Terça-feira, 25 de Dezembro de 2012
Vínculos Quebrantáveis
Passada a euforia esperançada do golpe militar de 25 de Abril de 1974, talvez consciente dos seus previsíveis falhanços, a sociedade portuguesa com alguma cultura foi à História buscar alguns porquês e procurar um fio condutor para o devir do qual, felizmente, não desiste.
Creio ser este fenómeno, obviamente merecedor de maior explanação, que, desde os anos oitenta do século passado, justifica o afã editorial de várias e múltiplas histórias de Portugal produzidas, na maior parte dos seus capítulos, por historiadores profissionais. Mas nestes trinta anos assistiu-se também à chegada de jovens historiadores à História Local e Regional até aí, e salvo raras excepções, quase domínio exclusivo dos memorialistas locais e de profissionais de outras artes, os quais, desprezando o saber das profissões que lhes deram status e largueza de bolsa, descobrem-se na senectude vocacionados para as estórias, tirando as mais das vezes o ganha-pão àqueles novos operários da memória, pois a classe dominante que os acalenta, protege e paga não distingue a História das fantasias literárias e, assim como assim, prefere estas por mais inofensivas, pois que a memória escrita, se quando colectiva é glória, quando se aproxima do diário pessoal é para eles preocupação séria que só as mitologias dos grupos e instituições mitigam, abafam ou escondem.
No caso do presente livro do Doutor Nuno Resende resultante da sua tese de mestrado, agora editado pela Palimage com a colaboração da Confraria Queirosiana, estamos perante uma obra cujo rigor científico não desmerece da bondade evocativa que a História deverá ter, aquele sorriso generosamente humano que o historiador oferece àqueles que nos precederam na estrada larga da vida. Aqui documentalmente se conta como um clérigo do século XVI, morador no Porto, se preocupou com o futuro de seu filho deixando-lhe um morgadio em Cinfães, o qual deveria ter serenamente passado de geração em geração, através de filhos legítimos, segundo a lei e a moral social vigente. Mas o homem põe e a vida dispõe e, mais uma vez, temos aqui um exemplo de que as estratégias matrimoniais, que os românticos europeus tanto ridicularizaram noutras civilizações, nem sempre funcionaram, e que a família nem sempre foi o bom espelho da ordem social, sendo antes, bem pelo contrário, um palco de conflitos, uma feira de ganâncias, uma mina permanente para a raposisse de causídicos.
Tendo esta obra resultado da generosidade esclarecida que permitiu a salvaguarda de um arquivo de família tratado por um jovem historiador já com obra sólida, este livro mostra como a história, por mais particular e localizada que seja, pode ser um capital para os viventes, escola de tolerância e compreensão para com as humanas misérias dos que já partiram, para que a sociedade, se não já a de agora pelo menos a de amanhã, venha a tornar-se a utopia dos paraísos que a humanidade tem ardentemente desejado.
A obra Vínculos Quebrantáveis tem, além do mais, um felicíssimo título: a sua irreconciliável contradição é afinal a história de Jorge Vaz Campelo e a dos seus descendentes e herdeiros nestes últimos quatro séculos e meio: por ela perpassam todos os defeitos e virtudes que se exibiram numa terra e numa paisagem concretas, mas ao mesmo tempo tão cheios de universalidades que oscilam entre os dogmas das instituições e as quotidianas velhacarias dos que pensam viver à custa da fazenda alheia, neste caso dos parentes, dos chegados, dos do mesmo sangue e do mesmo afecto matricial. Leiam-no e vejam do que é que a sociedade portuguesa tem sido feita e onde o povo tem ido buscar os exemplos desde quinhentos até aos dias de hoje, com tanto vínculo desatado e com quebrantos que nos têm tolhido. Lendo os de outros tempos e pessoas talvez possamos esconjurar os nossos, os de agora. Útil tarefa a do historiador.
J. A. Gonçalves Guimarães
Congresso, colóquios e jornadas
Para além da já divulgada Jornada Queirosiana de Sintra (16 de Fevereiro) e do Fórum Internacional de Sinologia em Leiria (21 a 23 de Fevereiro), vai decorrer na Golegã e Chamusca entre 15 e 19 de Maio o “I Congresso Internacional O Cavalo e o Touro na Pré-História e na História” e, entre 27 e 29 de Junho no Parque Biológico de Gaia, “Suevos e Visigodos no Noroeste Peninsular – Colóquio Arqueológico do Castelo de Crestuma”, este último em colaboração com o Gabinete de História, Arqueologia e Património dos ASCR-CQ. Em todos eles estarão presentes sócios e confrades queirosianos.
Cursos e palestras
Prossegue no Solar Condes de Resende o curso livre “Esplendor da Arqueologia: Ciência Cultura e Turismo”, com aulas de Joel Cleto (5 de Janeiro), Armando Coelho Ferreira da Silva (19 de Janeiro) e Manuel Real (2 de Fevereiro) e seguintes.
