personalidade viva. A arte do biógrafo deverá almejar a esse difícil desígnio» (Eça de Queiroz. Uma biografia, p. 26/27). E aí temos o biógrafo creditado. Mas também aí refere que o leitor, a quem afinal tudo isto se destina, «deverá avaliar [-se] que grau e espécie de intimidade tem o biógrafo com o seu autor, que tempo de convívio, que profundidade de leitura» (idem, p. 17), a que acrescentaríamos que “conversas” têm tido Eça e Campos Matos ao longo destes anos de “convívio”, algumas das quais estão publicadas em, por exemplo, Sobre Eça de Queiroz (2002).
E vai daí, fruto com certeza de muitas outras confidencias que não conhecemos, o biógrafo veríssimo publicou agora o Diário Íntimo de Carlos da Maia (1890-1930), sim senhor, esse mesmo, o de Os Maias, que não se matou nem se morreu quando descobriu a tragédia em que os fados o envolveram e na qual nenhuma culpa lhe cabe. Não tendo Eça tido tempo para publicar um terceiro volume onde nos contasse o que lhe sucedeu depois, A. Campos Matos veio a saber da existência deste seu diário encontrado na Livraria Lello do Porto (pois em que outro lugar do universo queirosiano haveria ele de aparecer?) e, o que é mais, prefaciado pelo seu filho, médico como o pai, e poeta.
Neste repositório de memórias, a personagem Carlos da Maia fala do seu criador, das vezes que esteve perto dele sem se atrever a falar-lhe, talvez para não “o corrigir”, pois nem sempre concorda com as opiniões que o criador tem sobre a sua criação. E o que é mais, com a morte prematura de Eça, Carlos da Maia descreve-nos queirosianamente muitos acontecimentos que lhe são posteriores, uns mundiais, como a 1.ª Grande Guerra, outros nacionais como a 1.ª República, outros regionais, ocorridos no Vale do Douro, outros locais, como os da sua quinta em Resende, outros familiares, como o seu casamento ou a carreira de seu filho, outros pessoais, como o seu exercício da Medicina, outros íntimos em muitas páginas de um diário que haveria de ser lido quando desaparecesse. E A. Campos Matos já o “matou”, pelo menos por agora.
Nestas páginas encontramos reflexões sobre as religiões, a literatura e a arte, mas também sobre o espírito crítico de António Sérgio nos seus ensaios, além de acontecimentos e personalidades da época, de Maximiano Lemos, a Raul Brandão e Sidónio Pais, ou o fenómeno de Fátima e de novo e sempre o duelo entre a ficção e a realidade: «… é necessário ter cuidado com a veracidade do que escrevem os escritores, sobretudo os ficcionistas. Estão sempre prontos a sacrificar a verdade dos factos se entenderem que esse sacrifício lhes traz vantagens de forma e efeitos de estilo, ou satisfações à sua vaidade» (op. cit. p. 382).
No posfácio, o autor constata que «o problema da efabulação literária sobre uma obra levanta, para muitos, esta interrogação: é ou não legítimo fazê-la?». Creio que mais do que uma questão de legitimidade, da lege, deveríamos antes interrogamo-nos se a obra ficou bem conseguida, se nos agrada. E aqui não tenho dúvidas: este Diário Íntimo de Carlos da Maia é uma notável (re)criação de A. Campos Matos, o resultado do seu quotidiano diálogo  de muitos anos com o escritor e que pode ser lido como um contributo à sua perenidade intemporal através destas memórias carregada de realidades sobre as quais certamente Eça de Queirós teria escrito se a vida se lhe tivesse alongado e viesse a morrer aos noventa e cinco anos. Como tal não aconteceu, A. Campos Matos transfigurou-se nesta efabulação e criou este livro onde pôs tudo quanto obteve da intimidade que tem com ele desde os catorze anos. Competirá ao leitor decidir onde termina um e continua o outro, se é que tal questão se pode pôr, pois para a pessoalidade da obra ela tem pouco interesse: este Diário é de Carlos da Maia, prefaciado por seu filho, ambos representados por A. Campos Matos, porque a fantasia não existe sem tutor, e será lido por muitos dos seus netos e bisnetos, que somos nós, conscientes de que vivemos apenas «…o que vive um foguete, o espaço dum estalo e dum clarão» (Eça de Queirós, O Conde de Abranhos).

