sábado, 25 de julho de 2020

Eça & Outras, sábado, 25 de julho de 2020

Espírito de seita

       Ouvimos recentemente ler e comentar a acusação do Ministério Público contra os banqueiros e respetivos familiares e amigos íntimos implicados no caso BES. E o país não ficou surpreso nem se indignou: «à justiça o que é da justiça» disseram alguns salomonicamente, esquecendo que esse tal Salomão não tem nada a ver com a nossa realidade atual, nem vai valer ao rombo patrimonial que aqueles pronunciados provocaram na economia geral do país, para além dos estragos na daqueles que neles confiaram. Aqueles políticos que alto e bom som proclamaram nas vésperas do desastre, ou já com ele a decorrer, que o grupo era sério, sólido e confiável, deveriam ser, pelo menos, pronunciados por publicidade enganosa, pois tinham acesso a elementos que os outros cidadãos não tinham: informação privilegiada e contato pessoal, íntimo, quando não familiar, com os arguidos. Participaram assim também indiretamente na burla monumental, pelo menos moralmente. E para lições de moral aos seus concidadãos, alguns deles sempre se mostraram muito expeditos. Mas não para consumo próprio. Uns verdadeiros Frei Tomás, até porque coincide que muitos deles (os implicados e os amigalhaços) se apresentam habitualmente como pessoas muito religiosas. Mas o país não se indignou, como não o fez com casos anteriores, porque em Portugal há a estúpida tradição da novela açucarada, do “bandido” charmoso e filho de “gente de bem” ou “vindo do nada”, que “o que teve foi azar”: os Alves dos Reis, as Dona Branca, são apenas alguns exemplos caricaturais, que outros houve antes destes, quer no tempo da 1.ª República, quer ainda na Monarquia. Então o que é que explicará a eternização da tendência nacional para a corrupção desenfreada, da pequena habilidade paroquial à grande fraude fiscal ou bancária? A resposta só pode ser o que poderemos chamar de “espírito de seita”, endócrino na sociedade portuguesa. A sociedade organiza-se em grupos segundo a Lei, desde a família, passando pelas religiões, pelos departamentos do Estado (economia e finanças, militares, polícias, justiça, educação, cultura, saúde e ambiente…) e pelas associações civis (partidos políticos, ordens profissionais, associações empresariais, sindicatos, clubes desportivos e outros, associações cívicas…) e pelas corporações empresariais (associações de banqueiros ou de empresários, de produtores de bens e de serviços e da sua comercialização, de proprietários…). Todas estas organizações visam, cada uma à sua maneira e na parte que lhe cabe, o bem público, com atividades previstas e regulamentadas na Lei e com a possibilidade de um controle efetivo sobre elas por parte dos diretamente interessados e, de um modo geral, de toda a sociedade através de mecanismos administrativos claros. Mas se assim é, o que é que falha na sociedade portuguesa ou, pelo contrário, como é que que alguns indivíduos e grupos alcançam tanto sucesso momentâneo e tão reiteradamente obtêm proventos indevidos através de muitas destas instituições? A razão só pode estar no “espírito de seita” que está para além e que é transversal a muitas delas. Ao contrário da clareza, publicidade e autocontrole das instituições, as seitas têm objetivos particulares e obscuros que nada têm a ver com o bem comum mas apenas com o particular ou o de pequenos grupos que se protegem e promovem entre si na clandestinidade, ou publicamente através de encenações que, quantas vezes, escondem atividades oportunistas ou mesmo caídas na esfera da justiça, realizadas à margem da cidadania e do escrutínio público. Outras vezes estão ao serviço de organizações internacionais que se acham acima dos interesses dos estados. As seitas, obviamente sem nome nem estatutos, servem-se das religiões, dos partidos políticos, controlam as agremiações profissionais e influenciam em proveito próprio as instituições democráticas, das quais aliás desdenham, colocando estrategicamente em lugar de destaque os seus subservientes e os seus “peões de brega”. A “cunha”, o “empenho”, a chantagem, quando não a ameaça, fazem depois o resto. É essa a prática das seitas que têm levado o nosso país, de escândalo em escândalo, a caminho da ignomínia total: «esta decadência tornou-se um hábito, quase um bem-estar, para muitos uma indústria. Parlamentos, ministérios, eclesiásticos, políticos, exploradores, estão de pedra e cal na corrupção… Contra este mundo é necessário ressuscitar as gargalhadas históricas… E mais uma vez se põe a galhofa ao serviço da justiça!» (Eça de Queirós, Uma Campanha Alegre).

