O Património Político como mais-valia do
presente: a propósito dos 200 Anos da Revolução de 1820
Venho hoje falar do Património Político
da cidade do Porto, como um património imaterial para os tempos que vivemos. No
próximo ano acredito que vão aqui comemorar-se os 220 anos da Revolução de 24
de Agosto, ou Constitucional, ou Vintista. Após a Revolução Americana de 1776,
da Francesa de 1789, da Constituição de Cádis de 1812 e da Revolta Republicana
de Pernambuco de 1817, um grupo de personalidades portuguesas e portuenses,
conscientes da necessidade de colocar Portugal na linha da frente das
preocupações civilizacionais, criou no Porto o Sinédrio como clube de reflexão
e ação, tendo também aliciado alguns militares descontentes com a sua situação
profissional para aderirem ao movimento, tomando depois o poder na cidade e no
país. É certo que em nome do rei ausente no Brasil, mas sobretudo contra a
Inglaterra, a potência ocupante e dominante em ambos os lados do Atlântico desde
as Invasões Francesas. Esta Revolução, feita pelos armadores-negociantes da
praça do Porto, ou pelos seus filhos já bacharéis em Direito por Coimbra, com
um ou outro membro da sociedade mais viajado e letrado, conhecedor das mudanças
de um mundo em transformação, além dos referidos militares, cuja maioria
rapidamente vai mudar de campo, teve de concretizar-se em circunstâncias
habilmente consensuais no que, naqueles dias, era prioritário: trazer o rei do
Brasil, libertar o país da opressiva subordinação estrangeira, marcar eleições
para os cidadãos se expressarem através dos seus representantes e elaborar e
aprovar uma Constituição que acabasse com o poder absoluto e regulasse a vida
da sociedade portuguesa no respeito pela liberdade, pela segurança, pela
propriedade e pela igualdade. Não era pouco o que de si exigiam os
revolucionários vintistas. Como é sabido, depois da Revolução ter triunfado
também em Lisboa, logo em dezembro realizaram-se as primeiras eleições em
Portugal, a primeira vez que os cidadãos “foram às urnas”.
Para além dos princípios gerais atrás
enunciados a consignar na Constituição (Liberdade, Segurança, respeito pela
Propriedade, Igualdade de oportunidades para todos os cidadãos), que mais
queriam estes homens e mulheres (nessa época havia na região várias viúvas à
frente de empresas de comércio marítimo e das primeiras indústrias) ? Então,
tal como hoje, a vida fluía todos os dias e a maior parte destes
revolucionários eram homens práticos, entendidos em comércios, navegações e
criação de riqueza pelo trabalho, queriam coisas bem concretas e práticas, que
obviamente aproveitavam o momento em que novas ideias filosóficas e políticas
se implantavam na sociedade portuguesa. A 23 de setembro de 1822 foi aprovada a
1.ª Constituição Portuguesa que, entre muitos outros artigos, consignava no seu
artigo 9.º que «a lei é igual para todos». Sabemos também o que, entretanto,
veio a seguir com a contra-revolução miguelista: a Constituição foi banida, o
poder absoluto de novo, temporariamente instituído, e os adeptos do
constitucionalismo perseguidos e alguns dos quais barbaramente sacrificados,
como foi o caso dos «mártires da Liberdade», levando o país para uma guerra
civil entre 1832-1834, e as que se lhe seguiram, durante as quais a cidade do
Porto e todos os liberais sacrificaram vidas e bens para que o país se
acertasse com o concerto das nações «…em plena marcha pela estrada da glória,
arvorando o Estandarte da Liberdade e derrubando as góticas edificações do
Despotismo», como se escreveu no Português
Constitucional de 22 de setembro de 1820.
No vastíssimo Património Mundial que é
o Porto, nem todo ele é arqueológico, artístico, edificado ou institucional.
