terça-feira, 25 de março de 2014

Eça & Outras

As canções não são eternas

Todos nós temos as canções da nossa vida, que normalmente são as da infância e as da juventude, aquelas que nos acompanharam com uma melodia, uns versos, um intérprete.
Já no tempo de Eça era assim, salientando o escritor em várias obras as qualidades do grande compositor popular do seu tempo, que «com quatro compassos e duas rabecas, deixou para sempre desautorizadas velhas instituições… Offenbach é uma filosofia cantada» (Uma Campanha Alegre). Também ouviu as grandes vedetas canoras da sua época, como Herminia Borghi-Mano, no S. Carlos em 1880, enquanto em A Cidade e as Serras se refere à cançonetista francesa Gilberte e o seu grande êxito Les Casquettes.
Ele próprio foi autor de versos que, eventualmente, poderiam vir a ser cantados e, com Jaime Batalha Reis, compôs os da opereta cómica A Morte do Diabo, musicada por Augusto Machado. Dos seus gostos musicais obviamente que só conhecemos o que nos deixou escrito e as respetivas partituras. Talvez tivesse tentado o fado coimbrão e sabemos que trauteava a Rosa Tirana, o “hino” dos Vencidos da Vida. Pouco mais, pois no seu tempo, o fonógrafo, inventado por Edison em 1877, era pouco mais do que uma curiosidade.
Mas já não era assim na década de sessenta do século passado: estávamos então no auge das emissões radiofónicas e a televisão, curiosamente inventada pelo português Adriano de Paiva em 1878, começava a fazer parte do nosso quotidiano, enquanto se generalizava a venda e utilização do disco de vinil e os respetivos gira-discos, os gravadores de bobines, os auto-rádios e os gravadores-reprodutores de cassettes. O próprio cinema passou a realizar grandes documentários sobre os acontecimentos musicais da época e os músicos e intérpretes mais famosos apareceriam regularmente no grande écran. A música yé-yé, depois pop, rock, os blues, o soul, a balada, e outras denominações para os diversos géneros que iam surgindo, passaram pois a fazer parte do mundo artístico daqueles que nasceram em meados do século XX. E também a música comercial e a pimba, cuja banalidade e mau gosto se tornou desde então insuportável, mas que vende milhões de cópias.
Cada um recordará as suas canções preferidas, mas para mim elas foram as seguintes: logo em 1962 a cançonetista francesa Françoise Hardy grava Tous Les Garçons Et Les Filles, uma canção sobre o amor juvenil numa época em que os liceus ainda não eram mistos. Mas para além dos problemas da adolescência, um muro de betão começava então a aparecer na estrada da vida dos rapazes, que mais tarde ou mais cedo o teriam pela frente: a Guerra Colonial, variante portuguesa da Guerra do Vietname que os americanos travavam lá longe contra o povo vietnamita, com a mesma origem ideológica do colonialismo e do imperialismo ocidental sobre os povos do Terceiro Mundo, mas também sobre os povos beligerantes, dentro dos seus próprios países também sujeitos à pobreza, à descriminação, ao subdesenvolvimento, como era então o caso das populações nativas, negra e migrante americanas, a maior parte da população rural e fabril em Portugal, e a então quase inexistente classe média das colónias portuguesas. Para tal eramos alertados por canções como We Shall Overcame, cantada por Pete Seeger, a Trova do Vento Que Passa, de Manuel Alegre cantada por Adriano Correia de Oliveira, ou Os Vampiros de José Afonso, todas elas lançadas em 1963, enquanto no ano seguinte Bob Dylan avisava que The Times They Are A Changin. Todos desejávamos que sim.
