O condomínio da Europa
Gravura do Charivari, 1889. |
Por norma o cidadão comum sabe
pouco da História da sua terra, do seu país, da Europa e do Mundo. Regra geral,
saberá as vicissitudes do atual campeonato de futebol, se for homem, e as
monótonas futilidades das telenovelas, se for mulher. Na escola
matraquearam-lhe uns vagos Romanos, um D. Afonso Henriques fundador, um Infante
D. Henrique navegador, um Vasco da Gama descobridor, e pouco mais ficou. O
“resto” é tudo vago, nevoento, feito de curiosidades para eruditos, normalmente
aborrecidas. Daí que explicar ao dito cidadão o que tem sido a evolução da
Humanidade e, agora o que mais interessa, a da Europa, não seja tarefa fácil.
Para ver se ele compreende, parafraseando Salgueiro Maia na véspera do 25 de
Abril, «o Estado a que isto chegou» elaboramos a metáfora que se segue. É aliás
para isso que serve a História: reter memórias credíveis para criar o paraíso
na Terra. Se não for assim é justo que o cidadão normal continue no ópio do
futebol ou a chafurdar na monotonia televisiva. Os outros, os que se preocupam,
que se amanhem. Ele “está-se nas tintas” para a política. A sua principal
preocupação são as próximas férias “de papo para o ar”.
A Europa é um condomínio fechado,
uma espécie de propriedade em terraços, como nos complexos turísticos, em que
os ricos habitam mais acima, com melhores vistas para o mar largo da economia,
e os mais pobres, indigentes e insolventes, habitam nos rez de chaussée.
A vigilância da propriedade tem sido assegurada pela NATO, uma empresa
norte-americana com escritórios nos Açores e noutros locais, que não só recebe
pelo serviço como, em contrapartida, pode intervir noutros países e outras
regiões do globo como lhe apraz, que a administração do condomínio europeu não
se opõe. É certo que tem ido longe buscar lenha para se queimar em casa, mas o
saldo em mortes a seu favor é astronómico. Nesta administração europeia quem
manda são obviamente os proprietários ricos que elegem sistematicamente a
Alemanha para mandar no condomínio e trancar o elevador, as “partes comuns”, a
garagem, as antenas parabólicas, decidir as despesas e as obras a fazer. Anos
atrás, os ricos do norte entusiasmaram os pobres condóminos do sul a gastarem à
tripa forra, a fazerem obras, a comprarem o que lhes deu na republicana gana
para embelezarem os “apartamentos”, emprestando-lhes dinheiro com fartura. Foi
um plano diabólico para apanharem de vez a administração do condomínio e, na
melhor das hipóteses, reduzirem os proprietários do sul a trabalhadores
precários da limpeza, jardineiros, canalizadores, pobres contribuintes
endividados e sem dinheiro para pagar as prestações a tempo e horas. Já para
não falar naquele condómino amalucado do norte com quem é difícil conviver: a
Inglaterra, neste edifício da Europa, sempre se portou como uma velha rezingona
que gosta mais do seu bichinho de estimação – a libra – do que de qualquer
“politica comum”. Sempre foi assim desde Isabel I até ao recente funeral da
dama de ferro de engomar.