J. A. Gonçalves Guimarães
Mesário-mor


Capítulo da Confraria Queirosiana

           
   No passado dia 22 de novembro decorreu no Solar Condes de Resende o 12º Capítulo da Confraria Queirosiana. A partir das 17,30 foram chegando os confrades e sócios vindos dos diversos pontos do país, e alguns outros chegados na véspera do Brasil e naquele próprio dia de Luanda.
     Reunidos nas antigas dependências da Casa, o cortejo de confrades desceu ao pátio e subiu ao salão nobre por entre as salas com as obras de arte do Salon d’ Automne queirosiano 2014. Esperava-os a orquestra de câmara da Escola de Música de Perosinho dirigida pelo maestro Prof. João Costa, a executar a Pastoral do Concerto Grosso em sol menor op. 6 n.º 8 de Corelli. A mesa foi formada por Eduardo Vítor Rodrigues, presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, que viria a ser insigniado neste mesmo capítulo; José Manuel Tedim, presidente da direção; César Oliveira, presidente da mesa da assembleia geral; J. A. Gonçalves Guimarães, mesário mor da Confraria e Olga Cavaleiro, presidente da Federação das Confrarias Gastronómicas Portuguesas, que usaram da palavra para referir as atividades da Confraria, dar as boas vindas às instituições presentes, aludir ao papel das confrarias na cultura portuguesa e, o presidente no encerramento da sessão, às atribuições do Solar enquanto equipamento municipal no programa da câmara para a Cultura e a Educação. Estiveram presentes, além das instituições já referidas, a Associação Cultural Amigos de Gaia, Associação de Amizade Portugal- Egito; Associação dos Amigos de Pereiros; Confraria da Doçaria Conventual de Tentúgal; Confraria do Medronho, Tábua; Confraria do Vinho de Carcavelos; Confraria dos Enófilos da Estremadura; Confraria dos Sabores de Sintra; Confraria dos Ovos Moles de Aveiro; Confraria Gastronómica do Concelho de Ovar; Gertal; jornal As Artes entre as Letras; Junta de Freguesia de Canelas e Urbiface.
            Os sócios falecidos em 2013, D. Diogo de Cernache, 5º Conde de Campo Bello e o Eng.º José Pereira Gonçalves, foram recordados pelo mesário-mor e evocados nas páginas do n.º 11 da Revista de Portugal.
            Seguiu-se a assinatura de um protocolo de colaboração entre a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia e os ASCR - Confraria Queirosiana, de especial incidência no âmbito cultural e no projeto dos investigadores-tarefeiros.
            Foi ainda divulgado o bastão queirosiano, réplica do que Eça ostenta na “fotografia de noivado”, o qual complementa o trajo dos confrades.
Foram depois chamados os confrades que, ao abrigo dos Estatutos da Confraria, mudaram de grau devido à apresentação e divulgação de trabalhos sobre a vida, obra e época de Eça de Queirós, nomeadamente Eva Baptista, Licínio Santos, Maia de Fátima Teixeira e Sílvia Santos, a que se seguiu a insigniação dos novos confrades, Ricardo Haddad, industrial têxtil; Susana Moncóvio, historiadora da Arte e Eduardo Vítor Rodrigues, sociólogo e presidente da Câmara de Gaia. Não foi insigniado o realizador João Botelho pois, por motivos incontornáveis, não pode estar presente na cerimónia.
            A orquestra de Câmara tocou depois uma área de J. S. Bach e, após o discurso de encerramento, os três andamentos da obra de abertura do capítulo, após o que os presentes se dirigiram ao Jardim das Camélias, com exuberante floração nesta época do ano, colocar uma coroa de louros na estátua de Eça de Queirós.
        O convívio entre os confrades passou então ao pavilhão do Solar, onde foi servido o jantar queirosiano, abrilhantado pelos “Eça Bem Dito” que interpretaram canções da Belle Époque, tendo ao piano Maria João Ventura. Seguiu-se a exibição de danças de salão pela Academia Gente Gira e o Baile das Camélias.

Livros e revistas

Revista de Portugal

No capítulo de Confraria Queirosiana foi então lançado o n.º 11 da nova série da Revista de Portugal, de que é diretor Luís Manuel de Araújo. Dedicada aos 30 anos do Solar Condes de Resende como Casa Municipal de Cultura, apresenta na capa um recanto desta antiga residência senhorial pintado a óleo por Susana Guimarães e, no seu interior, o editorial, da autoria do diretor-adjunto da revista J. A. Gonçalves Guimarães e diretor da instituição, dedicado à efeméride, lembrando os aspetos mais relevantes destas três décadas e os acontecimentos internacionais que aqui tiveram lugar. Segue-se a memória dos confrades falecidos, D. Diogo de Cernache Conde de Campo Bello, e o Eng.º José Luís Pereira Gonçalves e depois diversos estudos sobre documentos em latim, entre eles um fragmento de partitura musical possivelmente do século X, da autoria de Manuel António Ribeiro; um estudo sobre a vida e obra de Leal da Câmara, de José Manuel Gonçalves; uma abordagem da História Empresarial a nível mundial por J. A. Gonçalves Guimarães; um depoimento circunstancial e pessoal sobre o 25 de Abril por Jaime Milheiro, a que se seguem recensões de Luís Manuel de Araújo e de José António Afonso sobre “A oratória política do Padre António Vieira” de José Nunes Carreira; as “Memórias Paroquiais de 1758”, vol. V; e sobre a Editora &etc., e uma notícia sobre o livro “Leiria no século XIX” de Charters d´Azevedo. O presente número inclui ainda a Bibliografia dos sócios e confrades referente a 2013 e as Atividades da associação editora no mesmo ano.