Existe também na cidade, ou na ideia que dela temos, o Património Humano e o
Imaterial, como é o caso deste outro que tem a ver com a liberdade organizada
dos seus cidadãos. Se bem que esteja já materializado em pequenos ou grandes
monumentos espalhados pela cidade e pelo país e também nesse filho maior da
revolução vintista portuense que é o Brasil independente, não podemos ignorar
este património filosófico e político, que é o do apego às instituições
democráticas geridas pelo voto popular. Depois do Património Humano é o mais
importante de todos os Patrimónios, pois não só ele respeita as pessoas, os
acontecimentos e os monumentos do passado como transforma os seus bens com
memória e qualidade em mais-valia do presente e certezas de futuro, muito para
além dos modismos épocais.
Preparemo-nos pois com a devida
antecedência para comemorarmos condignamente os 200 anos da Revolução de 1820,
talvez o momento mais marcante da História em que a cidade do Porto e a região,
representados por um punhado dos seus cidadãos mais esclarecidos, se acertaram
com a marcha do progresso da Humanidade.
Como escreveu Eça de Queirós no Districto de Évora em 1867, «as
revoluções não são factos que se aplaudam ou que se condenem… De cada vez que
vêm é sinal de que o homem vai alcançar mais uma liberdade, mais um direito,
mais uma felicidade.». Os historiadores não vão ao passado buscar
acontecimentos mais ou menos bizarros para propor aos seus leitores ou ouvintes
ócios eruditos. O seu trabalho é ir aos acontecimentos verdadeiros da História
retomar os fios da vida, mesmo aqueles que o tempo esfiapou ou que outros
acontecimentos mais recentes enovelaram, ou mesmo quebraram ou esqueceram. Para
que o Património, material ou imaterial que as gerações passadas nos legaram,
possa ainda hoje frutificar como exemplo e proveito para as gerações vindouras.
Mas como também não vivemos no futuro, mas sim nos dias que correm, comemorar os
200 anos da Revolução de 1820 será com certeza uma mais-valia do presente.
(extrato
da comunicação proferida na Biblioteca Almeida Garrett no Porto a 18 de Maio na
sessão comemorativa do 10.º aniversário do jornal As Artes Entre As Letras)
J.
A. Gonçalves Guimarães
mesário-mor da Confraria Queirosiana
CONFRADE QUEIROSIANO AGRACIADO
No passado dia 22 de maio, no Dia
do Município de Leiria, o Eng.º. Ricardo Charters de Azevedo foi agraciado com
a medalha de mérito municipal classe ouro por aquele município queirosiano,
pelo seu «empenho na defesa de Leiria e das suas causas, em especial na área da
Cultura». O galardoado, para além de promotor e principal sponsor do prémio Villa
Portela, destinado a premiar os trabalhos de «investigação no âmbito da
História Local e do Património do Distrito de Leiria» é ainda autor de
importante bibliografia nesse âmbito, de que destacamosDoutor D. Frei Patrício da Silva,
um cardeal leiriense, Patriarca de Lisboa. 2009;
Quem escreveu o Couseiro?,2010; e A
Estrada de Rio Maior a Leiria em 1791, 2011. O agora distinguido peço
município do Lis já é Grande-oficial da Ordem do Infante D. Henrique e Confrade
Mecenas da Confraria Queirosiana.
Eventos
passados
CAPELA DO SENHOR DA PEDRA
No dia 11 de Maio,
logo pela manhã, um grupo de amigos da Capela do Senhor da Pedra organizado por
Joaquim Lima Moreira Vaz, participou numa tertúlia e visita guiada à capela e
ao seu enquadramento feita pelo professor e patrimoniólogo Henrique Guedes,
autor de uma monografia sobre este monumento emblemático do litoral de Gaia
publicada em 2000 e já esgotada. Como a romaria tradicional se avizinha, foram
ali ouvidas as quadras da célebre Rusga ao Senhor da Pedra, recolhida nos anos
trinta pelo etnomusicólogo Armando Leça.