Fala-se, de vez em quando, que os
condóminos do sul deveriam reunir-se para decidirem como é que podem voltar a
ter voz ativa no prédio. Mas ninguém os leva a sério, nem eles próprios, pois o
que eles gostam mesmo é de continuar a ver futebol e telenovelas, não nos
intervalos do dia-a-dia, como os seus vizinhos do norte, mas a todas as horas
do dia e da noite, entre duas varredelas, duas cortadelas de relva, uma
torneira deixada a pingar, um escândalo no futebol, um banco a prometer 25% de
juros. Os condóminos do sul, mesmo com vulcões nos Capelinhos e na Itália,
acreditam em muitas e estranhas coisas, entre as quais, que a Europa
permanecerá necessária para os condóminos do norte continuarem a passar férias
baratas nas praias do sul e e mandarem na administração do condomínio, cada vez
menos fechado é certo, que a concorrência entre as “empresas de vigilância”
americanas, russas, chinesas e iranianas começa a ser grande. E todas elas a
quererem “proteger a Europa”. Mas, no fundo, no fundo, o que elas querem é
demolir este “prédio” que, apesar de tudo, lhes têm dado um padrão de
referências, humanamente nem sempre muito melhor do que o seu, mas, que diabo,
mais universal, mesmo que com prejuízo da própria Europa, o continente onde o
respeito pelo outro e a tolerância deixaram escola, ainda que vagamente
filosófica ou poética, ainda que com cartilhas diferentes no norte e no sul, ou
seja, inútil e despesista como diria um MBA de qualquer universidade de Porto
Rico. Como escreveu Eça de Queirós ainda em oitocentos, «… de todos os homens,
só o europeu verdadeiramente possui fantasia – quero dizer, a faculdade de ser
ou de criar com genuína originalidade. Só ele põe fantasia, não só na sua obra,
mas também na sua vida» (Notas Contemporâneas “A Europa em resumo”).
Eça foi um inegável europeu chauvinista e
clarividente. A velha Europa acabará por erguer-se, como o seu mito da Fénix
renascida, mas não será por obra e graça dos corretores de Wall Street. Mas o
mundo será certamente diferente. Preparem desde já as veredas e mandem lavar as
vestes, mas desculpem não vos poder confidenciar quando chegará essa boa nova.
J. A. Gonçalves Guimarães
Grémio Literário
Esta centenária instituição
lisboeta fundada, entre outros, por duas personalidades gaienses, Almeida
Garrett e D. Manuel Bento Rodrigues, e frequentada por Eça de Queirós e por muitas
outras figuras da Cultura portuguesa, com a qual a Confraria Queirosiana tem um
protocolo de colaboração, se o bom senso não voltar ao país corre o risco de, a
breve prazo, encerrar devido à recente lei das rendas que vai destruir, em nome
do economês, o equilíbrio social e cultural das cidades e vilas, ou seja, a sua
alma. Contra as medidas cegas desta lei já se manifestaram a própria Câmara
Municipal de Lisboa e outras agremiações de cidadãos.
Livros
Aqui nasceu J. Rentes de Carvalho
(reprodução autorizada pelo artista) |
Adélio Martins, que já tinha
pintado um retrato do escritor, recriou agora a casa onde ele nasceu no Monte
dos Judeus em Gaia (ver o blogue Pintar na Terra), devolvendo ao lugar, através
da sua recriação artística, a dignidade que lhe foi tirada pelas construções
espúrias que ali foram sendo edificadas desde os anos cinquenta do século
passado e até por aquela tentativa de lhe chamar Monte Coimbra que não vingou.
A Confraria Queirosiana apoiará todos os projetos que queiram dignificar o
local central do romance Ernestina.
Como noticiamos, foi recentemente
lançado o seu novo romance Mentiras & Diamantes que tem sido acolhido
com enorme aplauso pelos seus muitos leitores que consideram que «não há nada
que se compare aos livros de José Rentes de Carvalho na literatura
contemporânea» (hmbf). O autor tem falado sobre esta nova obra em várias
revistas e são-lhe dedicadas páginas da Ipsilon de 26 de Abril e da Ler
de 2 de Maio próximos.
Entretanto, para além da divulgação
da sua obra em Itália, outras grandes editoras preparam-se para inserir os seus
textos em antologias da literatura portuguesa contemporânea ainda no presente
ano.
Arte Sacra
Acaba de ser publicado o catálogo
do Museu de Arte Sacra de Trevões, da autoria do nosso confrade Prof. Doutor
Nuno Resende, que é também o autor do projeto museográfico desta enriquecedora
“oficina de Cultura” situada naquela freguesia de S. João da Pesqueira de que é
dinâmico pároco o P.e Amadeu da Costa e Castro.