A incerteza do futuro ainda nos fazia considerar o encanto de algum tempo já perdido, como em Yesterday dos Beatles (1965), que no psicadélico álbum Sargent Pepper´s Lonely Hearts Club Band já futuravam em 1967 sobre When I’m Sixty-Tour, como estaria aquela geração em 2014. Digamos que, de um modo geral, estamos a rebobinar as cassettes que nos foram impingindo e achamos que ainda vamos a tempo de emendar o mundo.
Nesse mesmo ano de 1997 é lançado o hino de toda a geração hippie, San Francisco (Be Sure To Wear Some Flowers In Your Hair), cantado por Scott Makenzie, mas o ano ficará assinalado pelas três grandes e insuparáveis composições de toda a Música Pop: Good Vibrations, pelos Beach Boys; Whider Shade Of A Pale, pelos Procol Harum e Niths In White Satin, pelos Moody Blues. Não haveria melhor: são realmente as músicas emblemáticas dos anos sessenta, representativas de uma certa solidão tanto mais dolorosa quanto a época era de movimentos em torno de ideias coletivas. Por isso aqui também incluo o Let It Be dos Beatles e a Pedra Filosofal de António Gedeão, cantada por Manuel Freire. Ainda na senda da constatação das dificuldades do caminho, recordemos o primeiro disco de Fausto, com o poema Oh Pastor Que Choras (1970), de José Gomes Ferreira, que concluía que «carneiros é o que mais há». O mundo idílico desta geração tem depois o seu ponto alto em Imagine de John Lennon, um hino anarquista e libertário na melhor tradição oitocentista editado em 1971. Nesse mesmo ano José Mário Branco revisita a lírica camoniana com Mudam-se Os Tempos Mudam-se As Vontades, cantando a inevitabilidade da derrocada dos velhos do Restelo e de outros ancoradouros.
A nível do som e da dança os jovens de então já não andavam apenas candidamente com «les yeux dans les yeux» como dez anos antes, mas libertavam o corpo e a mente em afeto e prazer ao som de Black Magic Woman divulgado pelos Santana, a música mais sensual da década.
Entretanto ainda em 1971, José Afonso gravava Grândola Vila Morena no álbum Cantigas do Maio e de lá de fora Sérgio Godinho bem nos alertava para O Charlatão, no álbum Os Sobreviventes, também daquele ano. Não haveria um mas muitos.
Estas são as minhas canções de teenager, de antes do 25 de Abril de 1974, que rapidamente foram substituídas por outras melodias. Tenho a certeza que algumas serão também as vossas.
Voltemos a Eça: apreciador e conhecedor da grande Música, contudo também ele se extasiou perante «a impressão profunda daqueles cantos árabes nas ruas do Cairo. São tão belos que entristecem, tão sensuais que são quase lacrimosos, tão doces que desesperam: é a música dos nervos; são os nervos que cantam…» (Prosas Bárbaras). Diria hoje o mesmo quando ouve Vitorino ou Janita Salomé, ou outros melodistas portugueses cuja sonoridade comove os povos muito para além dos acordos fonográficos das canções de festival e da macaquice de imitação americanoide que perpassa insuportável nas rádios e televisões portuguesas. Quanto a isso, temos o povo no seu “melhor”. Eu cá por mim permaneço fiel às minhas canções dos anos sessenta, certo de que os atuais jovens também terão as suas para um dia recordarem. Eça continuará a ouvir, divertido, a chanson Les Casquettes, sobre os dissabores das meninas que vinham para Paris à procura de um marido, então cantada com sucesso por uma hoje desconhecidíssima Gilberte. C’est la vie!

