Revista de Estudos Chineses - Zhongguo Yanjiu
Não existem em Portugal muitas publicações periódicas sobre outros países e civilizações ou sobre as relações entre a cultura portuguesa e a de outros povos.
Numa rápida abordagem informática encontramos apenas os seguintes títulos: Estudos Italianos em Portugal, publicado pelo Instituto de Cultura Italiana, desde 1939; Estudos Orientais, publicado pelo Instituto Oriental de Lisboa, desde 1990; Estudos Germânicos, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, desde 1998; Revista de Estudos Anglo-americanos e Germanísticos da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, desde 2001, a que poderíamos juntar a revista Africana do Centro de Estudos Africanos e Orientais da Universidade Portucalense Infante D. Henrique, que se publicou ao longo da década de 90 do século passado e que recentemente reapareceu. E pouco ou nada mais.
Sobre a China, supomos ser única a Revista de Estudos Chineses do Instituto Português de Sinologia, que apresentará em breve os n.ºs 4 e 5 em Lisboa e no Porto, durante os trabalhos do 5º Fórum Internacional de Sinologia, mantendo, ou mesmo aumentando, a variedade temática e a qualidade dos artigos que publica.
Sendo uma publicação abrangente sobre um tema universal – os estudos sobre a China e a sua relação com o mundo, ou do mundo com a China – tem vindo a arrumar a colaboração publicada em várias secções. Recordemos que no n.º 1 se podem encontrar artigos Falando sobre Minorias, sobre A nova Economia Chinesa, ou Medicina chinesa um repto às práticas ocidentais; no seu n.º 2 praticamente todos os estudos têm Macau como objecto de análise e no 3.º numero, encontramos análises no âmbito das Ciências Sociais, do Pensamento Jurídico e exercício da Justiça na China, alguns outros Falando de História e, de novo, Macau: memória.
Confrontando os programas dos Fóruns Internacionais de Sinologia já realizados, também pelo Instituto Português de Sinologia (IPS), não é difícil estabelecer uma relação directa entre os temas propostos, e os estudos aí apresentados, com os artigos publicados nesta revista, se bem que os números editados não sejam exactamente as suas Actas. Corroborando a sua internacionalidade (e não o internacionalismo) dos seus colaboradores, alguns deles são presença confirmada, não apenas nas suas páginas, mas também nas diversas publicações nacionais e internacionais que divulgam estudos sobre Sinologia e sobre as relações entre Portugal e os portugueses e a China. Sendo a revista propriedade do IPS, não se estranhará a constância dos temas sobre Macau, sendo pois fácil inferir que nos números futuros este antigo território, que esteve sob administração portuguesa, voltará às suas páginas. Não só sobre o seu passado muito há ainda a investigar e muitas são as novidades a aprender, como quanto aos seus anos mais recentes, a calma marcha do tempo ainda não passou o suficiente para que a serena análise histórica possa ser feita, privilégio que bem podem ir tentando sobre as últimas décadas os geógrafos, os economistas, os sociólogos, os politólogos, tanto quanto estas disciplinas se permitem ter fronteiras entre os seus saberes. Gostamos de os catalogar, mania que nos ficou do enciclopedismo; organizamo-nos em corporações, talvez para melhor nos entendermos e dividirmos as tarefas. Mas entretanto o fluir da vida passada, presente e futura continuará, quase indiferente às nossas escolas, teorias, doutrinas e praxis.
Todo este divagar para dizer que o número 3 da Revista de Estudos Chineses, afinal sobre essa enorme realidade mundial que é a China, é variado de temas, mas sobretudo de perspectivas de abordagem, no tempo e no modo, até porque diversos são os profissionais das áreas de conteúdo dos seus artigos.
Abrindo com um estudo de Óscar Barata, professor catedrático jubilado do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) da Universidade Técnica de Lisboa, intitulado «A Pressão sobre a China no século XIX», recua um pouco mais no tempo e nas referências às relações entre as potências marítimas ocidentais e o Celeste Império, e como elas foram variando ao longo do tempo, acentuando os aspectos comerciais das diversas companhias e as acções militares e diplomáticas dos países em presença, particularmente dos ingleses e dos portugueses e, naturalmente, dos chineses. Neste desiderato é analisada a tentativa dos ingleses para ocuparem Macau, o negócio e as guerras do ópio e a sua fixação em Hong Kong. Um trabalho imprescindível para se compreender a história destes dois territórios até aos nossos dias.