J. A. Gonçalves Guimarães

Mesário-mor da Confraria Queirosiana

 

Autores, Livros e Revistas


   Editado em 2019 pela Imprensa da Universidade de Coimbra, encontra-se disponível, também em acesso digital, o livro Eça Naturalista: O Crime do Padre Amaro e O Primo Basílio na imprensa coeva, da autoria do Prof. Doutor António Apolinário Lourenço, do departamento de Línguas, Literaturas e Culturas daquela universidade. Uma exaustiva abordagem do impacto jornalístico daquelas obras excecionais no Portugal tacanho e beato da segunda metade do século XIX.

 

No passado dia 3 de junho, no salão nobre do Quartel de Santo Ovídio na Praça da República no Porto, e no âmbito das Comemorações do Bicentenário da Revolução de 1820, foi lançado o livro de bolso Porto Liberal. Guia de Arquiteturas, Sítios e Memórias, coordenado pelo historiador Professor Doutor Francisco Ribeiro da Silva, o qual apresenta quatro roteiros ligados à implantação do Liberalismo naquela cidade, tendo como referências, entre outros, a Igreja e cemitério da Lapa, o Museu e a igreja da Misericórdia, o Museu Soares dos Reis e, no município de Vila Nova de Gaia, o Mosteiro da Serra do Pilar, para onde, já em 1840 se preconizava que o mesmo passasse a denominar-se «…o Baluarte da lealdade, valor e patriotismo… aonde será levantado um monumento eterno em memoria do Grande Homem: ali irão os corações generosos, pagar o grato tributo de admiração e saudade pelo seu Libertador, e as gerações futuras aprenderão desse tumulo a detestar os tiranos e a amar a Liberdade» (O Cerco do Porto de 1832 para 1833. Por um Portuense [1. ª edição, 1840]. Porto: Universidade do Porto editorial, 2010, p. 178). 

 

Se este ano for veranear para as praias da região entre Leiria e Peniche, tem à sua disposição o interessantíssimo guia Da foz do Lis a Peniche, parte da obra monumental Os Portos Marítimos de Portugal e Ilhas Adjacentes, composta por 11 volumes editados entre 1904 e 1910, da autoria de Adolfo Loureiro (1836-1911), que foi militar, engenheiro, escritor, poeta e político. A presente edição foi coordenada por Ricardo Charters d’ Azevedo, guia, profundo conhecedor da região e das suas gentes, sobre as quais já publicou copiosa bibliografia e desta feita é o autor da introdução, transcrição e notas que lhe dão conta das similitudes que perduram e das diferenças que aqui ocorreram na geomorfologia e na paisagem em pouco mais de um século.

 

        Referente a maio de 2020 encontra-se disponível para consulta o n.º 2004 da revista Colóquio/Letras editada pela Fundação Calouste Gulbenkian, dedicada à “Geração de 70” e organizada pelo Professor Doutor Carlos Reis. Entre os muitos artigos sobre o tema, encontra-se na secção Documentos o trabalho intitulado «O projecto da “Revista Ocidente”: Três cartas inéditas de Oliveira Martins a Batalha Reis», da autoria de Guilherme de Oliveira Martins.


Aguçar o Paladar

     O boletim Aguçar o Paladar, da Real Confraria da Cabra Velha, coordenado por Artur Fernandes, no seu número 15 de 18 de julho passado republicou, com a devida autorização do autor, o texto «Nos 90 anos de J. Rentes de Carvalho» publicado nesta página a 25 de maio e no jornal As Artes Entre As Letras de 24 de junho passados.

 

Mário Cláudio no Solar Condes de Resende, 2007.