EXPOSIÇÃO DE PROFESSORES E EDUCADORES
Nesse mesmo dia,
mas pelas 15 horas, abriu na Biblioteca Pública Municipal de Vila Nova de Gaia
a XXVI Exposição de Pintura, Cerâmica e Porcelana da Associação da Casa dos
Professores e Educadores de Gaia, organizada sob a orientação do professor José
Manuel Ribeiro e que este ano contou com a colaboração de cerca de três dezenas
de participantes. A mostra esteve patente até hoje, dia 25 de maio.
DANTE NO PORTO
No dia 17 de
Maio, pelas 21,15, na Sala da Música do Museu Soares dos Reis, no Porto, no
evento “Divina Commedia, uma Viagem
pela Arte”, integrada no projeto Dante no Porto, promovido pela Associazione
Socio-Culturale Italiana del Portogallo Dante Allighieri, o Prof. Doutor José
Manuel Tedim apresentou «uma aula de história de arte e estética sobre as
influências que o imaginário dantesco teve nas artes, nomeadamente pintura e
escultura, desde a Idade Média até hoje».
DA PSIQUIATRIA À SAÚDE MENTAL
No
dia 18 de maio pelas 11,15, no Auditório do Parque Biológico de Gaia, o médico
psiquiatra e ensaísta Dr. Jaime Milheiro, autor, entre muitas outras obras, de O
Centro de Saúde Mental de V. N. de Gaia (1969-1992) – uma breve narrativa…na
primeira pessoa, publicado em 2013,apresentou uma conferência
intitulada Da Psiquiatria à Saúde Mental – 50 anos depois, integrada nas
9.as Jornadas de Psiquiatria e Saúde Mental do Centro Hospitalar de
Vila Nova de Gaia/ Espinho.
EÇA DE QUEIRÓS E A GERAÇÃO DE 70
Nas habituais
sessões de divulgação da vida obra e época de Eça de Queirós para vários
públicos e dos respetivos Roteiros Queirosianos, J. A. Gonçalves Guimarães no
dia 23 de Maio apresentou duas conferências sob o tema « Eça de Queirós e a
Geração de 70: itinerários de amizade, pensamento e ação», a primeira pelas 11
da manhã no Colégio do Rosário no Porto para cerca de 150 alunos do 11.º ano
que estudam Os Maias, tendo-a repetido, com outro enfoque e para outro tipo de
público pelas 18 horas no Arquivo Municipal Alberto Sampaio em Vila Nova de
Famalicão.
Livros
e Revistas
O Grupo Eça da Universidade
de São Paulo, Brasil, na sequência de outros título já apresentados desde 2015,
acaba de publicar o livro Novas Leituras Queirosianas. O Primo Basílio
e outras produções, coordenado por Giuliano LellisIto Santos, Luciene
Marie Pavanelo e Hélder Garmes e divulgado em Portugal pelo Professor Doutor
Carlos Reis, da Universidade de Coimbra e que dele faz parte. Aquele grupo «tem
por finalidade estudar a obra do escritor português Eça de Queirós, assim como
sua fortuna crítica. Privilegiando uma abordagem de fundamentação marxista, mas
aberto a outras abordagens, o grupo pretende reler a obra queirosiana, tomando
por pressuposto que o autor de Os Maias foi sempre um crítico
ferrenho da burguiesia e da aristocracia portuguesas, mesmo em seus últimos trabalhos.
Além disso o grupo também pretende discutir as leituras canônicas do escritor,
que, a partir de certas fases de sua obra, fizeram dele ora um autor romântico,
ora um aristocrata fin-de-siècle, ora
um estilista da língua portuguesa, entre outras personas que lhe foram
atribuídas» (ge.fflch.usp.br). O grupo é formado por docentes e alunos de
graduação e pós-graduação daquela universidade, a que se juntaram professores e
pesquisadores de outras universidades brasileiras e de outros países.