O segundo artigo, da autoria de Wang Tongsan, director do Institut of Quantitative and Technical Economics, Chinese Academy of Social Scienses, intitulado «The Deep-rooted Problems in China’s Macro-economic Operation and Policy Guidance of Macro-economy Control in 2008», traz-nos até ao presente os sucessos da economia chinesa, contrapontados com os problemas a curto e a longo prazo, no primeiro caso a pressão da inflação e as exigências dos mercados internacionais e, no segundo, as relações entre o desenvolvimento económico e social, a inevitável reestruturação dos sectores primário, secundário e terciário, o consumo energético e a poluição ambiental, naquela que virá a ser a maior potência mundial face ao colapso dos Estados Unidos da América, ao reordenamento da Rússia e à emergência da Índia e do Brasil.
Segue-se um artigo de Anne Cheng, professora de l’Institut Nacional dês Langues et Civilisations Orientales, intitulado «Confucian views and laws vs rites in Ancient China» onde analisa aspectos da devoção filial na dinastia Han e a tensão entre os ritos e as leis, os dois maiores reguladores da ordem sociopolítica na história da China. He Weifang, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Pequim, escreveu sobre a «China’s Judicial Reform» provocada pelas mudanças estruturais na actual sociedade chinesa, sobretudo depois de 1950, o que gerou antagonismos entre o direito escrito e a sua prática numa sociedade multiétnica, que as autoridades têm procurado aplanar através de oito directivas, a última das quais tem a ver com as relações entre a justiça e a comunicação social.
Problemas, dir-se-á, comuns a todas as sociedades desenvolvidas. Na China, talvez a ancora da tradição – de propósito não disse «o peso» - tenha um particular relevo que este autor não deixa de equacionar, como também o faz José Duarte de Jesus, ex-embaixador, docente no ISCSP e membro fundador do IPS, no artigo seguinte «A Justiça e o Estado na China Imperial e na Primeira República», no qual começa por nos advertir para os perigos da tentação de se estabelecerem paralelos entre conceitos jurídicos – ou outros – da tradição greco-cristã e os da civilização chinesa, nomeadamente os de Lei e Justiça ao longo das épocas, dinastias e períodos. Analisa depois as figuras do advogado e do litigador, até à Primeira República, concluindo, entre outros aspectos não menos interessantes, que, na antiga sociedade chinesa, havia «um humanismo profundamente civil» e que «os pressupostos confucianos antigos apontam bem mais para uma “open society” que os pressupostos platónicos».
Segue-se o artigo do autor desta recensão, sobre «Os estudos sobre as relações entre a região do Porto e a China: ponto da situação», que naturalmente não vou comentar, mas apenas o facto agradável e promissor de já me encontrar acompanhado por dois Amigos e Colegas: nesta revista, Manuel de Sampaio Pimentel A. Graça, professor na Escola Superior Artística do Porto (ESAP), apresenta-nos a sua investigação sobre «Chinoiserie e outros orientalismos no Porto» nos séculos XVIII e XIX, documentando nesta cidade o gosto por aqueles exotismos entre as classes possidentes, que os materializaram na decoração de edifícios, no mobiliário, nos tecidos decorativos, nas louças e em outros objectos de aparato.
Um outro Amigo, que consegui que se interessasse pelo Oporto China Fund criado pelos Cassels no final do século XIX naquela cidade para ajudar as missões do seu irmão William, bispo anglicano no interior da China, foi Fernando Peixoto, igualmente professor na ESAP, que o apresentou no II Fórum em Vila Nova de Gaia em 2007, mas que entretanto faleceu prematuramente no mês de Outubro de 2008, quando tanto ainda tinha para nos dar.
Mas a história dos tempos recentes na China está também analisada nesta revista no artigo «Le mouvement d’envoi des jeunes instruits à la campagne et les autres migrations organisées à l’époque maoiste» por Michel Bonnin, directeur d’études à l’École des Hautes Études em Scienses Sociales, que nos interpreta o que foi a migração de mais de dezoito milhões de jovens citadinos enviados para o campo entre 1968 e 1980, jovens esses que hoje têm 50-60 anos, muitos dos quais no topo da actual sociedade chinesa.