         Pela terceira vez o escritor Mário Cláudio venceu o Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores 2019, com o romance Tríptico de Salvação editado pela Editorial D. Quixote e coincidente com os seus 50 anos de vida literária. Já tinha vencido o mesmo prémio em 1984 com Amadeo e em 2014 com Retrato de Rapaz. À presente edição deste prémio, que tem também o patrocínio da Direção Geral do Livro, Arquivos e Bibliotecas (DGLAB), e os apoios da Câmara Municipal de Grândola, da Fundação Calouste Gulbenkian e do Instituto Camões, concorreram sessenta obras.

         Mário Cláudio é Confrade de Honra queirosiano desde 24 de novembro de 2007, em homenagem à sua autoria do romance As Batalhas do Caia, criado a partir do conto inacabado de Eça de Queirós «A Catástrofe» e dos acontecimentos biográficos dos últimos anos de vida do escritor.

 

Confederação Portuguesa das Coletividades

A Confederação Portuguesa das Coletividades de Cultura, Recreio e Desporto, que há mais de 40 anos representa o Movimento Associativo Popular e de que a ASCR-CQ faz parte através da sua filiação na Federação das Coletividades de Vila Nova de Gaia, no passado dia 16 de julho foi agraciada pelo Presidente da República, Professor Doutor Marcelo Rebelo de Sousa, como Membro Honorário da Ordem do Infante D. Henrique, numa cerimónia que decorreu na Sala dos Embaixadores do Palácio de Belém. A delegação da CPCCRD presente ao ato era chefiada pelo seu presidente da mesa do congresso, Dr. Francisco Barbosa da Costa, que recebeu do chefe de Estado a placa honorífica desta distinção.


ASCR - Confraria Queirosiana

         No passado dia 30 de junho pelas 18 horas decorreu no Solar Condes de Resende a assembleia geral eleitoral dos sócios da associação Amigos do Solar Condes de Resende – Confraria Queirosiana para eleição dos corpos gerentes para o mandato de 2020 a 2024, a que concorreu uma lista proposta pela anterior direção, e que reúne aqueles sócios que manifestaram a vontade de trabalharem em prol da associação. Pelas 21 horas no mesmo dia e local decorreu a assembleia geral ordinária para a apresentação do Relatório e Contas referente ao ano de 2019. Os novos corpos gerentes passaram a ter a seguinte composição: assembleia geral: presidente da mesa, César Fernando Couto Oliveira; secretários: Henrique Manuel Moreira Guedes e Nuno Miguel de Resende Jorge e Mendes; secretários suplentes: Marcus Vinícius Cocentino Fernandes e Paulo Jorge Cardoso Sousa Costa; direção: presidente, José Manuel Alves Tedim; vice-presidente: Luís Manuel de Araújo; secretário: Joaquim António Gonçalves Guimarães; tesoureira: Amélia Maria Gomes Sousa Cabral; vogais: Manuel Maria Moreira, Susana Maria Simões Moncóvio, António Pinto Bernardo; vogais suplentes: Carlos Alberto Dias de Sousa, Manuel Guimarães da Fonseca Nogueira; conselho fiscal: presidente, Manuel Filipe Tavares Dias de Sousa; secretário, Fernando Rui Morais Soares; relator, António Manuel Santos Pinto da Silva; relator suplente, Licínio Manuel Moreira Santos.

Na primeira reunião realizada a 9 de julho a direção nomeou os responsáveis pelas comissões de trabalho permanentes: Confraria Queirosiana; Academia Eça de Queirós; Gabinete de História, Arqueologia e Património; Logística; Itinerários Queirosianos; Arte e Editorial.

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Eça & Outras, III.ª série, n.º 143, sábado, 25 de julho de 2020; propriedade dos Amigos do Solar Condes de Resende - Confraria Queirosiana; C.te n.º 506285685; NIB: 0018000055365059001540; IBAN: PT50001800005536505900154; email: queirosiana@gmail.com; www.queirosiana.pt; confrariaqueirosiana.blospot.com; eca-e-outras. blogspot.com; vinhosdeeca.blogspot.com; coordenação da página: J. A. Gonçalves Guimarães (TE-164 A); redação: Fátima Teixeira; inserção: Licínio Santos.

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