Continua igualmente o curso de Pintura pela Professora Paula Alves e a iniciação ao bridge pelo Juiz Desembargador Calheiros Lobo.
Às 5.as feiras, tertúlias queirosianas às 21 horas com diversos temas e palestrantes.
Livros e revistas
No próximo dia 28 de Dezembro, pelas 17 horas, será lançado na Casa da Cultura de Cinfães o livro “Vínculos quebrantáveis. O Morgadio de Boassas e suas relações, séculos XVI-XVIII”, da autoria de Nuno Resende, Doutor em História da Arte e nosso confrade, editado pela Palimage, o qual estará à venda na loja on-line da Confraria a partir de Janeiro próximo.
No passado dia 14 de Dezembro no edifício dos Congregados em Braga foi lançada a obra colectiva “Escolas de Formação de Professores em Portugal” que teve como colaborador o nosso sócio Prof. Doutor José António Martin Moreno Afonso, professor na Universidade do Minho, publicado por Edições Colibri, com o apoio da Universidade de Lisboa e da Fundação Ciência e Tecnologia.
Em Outubro passado foi publicado o n.º 5 da 2.ª série da revista “Telheiras - cadernos culturais” publicada pelo Centro Cultural Eça de Queiroz/Escola Secundária Eça de Queirós/Centro Cultural de Telheiras e dirigida pelo nosso confrade Fernando Andrade Lemos, desta vez com o busto de Eça de Queirós da autoria de Rafael Bordalo Pinheiro na capa. Colaboraram neste número, entre muitos outros articulistas, o nosso confrade director, com vários artigos, um deles intitulado «Eça de Queiroz e o Fado», e António Eça de Queirós com «Eça visto por outros».
O Jornal As Artes entre as Letras, publicado no Porto sob a direcção da nossa confreira Nassalete Miranda, dedicou o seu número 86 de 14 de Novembro à edição de “Mazagran” de J. Rentes de Carvalho, com o busto do escritor de Helder de Carvalho na capa e dentro o texto de apresentação do livro de J. A. Gonçalves Guimarães, e o número 88 de 12 de Dezembro, que apresenta no interior a entrevista que o redator deste blogue lhe fez na ocasião e em que o celebrado escritor reafirma, mais uma vez, a importância de Eça de Queirós desde a sua formação até aos dias de hoje. Uma produtora de documentários irá rodar um filme sobre a sua vida e obra em Gaia, Viana, Paris, Amsterdam e Trás-os-Montes, devendo sair outra obra sua em Portugal no próximo mês de Maio.
Entretanto a Caminho reeditou agora a obra “Eça de Queiroz entre os seus apresentado por sua filha. Cartas Íntimas” publicado pela primeira vez em 1949 e com reedição em 1987. O seu interesse, depois da edição de “Eça de Queiroz Correspondência”, organizada por A. Campos Matos, deve-se apenas ao fato de aquelas duas edições serem já difíceis de encontrar no mercado.
Novo blogue queirosiano
O Professor Doutor Carlos Reis, nosso confrade e director do Departamento de Línguas, Literatura e Culturas da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, criou um novo blogue queirosiano, com o seguinte endereço electrónico: www.queirosiana.wordpress.com, ao qual os interessados poderão ser adicionados como seguidores e assim ficarem a par das mais recentes novidades sobre os textos de Eça.
Convívios de Natal
O Solar Condes de Resende e o seu bar gerido pela Confraria foram escolhidos para a realização de convívios de Natal, como foi o caso dos antigos Jovens do Torne, famoso grupo gaiense dos anos sessenta que hoje percorre a vida e o mundo; pessoal da Cerâmica do Douro e também os Corpos Gerentes e pessoal do Solar, entre outros.
E já que estamos no Natal, lembremo-nos que Eça escreveu o seguinte: «a presença angustiosa das misérias humanas, tanto velho sem lar, tanta criancinha sem pão, e a incapacidade ou indiferença de monarquias e repúblicas para realizar a única obra urgente do mundo – a “casa para todos, o pão para todos”, lentamente me tem tornado um vago anarquista entristecido, idealizador, humilde, inofensivo…» (A Rainha, in Revista Moderna, 1898).
A todos os seus sócios, confrades, leitores e homens e mulheres de boa vontade a direcção dos Amigos do Solar Condes de Resende – Confraria Queirosiana e do blogue Eça & Outras deseja um ano de 2013 mais fraterno, esperançoso e realizador.
Eça & Outras, IIIª. Série, n.º 52 – Terça-feira, 25 de Dezembro de 2012
Cte. n.º 506285685 ; NIB: 001800005536505900154
IBAN:PT50001800005536505900154;Email:queirosiana@gmail.com;
www.queirosiana.pt; confrariaqueirosiana.blospot.com; eca-e-outras.blogspot.com; coordenação da página: J. A. Gonçalves Guimarães (TE-638); redacção: Fátima Teixeira; inserção: Amélia Cabral.
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