Seguem-se uma série de quatro artigos sobre Macau: «Evolução das árvores de arruamento na cidade de Macau» por António Júlio Emerenciano Estácio, engenheiro técnico agrário, e Fernando A. F. Macedo, arquitecto paisagista; «O cancelamento do IV centenário de Macau em 1955: as reclamações verbais das autoridades chinesas» por Moisés Silva Fernandes; «Bartolomeu Vaz Landeiro: the King of the Portuguese from Macao» por Lúcio de Sousa; e «Macau-Europa: a influência chinesa através dos seus produtos preciosos» por Rui d’Ávila Lourido, quatro importantes contributos para a permanente surpresa histórica daquele território, postos por ordem inversa do seu tempo cronológico e simbólico: os antigos jardins e espaços arborizados de Macau têm vindo a ser mutilados mas, entretanto, novas árvores têm vindo a ser plantadas nos terraplenos conquistados ao mar; em 1955 a China mostrou o seu desagrado pelas programadas comemorações dos quatrocentos anos da permanência dos portugueses no território, mas cuja administração, no entanto, aí permaneceria por cerca de mais meio século; Bartolomeu Landeiro é um daqueles portugueses que se foram ao mundo, capitão, mercador, protector de jesuítas e aventureiro, a quem os japoneses chamavam «o rei dos portugueses», personagem tão fascinante quanto esquecido e que agora aqui fica ao assombro dos leitores desta revista; finalmente o último artigo desta série propõe com bom fundamento o recuo da chinoiserie europeia para o século XVI, dando a Macau uma particular importância na divulgação dos produtos chineses na Europa.
Esta apresentação já vai longa e a ela se pode aplicar o provérbio chinês «Longos fios de seda trazem vantagem numa dança»; esta revista tem peças com certeza de diferentes espessuras e matizes, mas forma um notável conjunto que, mais uma vez, ficará na bibliografia necessária sobre a Sinologia em Portugal e no mundo.
J. A. Gonçalves Guimarães
Membro do IPS
Cartas Públicas de Eça
Uma equipa dirigida por Carlos Reis, professor catedrático da Universidade de Coimbra e actual reitor da Universidade Aberta, está a publicar a edição crítica das obras de Eça de Queirós, fixando o texto a partir dos manuscritos existentes, das edições revistas pelo escritor, das edições publicadas em sua vida, ou, no caso das obras póstumas, anotando a intervenção de outros na publicação do texto, confrontando todas as variantes, versões e edições no sentido de restituir a Eça o que é de Eça. Do Plano de Edição, na secção de obras de Ficção nos textos Não-Póstumos, estão já publicados O Crime do Padre Amaro (2.ª e 3.ª versões) O Mandarim e Contos I; dos Semi-Póstumos e Póstumos estão publicados A Ilustre Casa de Ramires, Contos II, A Capital! e Alves & C.ª; dos Textos de Imprensa, as colectâneas com este mesmo título, I, IV, V e VI; da Epistolografia, as Cartas Públicas, a que a seguir nos referiremos e nas Traduções As Minas de Salomão, faltando publicar, para além de outras obras em cada uma das secções do Plano de Edição, as enquadráveis nas Narrativas de Viagens e Vária.
Recentemente a Imprensa Nacional/Casa da Moeda pôs à disposição do público ledor, mormente os eçófilos e os eçólogos e, de um modo geral, todos os queirosianos, as Cartas Públicas, aqueles escritos a que o escritor «atribuiu forma epistolar» e «maioritariamente destinadas à imprensa», todos com «… o peculiar timbre que lhes foi incutido por um escritor que, além do mais, foi um cidadão do mundo, profundamente interessado na vida pública, nos costumes e nas ideias que atravessaram o seu tempo», conforme salienta Carlos Reis na Nota prefacial.
A presente edição foi estudada e preparada por Ana Teresa Peixinho, que em 2008 se doutorou na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra com uma dissertação sobre A Epistolaridade nos textos de Imprensa de Eça de Queirós, sendo agora professora auxiliar do Instituto de Estudos Jornalísticos daquela Faculdade e investigadora do CEIS 20, tendo já publicado em 2004, em co-autoria com Carlos Reis, os Textos de Imprensa I (da Gazeta de Portugal), e em 2002 a sua tese de mestrado intitulada A Génese da Personagem Queirosiana em Prosas Bárbaras, pela Editora Minerva.