J. A. Gonçalves Guimarães
Mesário-mor da Confraria

Camélias

Eduardo Vitor Rodrigues, presidente da Câmara de Gaia e José Mauel Tedim, presidente de direção dos ASCR-CQ.
No passado dia 8 de março pelas 14,30 horas no Parque da Quinta do Conde das Devesas em Vila Nova de Gaia decorreu a iniciativa “Inverno: Tempo de Camélias em Flor” que chamou a atenção para as 127 variedades aí existentes, das quais 95 portuguesas. Do programa constou o lançamento de um livro sobre Camélias, uma intervenção do presidente da direção dos Amigos do Solar Condes de Resende – Confraria Queirosiana, José Manuel Tedim, sobre a camélia Tedinia criada por Sequeira Tedim em 1844, e por fim uma alocução do presidente da Câmara de Gaia, Eduardo Vitor Rodrigues, sobre o significado das flores na vida das pessoas, a que se seguiu a plantação daquela variedade de camélia no Parque.
Entretanto no Solar Condes de Resende florescem as últimas deste ano, que só voltarão com as suas cores em novembro próximo.


Conferências e debates

Entre 6 de março e 10 de abril decorre na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas o Ciclo Documental António Pedro Vasconcelos, durante o qual serão apresentados quatro documentários sobre quatro personalidades portuguesas do século XX: Cottinelli Telmo, J. Rentes de Carvalho, Eduardo Gageiro e Vasco Santana, realizados por Leandro Ferreira.
O documentário sobre J. Rentes de Carvalho, filmado no Solar Condes de Resende e no Monte dos Judeus em Gaia, contou com a colaboração desta Casa Municipal de Cultura e da Confraria Queirosiana, que ali preserva e divulga o espólio deste escritor seu Confrade de Honra.
Entretanto a revista Atual do Expresso de 22 de março dedicou a capa e o seu interior a Rentes de Carvalho, que nesse mesmo dia pelas 17 horas lançou na FNAC do Chiado, Lisboa, o seu mais recente livro “Portugal, a Flor e a Foice, só agora editado entre nós quando a primeira edição holandesa data de 1975. A apresentação esteve a cargo de Henrique Monteiro. Este será com certeza o texto de reflexão para a passagem do quadragésimo aniversário do 25 de Abril.

Eça em Aveiro

No passado dia 11 de março, no anfiteatro Aldónio Gomes da Universidade de Aveiro decorreu uma conferência pelo escritor luso-americano Carlos Queirós e pelo professor Pedro Calheiros, que falaram «das ligações ancestrais e das vivências do escritor Eça de Queirós com os seus avós, na altura a viver em Aradas e Verdemilho tão perto de Aveiro» (da divulgação da conferência).

Cursos e palestras no Solar

Prossegue no Solar Condes de Resende o curso livre sobre História Empresarial e Institucional, organizado pela Academia Eça de Queirós e certificado pelo Centro de Formação de Associação de Escolas Gaia Nascente: a 1 de março, José Manuel Tedim apresentou “O ensino das Belas Artes no Porto: da Academia à Faculdade; a 15, Susana Moncóvio falou sobre “O Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia”, e no próximo sábado, dia 29, Laura Peixoto dissertara sobre “As fábricas de bolachas e chocolates na Região do Porto”.
O curso terminará com as sessões proferidas por J. A: Gonçalves Guimarães a 12 de abril sobre “Empresários e Instituições gaienses” e a 13 de maio por Francisco Ribeiro da Silva sobre “ Empresários e Instituições portuenses”.
O próximo curso, a iniciar em outubro, será sobre “História e Carisma da Região do Douro Atlântico (Gaia, Porto, Matosinhos): novas abordagens”. A frequência destes cursos, ou das suas sessões, implica inscrição prévia.
Entretanto prosseguem também no Solar as palestras das últimas quintas-feiras do mês, com entrada livre. No próximo dia 27 de março José Manuel Tedim falará sobre “Lorain e os paisagistas da Europa do século XVII”.
A palestra do mês de abril deverá ser integrada na evocação dos 40 anos do 25 de Abril.

Livros


No próximo dia 28 de março na Casa Barbot em Vila Nova de Gaia, a nossa associada Dr.ª Maria Virgínia Monteiro lançará o seu mais recente livro de poesia intitulado Canto Quântico, o qual será apresentado por Salvato Trigo, reitor da Universidade Fernando Pessoa do Porto.




Tertúlia queirosiana

No passado mês fizemos referência às interrogações com que alguns dos nossos investigadores da História do século XIX se têm deparado sobre a identidade da mãe do filho do 5.º Conde de Resende, D. Luís Manuel Benedito da Natividade de Castro Pamplona, a qual não aparece nos registos genealógicos da família.
Sobre o assunto recebemos a seguinte informação de António Eça de Queiroz, bisneto do escritor, ele próprio jornalista e autor de diversas obras de crónica e ficção, a qual, com a sua autorização, passamos a divulgar:
«Tomei a liberdade de lhe mandar esta nota em relação à pergunta que faz sobre a desconhecida mãe de Luiz de Castro - ou “Luiz Grande”, como foi sendo conhecido na família. Naturalmente, só posso contar aquilo que me contaram os meus Pais - pois documentos ou algo de semelhante sobre o assunto desapareceu (admito que por vontade explícita do próprio Luiz Grande). A mãe seria uma cantora lírica francesa de passagem por Lisboa, com quem Luiz de Castro Pamplona teve um caso e um filho que ela não desejava - mas que o pai assumiu por completo. De acordo com os mesmos testemunhos, muitos anos mais tarde, já Luiz Grande era homem feito, recebe um cartão de visita de uma senhora francesa que solicitava a presença dele num hotel de Lisboa. Achando tratar-se de alguma conquista, o que não seria nada de estranho porque ele tinha fama de bem parecido, e movido por natural curiosidade, Luiz Grande apresentou-se à hora marcada no tal hotel. Mas, ao contrário de uma jovem faiscante de beleza, o que lhe surgiu pela frente foi uma senhora, não velha mas já matrona, que, depois de breve inquirição, se lhe apresentou como a sua mãe! Luiz de Castro não era pessoa fácil, e eram conhecidos na família os seus ataques de fúria, mas ali, naquele caso, limitou-se a cumprimentar a dita senhora, e a virar-lhe as costas depois de lhe dizer que se não o quisera conhecer até ali, então não valia a pena conhecê-lo agora. Sei bem que nada disto tem valor histórico, que eu saiba não há qualquer documento junto dos seus descendentes diretos, mas é esta a história que sempre conheci e que imaginei ter algum interesse em conhecer».
Ao nosso Caro Amigo agradecemos esta interessante achega que permitirá seguir a pista das cantoras líricas que passaram por Lisboa em 1869, o ano da ida do Conde (e de Eça) em peregrinação à Terra Santa para lavar a alma no Jordão, e que ali ainda permaneceriam em março de1870, para se tentar saber qual delas poderá ter sido a mãe de seu filho Luís, que virá a nascer a 28 de dezembro esse ano.