O catálogo, com excelente
apresentação gráfica, mostra as peças existentes neste Museu, desde uma cupa
romana a uma máquina de relógio, separadas por cerca de 2000 anos, e também os
paramentos, a pintura retabular, a escultura religiosa, livros sacros, alfaias
religiosas de prataria portuguesa, e ainda uma referência aos magníficos
frescos da igreja paroquial.
O autor, professor na Faculdade de
Letras da Universidade do Porto, tem um notável conhecimento do Património
Religioso da Diocese de Lamego, já acessível em vária da sua seleta
bibliografia.
Monografia
No passado dia 12 de Abril na sede
da Tuna Musical de Vilar de Andorinho, Vila Nova de Gaia, foi lançado o livro São
Salvador de Vilar de Andorinho. Notas monográficas, da autoria do
nosso sócio Dr. Francisco Barbosa da Costa com a colaboração do Dr. Paulo
Costa, editado pela respetiva Junta de Freguesia.
A terra do escultor Alves de Sousa
e do industrial Salvador Caetano ficou assim com uma nova referência
bibliográfica para a sua compreensão desde tempos remotos.
Brasil
A Confraria Eça-Dagobertiana de
Oeiras, Piauí, realizou no passado dia 30 de Março o seu XV Encontro
Litero-gastronómico no Cine Teatro local, onde foram analisados A Ilustre
Casa de Ramires, pela Prof.ª Maria da Conceição Neiva Santos Barbosa, e Arte
Sacra Popular e Resistência Cultural, de Dagoberto Carvalho J.or,
pelo Prof. Edson Sá. Esta atividade teve o apoio da Secretaria Municipal de Cultura
local.
Verdemilho, Aveiro
A comunicação social noticiou que a
Câmara Municipal de Aveiro finalmente tem um plano para salvar, dignificar e
valorizar a casa do avô de Eça de Queirós em Verdemilho, onde o escritor viveu
entre os cinco e os dez anos. A ação deveria igualmente abranger o jazigo de
família situado no cemitério de Outeirinho. Recorde-se que o avô de Eça, que
ele provavelmente não conheceu, foi o mentor da revolta de 1828 contra o
absolutismo, acabando por ter de exilar-se.
O Arq.to A. Campos Matos
em tempos apresentou à edilidade um projeto de recuperação daquela casa tão
singelo quanto digno da memória do escritor, de seu pai e seu avô, o qual terá,
obviamente, de ser considerado neste processo, pois foi elaborado pelo
arquiteto que mais sabe sobre Eça de Queirós.
Hotel em Lisboa
A capital portuguesa já tem o seu
hotel queirosiana. Chama-se Palácio Ramalhete e fica às Janelas Verdes, em
frente ao Museu Nacional de Arte Antiga, num soberbo edifício onde se restaurou
tudo o que era de qualidade e se instalaram equipamentos para o conforto atual.
A administração não quer impingir
aos seus hospedes uma ideia falsamente biográfica de Eça de Queirós, mas tão só
literária em volta de Os Maias e das ficções do escritor sobre a Lisboa
e o Portugal oitocentistas. E isso lhe basta para vender o charme deste
edifício que poderá ter inspirado a descrição da casa da família de Carlos da
Maia. E no meio de um cenário acolhedor e de bom gosto sempre se pode voltar a
reler este romance e toda a obra do escritor, ou o roteiro queirosiano de A.
Campos Matos sobre Lisboa e Arredores.
No passado dia 6 de Abril, na
abertura da Cartogaya 2013, exposição de postais dedicada aos 250 anos da Torre
dos Clérigos no Mosteiro de Corpus Christi, organizada pelo Clube de
Colecionadores de Gaia, o presidente da direção dos Amigos do Solar Condes de
Resende – Confraria Queirosiana, Prof. Doutor José Manuel Tedim, fez uma
conferência sobre “Nasoni e a Torre dos Clérigos”.