João Nicolau de Almeida
Chevalier de l’Ordre du Mérite Agricole
Hoje, dia 25 de Fevereiro, pelas 18 horas, o Cônsul Geral de França no Porto, Senhor Philippe Barbry irá condecorar na Casa Ramos Pinto em Vila Nova de Gaia com o grau de Cavaleiro da Ordem do Mérito Agrícola, o enólogo João Rosas Nicolau de Almeida, administrador daquela empresa do grupo Roederer.
O agraciado nasceu no Porto em 1949, filho de Fernando Moreira Paes Nicolau de Almeida, o criador do Barca Velha, e de D. Maria José Ramos-Pinto Rosas Nicolau de Almeida. Frequentou as Universidades de Dijon e Bordéus, onde se diplomou em Enologia, Química Agrícola e Prova de Vinhos. Tem leccionado nas Universidades de Bordéus, UTAD e Universidade de Davis (Califórnia). É membro da Confraria do Vinho do Porto, onde tem desempenhado cargos directivos, da American Society of Enologists (EUA), da Associação dos Produtores e Engarrafadores do Vinho do Porto e da Associação para o Desenvolvimento da Viticultura Duriense (ADVID). É também sócio dos ASCR-Confraria Queirosiana e do Oporto Golf Club.
Criador do célebre Duas Quintas e de outros vinhos de eleição, é autor de diversos estudos sobre a mecanização da vinha no Douro e sobre as suas castas.
Passeio a Oeiras do Piauí
Em sexta edição acaba de ser publicado Passeio a Oeiras, «Roteiro histórico e sentimental da antiga capital do Piauí» por Dagoberto Carvalho Jr., o notável plumitivo presidente da Sociedade Eça de Queiroz do Recife, médico e historiador encartado que à estampa tem dado outros títulos sobre a história documental, artística, institucional e literária da sua região natal, mas também sobre essa lusitanidade maior que é o espírito universalista queirosiano.
Esta obra, aparecida em 1982, sucessivamente esgotada e em cinco edições rejuvenescida, é um daquele livros de um intenso afecto pelo torrão natal que o autor, percorrendo de braço dado com o leitor os locais que sendo dele, por direito próprio, partilha como que em busca da possível eternidade presente nas calçadas, nos largos, nas casas e na memória das pessoas que os habitaram e a quem chama «velhos fantasmas amigos», simpáticos e carregando as suas idiossincrasias, já não como um embaraço ou pesadelo quotidiano, mas como quem apresenta a corcunda do destino sob casaca de veludo bordada a lantejoulas no desfile do carnaval feliz que são as nossas memórias descritas com arte. Sempre são muito infelizes aqueles que do seu passado carregam amargor, mas tal não é o caso de Dagoberto Carvalho Jr, pois este livro sobre a sua Oeiras natal é tanto um livro de História como de memórias pessoais de uma intensa generosidade sensata para com os que já foram e lhe deixaram um palco onde hoje a vida escorre quotidiana cheia de recordações, que é aquilo que um actual bairro periférico ou uma Brasília demorarão a ter. Não sendo cotada na bolsa, para nosso gáudio e satisfação a Memória conta muito para o equilíbrio intelectual de qualquer cidadão.
Acrescente-se que este livro, graficamente bem urdido, apresenta deliciosas vinhetas de Mário Paciência, mapa de Josevita Pontes e notáveis reconstituições de Zuleica Tapety, numa verdadeira e encantatória arqueologia da paisagem e da arquitectura. Não se trata da presença embonecadora de artistas, mas de um espírito de comunhão entre o autor e os ilustradores que muito enriquece esta obra onde se mostra de uma forma tão elegante como o local pode ser universal, «agora, na lembrança dos que vierem comigo a Oeiras», assim termina o autor, certo de que este passeio, presencial ou literário, ficará na memória dos seus leitores.
Tomar Café com:
Ariel Ramirez, para de novo cantarmos a sua Missa Creoula, em memória da sua apresentação no Teatro Carlos Alberto do Porto já lá vão uns anos; Mikael Anderson, o piloto calmo que aterrou seguro o avião no meio de uma tempestade humana; Orlando Zapata e sua mãe Reina Tamayo, para que um dia Cuba seja a ilha da felicidade.
Não quero ir tomar café com:
Mário Machado, o skin que destila ódio. E tantos outros que nem soube por onde escolher.
Eça & Outras, IIIª. Série, n.º 18
Não existem em Portugal muitas publicações periódicas sobre outros países e civilizações ou sobre as relações entre a cultura portuguesa e a de outros povos.