Novos corpos gerentes

No passado dia 14 de março, em assembleia eleitoral paralela à assembleia geral ordinária para aprovação do Relatório e Contas referentes a 2013, foram eleitos os Corpos gerentes dos ASCR-CQ – Confraria Queirosiana para o biénio 2014/2015. A única lista votada, proposta pela anterior direção, é assim constituída: Mesa da Assembleia Geral – César Fernando Couto Oliveira, presidente; José António Martin Moreno Afonso e Nuno Miguel Resende Jorge e Mendes, secretários; Henrique Manuel Moreira Guedes e Susana Maria Simões Moncóvio, suplentes; Direção: José Manuel Alves Tedim, presidente; Luís Manuel de Araújo, vice-presidente; Joaquim António Gonçalves Guimarães, secretário; Amélia Maria Gomes Sousa Cabral, tesoureira; Carlos Alberto Dias de Sousa, José Manuel de Carvalho Ribeiro e Ilda Maria Oliveira Pereira de Castro, vogais; José Luís Pereira Gonçalves e Maria de Fátima Teixeira, suplentes; Conselho Fiscal: Manuel Filipe Tavares Dias de Sousa, presidente; Pedro Almiro Neves, secretário; Licínio Manuel Moreira Santos, relator, Laura Cristina Peixoto de Sousa, suplente.


Prémio Prof. Reynaldo dos Santos

No passado dia 17 de fevereiro no Grémio Literário foi entregue o prémio Prof. Reynaldo dos Santos criado pela Federação dos Amigos de Museus de Portugal, no qual os ASCR-CQ estão filiados, referente a exposições realizadas em 2012.
O prémio foi ganho pelos Amigos do Museu Nacional do Azulejo, que propuseram a exposição “Um gosto português. O uso do azulejo no século XVII”. Foram ainda atribuídas duas menções honrosas, aos Amigos do Museu Nacional de Arte Antiga pela exposição “O Virtuoso Criador – Joaquim Machado de Castro 1731-1822”, e aos Amigos do Museu do Oriente pela exposição “O Chá. De Oriente para Ocidente”.

Mestrados e Doutoramentos



Concluiu no passado dia 24 de janeiro na Universidade de Coimbra o seu Mestrado em História, Especialização em Museologia, a nossa associada Dr.ª Rita Fernanda do Vale Pinto Pedras, que o apresentou também publicamente na Santa Casa da Misericórdia de Penafiel no passado dia 22 de março, subordinado ao tema “As Misericórdias e a sua ligação com a museologia: o caso particular do Museu de Arte Sacra de Penafiel”.






Também naquela Universidade, no passado dia 28 de fevereiro, apresentou a sua tese de doutoramento em Biologia, Especialização em Ecologia, o nosso sócio e Confrade de Honra Doutor Nuno Fernando da Ascenção Gomes Oliveira diretor do Parque Biológico de Gaia, sobre o tema “A Flore Portugaise e as viagens de Hoffmannsegg e Link a Portugal (1795-1801)”.
A ambos as nossas maiores felicitações.






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Eça & Outras, IIIª. Série, n.º 67 – terça-feira, 25 de março de 2014
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