No passado dia 18 no Solar Condes
de Resende, com uma dissertação sobre “A Serra do Pilar ao longo dos tempos”
pelo mesário-mor da Confraria Queirosiana J. A. Gonçalves Guimarães, terminou o
1.º ciclo de palestras das 5.as feiras, iniciado em Outubro passado
e nas quais colaboraram também José Manuel Tedim, António Manuel Silva, Susana
Moncóvio e Eva Baptista, que versaram os mais variados temas. Estas noites de
Cultura serão retomadas em Outubro próximo.
Naquele mesmo dia 18 de Abril, J.
A. Gonçalves Guimarães participou numa ação organizada pela Misericórdia de
Gaia, integrada no Dia Internacional dos Monumentos e Sítios, sobre o
Património da Fábrica Cerâmica das Devesas, com visitas guiadas ao seu complexo
edificado, uma boa parte do qual pertence a esta instituição de beneficência
que o pretende conservar, valorizar e divulgar.
No dia 20 de Abril o mesmo
investigador ministrou no curso livre “Esplendor da Arqueologia: Ciência,
Cultura e Turismo”, que decorre no Solar Condes de Resende organizado pela
Academia Eça de Queirós, uma aula sobre “A outra Arqueologia do Côa: a estação
arqueológica de Ervamoira”. Este curso termina no próximo dia 4 de Maio com uma
aula sobre “De Portucale a Cale - reflexões arqueológicas sobre uma questão
historiográfica” por António Manuel Silva.
Em Outubro próximo a mesma
instituição vai promover um novo curso sobre História Empresarial e
Institucional para o qual já tem assegurada a colaboração de vários
investigadores de reconhecido mérito.
Exposições de Arte
Helder de Carvalho inaugurou na
Misericórdia de Braga, nas comemorações dos seus 500 anos, uma exposição de
retratos de figuras locais intitulada Rostos & Pessoas, na qual este
artista nosso consócio capta a expressão própria de cada um para além da
verosimilhança física.
Valença Cabral inaugurou no passado
dia 20 de Abril no Posto de Turismo da Beira Rio em Vila Nova de Gaia uma
exposição dos seus transcendentes quadros, em que a natureza se aproxima da
abstração, intitulada Paisagens, a qual está patente ao público até 11 de Maio.
Arqueologia urbana
No Centro Histórico de Gaia
decorrem obras de requalificação da Rua Rei Ramiro, ao Castelo de Gaia, as
quais estão a ser acompanhadas pelo nosso consócio Arqueólogo António Sérgio
dos Santos Pereira, membro do Gabinete de História, Arqueologia e Património
dos ASCR – CQ.
Colóquios, Jornadas e Congressos
Nos próximos dias 15 a 19 de Maio
decorre na Golegã e na Chamusca o 1.º Congresso Internacional o Cavalo e o
Touro na Pré-história e na História, na qual estarão presentes com comunicações
os sócios e confrades Fernando Coimbra, Luís Manuel de Araújo, J. A. Gonçalves
Guimarães e Susana Guimarães.
Nos dias 6 a 8 de Junho o confrade
Paulo Sá Machado promove em Boticas o Colóquio Internacional de Cultura Popular
comemorativo do 120º aniversário do nascimento de Gomes Monteiro.
Nos dias 28 e 29 de Junho o
Gabinete de História, Arqueologia e Património dos ASCR-CQ, com o patrocínio da
empresa Águas e Parque Biológico de Gaia e a colaboração da Junta de Freguesia
de Crestuma e do Clube Náutico, vai realizar as 1.as Jornadas
Arqueológicas do Castelo de Crestuma com a participação de arqueólogos e
historiadores portugueses e espanhóis.
A intervenção nesta estação
arqueológica deverá ter uma nova campanha no próximo verão.
Eça & Outras, IIIª. Série, n.º 56 – Quinta-feira, 25 de
Abril de 2013
Cte.
n.º 506285685 ; NIB: 001800005536505900154
IBAN: PT50001800005536505900154;
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coordenação da página: J. A. Gonçalves Guimarães (TE-638); redação: Fátima
Teixeira; inserção: Amélia Cabral; colaboração: Adélio Martins, Dagoberto
Carvalho J.or, J. Rentes de Carvalho.
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