Numa rápida abordagem informática encontramos apenas os seguintes títulos: Estudos Italianos em Portugal, publicado pelo Instituto de Cultura Italiana, desde 1939; Estudos Orientais, publicado pelo Instituto Oriental de Lisboa, desde 1990; Estudos Germânicos, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, desde 1998; Revista de Estudos Anglo-americanos e Germanísticos da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, desde 2001, a que poderíamos juntar a revista Africana do Centro de Estudos Africanos e Orientais da Universidade Portucalense Infante D. Henrique, que se publicou ao longo da década de 90 do século passado e que recentemente reapareceu. E pouco ou nada mais.
Sobre a China, supomos ser única a Revista de Estudos Chineses do Instituto Português de Sinologia, que apresentará em breve os n.ºs 4 e 5 em Lisboa e no Porto, durante os trabalhos do 5º Fórum Internacional de Sinologia, mantendo, ou mesmo aumentando, a variedade temática e a qualidade dos artigos que publica.
Sendo uma publicação abrangente sobre um tema universal – os estudos sobre a China e a sua relação com o mundo, ou do mundo com a China – tem vindo a arrumar a colaboração publicada em várias secções. Recordemos que no n.º 1 se podem encontrar artigos Falando sobre Minorias, sobre A nova Economia Chinesa, ou Medicina chinesa um repto às práticas ocidentais; no seu n.º 2 praticamente todos os estudos têm Macau como objecto de análise e no 3.º numero, encontramos análises no âmbito das Ciências Sociais, do Pensamento Jurídico e exercício da Justiça na China, alguns outros Falando de História e, de novo, Macau: memória.
Confrontando os programas dos Fóruns Internacionais de Sinologia já realizados, também pelo Instituto Português de Sinologia (IPS), não é difícil estabelecer uma relação directa entre os temas propostos, e os estudos aí apresentados, com os artigos publicados nesta revista, se bem que os números editados não sejam exactamente as suas Actas. Corroborando a sua internacionalidade (e não o internacionalismo) dos seus colaboradores, alguns deles são presença confirmada, não apenas nas suas páginas, mas também nas diversas publicações nacionais e internacionais que divulgam estudos sobre Sinologia e sobre as relações entre Portugal e os portugueses e a China. Sendo a revista propriedade do IPS, não se estranhará a constância dos temas sobre Macau, sendo pois fácil inferir que nos números futuros este antigo território, que esteve sob administração portuguesa, voltará às suas páginas. Não só sobre o seu passado muito há ainda a investigar e muitas são as novidades a aprender, como quanto aos seus anos mais recentes, a calma marcha do tempo ainda não passou o suficiente para que a serena análise histórica possa ser feita, privilégio que bem podem ir tentando sobre as últimas décadas os geógrafos, os economistas, os sociólogos, os politólogos, tanto quanto estas disciplinas se permitem ter fronteiras entre os seus saberes. Gostamos de os catalogar, mania que nos ficou do enciclopedismo; organizamo-nos em corporações, talvez para melhor nos entendermos e dividirmos as tarefas. Mas entretanto o fluir da vida passada, presente e futura continuará, quase indiferente às nossas escolas, teorias, doutrinas e praxis.
Todo este divagar para dizer que o número 3 da Revista de Estudos Chineses, afinal sobre essa enorme realidade mundial que é a China, é variado de temas, mas sobretudo de perspectivas de abordagem, no tempo e no modo, até porque diversos são os profissionais das áreas de conteúdo dos seus artigos.
Abrindo com um estudo de Óscar Barata, professor catedrático jubilado do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) da Universidade Técnica de Lisboa, intitulado «A Pressão sobre a China no século XIX», recua um pouco mais no tempo e nas referências às relações entre as potências marítimas ocidentais e o Celeste Império, e como elas foram variando ao longo do tempo, acentuando os aspectos comerciais das diversas companhias e as acções militares e diplomáticas dos países em presença, particularmente dos ingleses e dos portugueses e, naturalmente, dos chineses. Neste desiderato é analisada a tentativa dos ingleses para ocuparem Macau, o negócio e as guerras do ópio e a sua fixação em Hong Kong. Um trabalho imprescindível para se compreender a história destes dois territórios até aos nossos dias.