Na senda de Fernão Mendes
   



Editado pela Gradiva, foi lançado no passado dia 19 de novembro no Grémio Literário em Lisboa, o livro “Na senda de Fernão Mendes – Percursos Portugueses no Mundo” da autoria de Guilherme de Oliveira Martins, presidente do Centro Nacional de Cultura. O livro reflete as visitas feitas por esta entidade sob o lema “Os Portugueses ao encontro da sua História”, peregrinações realizadas aos diversos pontos do globo por onde os portugueses deixaram a marca da sua passagem e da sua humanidade.




Escutar a Literatura
      

Da autoria de Mário Vieira de Carvalho, será apresentado a 18 de dezembro na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, o livro “Escutar a Literatura. Universos sonoros da escrita”, que aborda as relações com a música e o canto de autores como Garrett, Teolinda Garção e Lídia Jorge, entre outros. Sobre Eça de Queirós apresenta este livro o interessantíssimo capítulo IV -  “ O som e a escuta na emergência do estilo queirosiano: O Crime do Padre Amaro”, aqui com quatro “andamentos” sobre a música nesta obra deste escritor.



Arquivos de Família

            Editado pelo Instituto de Estudos Medievais, com prefácio de Silvestre Lacerda e o patrocínio, entre outras entidades, do nosso confrade Ricardo Charters d’ Azevedo, vai ser lançado no dia 10 de dezembro no Centro Nacional de Cultura em Lisboa, o utilíssimo livro “Arquivo de Família: Memórias Habitadas. Guia para salvaguarda e estudo de um património em risco”, o qual interessa a todos aqueles que têm arquivos privados e públicos, ou que têm de os rentabilizar culturalmente.
            Está também disponível em versão digital (e-book) no site daquele Instituto.

Eça no Teatro

            Entre 7 e 23 de novembro passados esteve em cena no Teatro Municipal Joaquim Benite em Almada, a peça O Mandarim, adaptada do livro de Eça de Queirós e encenada por Teresa Gafeira, com sessões especiais para grupos escolares. Temos assim mais uma adaptação da obra do escritor ao palco.

Leiria queirosiana

            No Centro Histórico de Leiria na rua Barão de Viamonte, antiga rua Direita, abriu ao público o Espaço Eça, um bar onde se podem degustar algumas especialidades gastronómicas e enófilas e ler um livro, no cenário onde o escritor viveu um ano que lhe havia de inspirar O Crime do Padre Amaro.
            Com uma oferta bastante diversificada, bastava porém que fossem servidos os vinhos, outras bebidas, e as comidas constantes na obra de Eça, sem ser preciso inventar nada, pois não vemos o que é que o escritor terá a ver com os petiscos de Castelo de Vide e da parafernália de cervejas estrangeiras anunciadas para o local. Eça de Queirós deve ser texto e não pretexto para qualquer coisa que nada tenha a ver com o seu universo. Mesmo assim, a Confraria convida todos os seus confrades a frequentarem este bar e deseja o maior sucesso aos seus gerentes, independentemente de acatarem ou não as nossas sugestões.


Pereiros, aldeia dos sonhos

            A aldeia de Pereiros, S. João da Pesqueira, num concurso realizado pela Fundação INATEL intitulado “Aldeia dos Sonhos”, entre 65 selecionadas para a final, obteve um honroso segundo lugar. A candidatura foi apresentada pela Associação dos Amigos de Pereiros, com quem a Confraria Queirosiana tem um protocolo de colaboração já materializado em diversos projetos. A entrega do galardão teve lugar no dia 3 de novembro em Campo Maior, tendo aquela associação sido representada pelo nosso confrade Alberto Silva Fernandes.


Eça &  Outras,  IIIª. Série, n.º 75 – terça feira, 25 de novembro de 2014
Cte. n.º 506285685 ; NIB: 001800005536505900154
IBAN: PT50001800005536505900154; email:queirosiana@gmail.com; www .queirosiana.pt; confrariaqueirosiana.blospot.pt; eca-e-outras .blogspot .pt; vinhosdeeca.blogspot.pt; academiaecadequeiros.blogspot.pt; coordenação da página: J. A. Gonçalves Guimarães (TE-638); redação: Fátima Teixeira; inserção: Amélia Cabral; colaboração: Charters d’ Azevedo.

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