O segundo artigo, da autoria de Wang Tongsan, director do Institut of Quantitative and Technical Economics, Chinese Academy of Social Scienses, intitulado «The Deep-rooted Problems in China’s Macro-economic Operation and Policy Guidance of Macro-economy Control in 2008», traz-nos até ao presente os sucessos da economia chinesa, contrapontados com os problemas a curto e a longo prazo, no primeiro caso a pressão da inflação e as exigências dos mercados internacionais e, no segundo, as relações entre o desenvolvimento económico e social, a inevitável reestruturação dos sectores primário, secundário e terciário, o consumo energético e a poluição ambiental, naquela que virá a ser a maior potência mundial face ao colapso dos Estados Unidos da América, ao reordenamento da Rússia e à emergência da Índia e do Brasil.
Segue-se um artigo de Anne Cheng, professora de l’Institut Nacional dês Langues et Civilisations Orientales, intitulado «Confucian views and laws vs rites in Ancient China» onde analisa aspectos da devoção filial na dinastia Han e a tensão entre os ritos e as leis, os dois maiores reguladores da ordem sociopolítica na história da China. He Weifang, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Pequim, escreveu sobre a «China’s Judicial Reform» provocada pelas mudanças estruturais na actual sociedade chinesa, sobretudo depois de 1950, o que gerou antagonismos entre o direito escrito e a sua prática numa sociedade multiétnica, que as autoridades têm procurado aplanar através de oito directivas, a última das quais tem a ver com as relações entre a justiça e a comunicação social.
Problemas, dir-se-á, comuns a todas as sociedades desenvolvidas. Na China, talvez a ancora da tradição – de propósito não disse «o peso» - tenha um particular relevo que este autor não deixa de equacionar, como também o faz José Duarte de Jesus, ex-embaixador, docente no ISCSP e membro fundador do IPS, no artigo seguinte «A Justiça e o Estado na China Imperial e na Primeira República», no qual começa por nos advertir para os perigos da tentação de se estabelecerem paralelos entre conceitos jurídicos – ou outros – da tradição greco-cristã e os da civilização chinesa, nomeadamente os de Lei e Justiça ao longo das épocas, dinastias e períodos. Analisa depois as figuras do advogado e do litigador, até à Primeira República, concluindo, entre outros aspectos não menos interessantes, que, na antiga sociedade chinesa, havia «um humanismo profundamente civil» e que «os pressupostos confucianos antigos apontam bem mais para uma “open society” que os pressupostos platónicos».
Segue-se o artigo do autor desta recensão, sobre «Os estudos sobre as relações entre a região do Porto e a China: ponto da situação», que naturalmente não vou comentar, mas apenas o facto agradável e promissor de já me encontrar acompanhado por dois Amigos e Colegas: nesta revista, Manuel de Sampaio Pimentel A. Graça, professor na Escola Superior Artística do Porto (ESAP), apresenta-nos a sua investigação sobre «Chinoiserie e outros orientalismos no Porto» nos séculos XVIII e XIX, documentando nesta cidade o gosto por aqueles exotismos entre as classes possidentes, que os materializaram na decoração de edifícios, no mobiliário, nos tecidos decorativos, nas louças e em outros objectos de aparato.
Um outro Amigo, que consegui que se interessasse pelo Oporto China Fund criado pelos Cassels no final do século XIX naquela cidade para ajudar as missões do seu irmão William, bispo anglicano no interior da China, foi Fernando Peixoto, igualmente professor na ESAP, que o apresentou no II Fórum em Vila Nova de Gaia em 2007, mas que entretanto faleceu prematuramente no mês de Outubro de 2008, quando tanto ainda tinha para nos dar.
Mas a história dos tempos recentes na China está também analisada nesta revista no artigo «Le mouvement d’envoi des jeunes instruits à la campagne et les autres migrations organisées à l’époque maoiste» por Michel Bonnin, directeur d’études à l’École des Hautes Études em Scienses Sociales, que nos interpreta o que foi a migração de mais de dezoito milhões de jovens citadinos enviados para o campo entre 1968 e 1980, jovens esses que hoje têm 50-60 anos, muitos dos quais no topo da actual sociedade chinesa.
Seguem-se uma série de quatro artigos sobre Macau: «Evolução das árvores de arruamento na cidade de Macau» por António Júlio Emerenciano Estácio, engenheiro técnico agrário, e Fernando A. F. Macedo, arquitecto paisagista; «O cancelamento do IV centenário de Macau em 1955: as reclamações verbais das autoridades chinesas» por Moisés Silva Fernandes; «Bartolomeu Vaz Landeiro: the King of the Portuguese from Macao» por Lúcio de Sousa; e «Macau-Europa: a influência chinesa através dos seus produtos preciosos» por Rui d’Ávila Lourido, quatro importantes contributos para a permanente surpresa histórica daquele território, postos por ordem inversa do seu tempo cronológico e simbólico: os antigos jardins e espaços arborizados de Macau têm vindo a ser mutilados mas, entretanto, novas árvores têm vindo a ser plantadas nos terraplenos conquistados ao mar; em 1955 a China mostrou o seu desagrado pelas programadas comemorações dos quatrocentos anos da permanência dos portugueses no território, mas cuja administração, no entanto, aí permaneceria por cerca de mais meio século; Bartolomeu Landeiro é um daqueles portugueses que se foram ao mundo, capitão, mercador, protector de jesuítas e aventureiro, a quem os japoneses chamavam «o rei dos portugueses», personagem tão fascinante quanto esquecido e que agora aqui fica ao assombro dos leitores desta revista; finalmente o último artigo desta série propõe com bom fundamento o recuo da chinoiserie europeia para o século XVI, dando a Macau uma particular importância na divulgação dos produtos chineses na Europa.
Esta apresentação já vai longa e a ela se pode aplicar o provérbio chinês «Longos fios de seda trazem vantagem numa dança»; esta revista tem peças com certeza de diferentes espessuras e matizes, mas forma um notável conjunto que, mais uma vez, ficará na bibliografia necessária sobre a Sinologia em Portugal e no mundo.
J. A. Gonçalves Guimarães
Membro do IPS
Cartas Públicas de Eça
Uma equipa dirigida por Carlos Reis, professor catedrático da Universidade de Coimbra e actual reitor da Universidade Aberta, está a publicar a edição crítica das obras de Eça de Queirós, fixando o texto a partir dos manuscritos existentes, das edições revistas pelo escritor, das edições publicadas em sua vida, ou, no caso das obras póstumas, anotando a intervenção de outros na publicação do texto, confrontando todas as variantes, versões e edições no sentido de restituir a Eça o que é de Eça. Do Plano de Edição, na secção de obras de Ficção nos textos Não-Póstumos, estão já publicados O Crime do Padre Amaro (2.ª e 3.ª versões) O Mandarim e Contos I; dos Semi-Póstumos e Póstumos estão publicados A Ilustre Casa de Ramires, Contos II, A Capital! e Alves & C.ª; dos Textos de Imprensa, as colectâneas com este mesmo título, I, IV, V e VI; da Epistolografia, as Cartas Públicas, a que a seguir nos referiremos e nas Traduções As Minas de Salomão, faltando publicar, para além de outras obras em cada uma das secções do Plano de Edição, as enquadráveis nas Narrativas de Viagens e Vária.
Recentemente a Imprensa Nacional/Casa da Moeda pôs à disposição do público ledor, mormente os eçófilos e os eçólogos e, de um modo geral, todos os queirosianos, as Cartas Públicas, aqueles escritos a que o escritor «atribuiu forma epistolar» e «maioritariamente destinadas à imprensa», todos com «… o peculiar timbre que lhes foi incutido por um escritor que, além do mais, foi um cidadão do mundo, profundamente interessado na vida pública, nos costumes e nas ideias que atravessaram o seu tempo», conforme salienta Carlos Reis na Nota prefacial.
A presente edição foi estudada e preparada por Ana Teresa Peixinho, que em 2008 se doutorou na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra com uma dissertação sobre A Epistolaridade nos textos de Imprensa de Eça de Queirós, sendo agora professora auxiliar do Instituto de Estudos Jornalísticos daquela Faculdade e investigadora do CEIS 20, tendo já publicado em 2004, em co-autoria com Carlos Reis, os Textos de Imprensa I (da Gazeta de Portugal), e em 2002 a sua tese de mestrado intitulada A Génese da Personagem Queirosiana em Prosas Bárbaras, pela Editora Minerva.
João Nicolau de Almeida
Chevalier de l’Ordre du Mérite Agricole
Hoje, dia 25 de Fevereiro, pelas 18 horas, o Cônsul Geral de França no Porto, Senhor Philippe Barbry irá condecorar na Casa Ramos Pinto em Vila Nova de Gaia com o grau de Cavaleiro da Ordem do Mérito Agrícola, o enólogo João Rosas Nicolau de Almeida, administrador daquela empresa do grupo Roederer.
O agraciado nasceu no Porto em 1949, filho de Fernando Moreira Paes Nicolau de Almeida, o criador do Barca Velha, e de D. Maria José Ramos-Pinto Rosas Nicolau de Almeida. Frequentou as Universidades de Dijon e Bordéus, onde se diplomou em Enologia, Química Agrícola e Prova de Vinhos. Tem leccionado nas Universidades de Bordéus, UTAD e Universidade de Davis (Califórnia). É membro da Confraria do Vinho do Porto, onde tem desempenhado cargos directivos, da American Society of Enologists (EUA), da Associação dos Produtores e Engarrafadores do Vinho do Porto e da Associação para o Desenvolvimento da Viticultura Duriense (ADVID). É também sócio dos ASCR-Confraria Queirosiana e do Oporto Golf Club.
Criador do célebre Duas Quintas e de outros vinhos de eleição, é autor de diversos estudos sobre a mecanização da vinha no Douro e sobre as suas castas.
Passeio a Oeiras do Piauí
Em sexta edição acaba de ser publicado Passeio a Oeiras, «Roteiro histórico e sentimental da antiga capital do Piauí» por Dagoberto Carvalho Jr., o notável plumitivo presidente da Sociedade Eça de Queiroz do Recife, médico e historiador encartado que à estampa tem dado outros títulos sobre a história documental, artística, institucional e literária da sua região natal, mas também sobre essa lusitanidade maior que é o espírito universalista queirosiano.
Esta obra, aparecida em 1982, sucessivamente esgotada e em cinco edições rejuvenescida, é um daquele livros de um intenso afecto pelo torrão natal que o autor, percorrendo de braço dado com o leitor os locais que sendo dele, por direito próprio, partilha como que em busca da possível eternidade presente nas calçadas, nos largos, nas casas e na memória das pessoas que os habitaram e a quem chama «velhos fantasmas amigos», simpáticos e carregando as suas idiossincrasias, já não como um embaraço ou pesadelo quotidiano, mas como quem apresenta a corcunda do destino sob casaca de veludo bordada a lantejoulas no desfile do carnaval feliz que são as nossas memórias descritas com arte. Sempre são muito infelizes aqueles que do seu passado carregam amargor, mas tal não é o caso de Dagoberto Carvalho Jr, pois este livro sobre a sua Oeiras natal é tanto um livro de História como de memórias pessoais de uma intensa generosidade sensata para com os que já foram e lhe deixaram um palco onde hoje a vida escorre quotidiana cheia de recordações, que é aquilo que um actual bairro periférico ou uma Brasília demorarão a ter. Não sendo cotada na bolsa, para nosso gáudio e satisfação a Memória conta muito para o equilíbrio intelectual de qualquer cidadão.
Acrescente-se que este livro, graficamente bem urdido, apresenta deliciosas vinhetas de Mário Paciência, mapa de Josevita Pontes e notáveis reconstituições de Zuleica Tapety, numa verdadeira e encantatória arqueologia da paisagem e da arquitectura. Não se trata da presença embonecadora de artistas, mas de um espírito de comunhão entre o autor e os ilustradores que muito enriquece esta obra onde se mostra de uma forma tão elegante como o local pode ser universal, «agora, na lembrança dos que vierem comigo a Oeiras», assim termina o autor, certo de que este passeio, presencial ou literário, ficará na memória dos seus leitores.
Tomar Café com:
Ariel Ramirez, para de novo cantarmos a sua Missa Creoula, em memória da sua apresentação no Teatro Carlos Alberto do Porto já lá vão uns anos; Mikael Anderson, o piloto calmo que aterrou seguro o avião no meio de uma tempestade humana; Orlando Zapata e sua mãe Reina Tamayo, para que um dia Cuba seja a ilha da felicidade.
Não quero ir tomar café com:
Mário Machado, o skin que destila ódio. E tantos outros que nem soube por onde escolher.
Eça & Outras, IIIª. Série, n.º 18
– Quinta-feira, 25 de Fevereiro de 2010
Cte. n.º 506285685 ;
Cte. n.º 506285685 ;
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J. A. Gonçalves Guimarães (TE-638);
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redacção: Fátima Teixeira;
inserção: Amélia Cabral.
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