UM JORNAL: AS ARTES
ENTRE AS LETRAS
No dia 15 de maio passado saiu para as
bancas o n.º 242 do jornal As Artes Entre
As Letras, comemorativo do 10.º aniversário da edição destequinzenário que
publica a página Eça & Outras desde a primeira hora. Este número apresenta,
entre muitos outros, textos da sua diretora Nassalete Miranda, «Entre Sentidos»
e também de Guilherme de Oliveira Martins «Cultura e Humanidades», um poema de
José Valle de Figueiredo «Aqui há palavras que nos dizem», de Manuel de Novaes
Cabral «Um brinde à Nassalete», de J. A. Gonçalves Guimarães «Uma década, pouco
tempo, longa jornada» e de Francisco Ribeiro da Silva «Nos dez anos do “As
Artes entre As Letras”».
UM LIVRO: 10 ANOS - AS
ARTES ENTRE AS LETRAS
Nasessão
do 10 aniversário do jornal, que decorreu no dia 18 de maio na Biblioteca
Almeida Garrett no Porto, na qual foram intervenientes Salvato Trigo, reitor da
Universidade Fernando Pessoa; J. A. Gonçalves Guimarães, mesário-mor da Confraria
Queirosiana e Nassalete Miranda, diretora do jornal, foi lançado o livro 10 Anos - As
Artes Entre As Letras, editado
pela Singular Plural, o qual, para além dos textos introdutórios de Nassalete
Miranda, Rui Moreira e Guilherme de Oliveira Martins, publica as capas de todos
os números desde o “0”, publicado a 22 de maio de 2009 até ao n.º 242 acima
referido. Para além da beleza do grafismo e de muitas obras de Arte ali
reproduzidas, este livro mostra assim os mais diversos acontecimentos culturais
decorridos no Porto e sua região e mesmo no país.
Cursos, conferências e palestras
REVOLUÇÕES E CONSTITUIÇÔES
A Academia Eça
de Queirós está a organizar o próximo curso livre do Solar Condes de Resende,
com início no mês de outubro, desta vez sob o tema “Revoluções e Constituições”
comemorativo dos 200 anos da Revolução de 1820, contando já com a colaboração
de alguns dos mais reputados historiadores e constitucionalistas das
universidades do Porto, Minho e Nova de Lisboa para as diversas sessões sobre
as revolução contemporâneas desde a Revolução Americana de 1776 até ao 25 de
Abril de 1974, num total de treze sessões ao ritmo de duas por mês, aos sábados
à tarde, entre as 15 e as 17 horas. Brevemente será publicado o respetivo
programa e condições de inscrição para a frequência do curso.
BONECOS DE CASCATA
No próximo dia
30 de Maio, na habitual palestra das últimas quintas-feiras do mês, J. A.
Gonçalves Guimarães falará sobre «Bonecos de barro das cascatas sanjoaninas»,
desde a sua origem romana nos lares
vicinales, passando pelo fabrico de bonecos de barro na Idade Média, a sua
exportação para o Brasil no século XVIII e a sua sobrevivência até aos dias de
hoje.
Roteiros Queirosianos
EÇA DE QUEIRÓS, O EGITO E A TERRA SANTA
Prosseguindo as comemorações dos 150
anos da viagem de Eça de Queirós ao Egito com o 5.º Conde de Resende, a
Confraria Queirosiana vai celebrar um protocolo de colaboração com a empresa
Novas Fronteiras Viagens para a realização deste e de outros Roteiros
Queirosianos. Entretanto estão já em período de inscrição as seguintes viagens:
26 de julho a 5 de agosto – Cairo, Cruzeiro no Nilo e Hurghada; 20 a 27 de
agosto – Cairo e Cruzeiro no Nilo; 31 de outubro a 11 de novembro – Alexandria,
Cairo e Cruzeiro no Nilo; 26 de dezembro a 6 de janeiro de 2020 – Alexandria,
Cairo e Terra Santa, com noite de fim-de-ano em Jerusalém. Todas estas viagens
são guiadas pelo Prof. Doutor Luís Manuel de Araújo, egiptólogo,
vice-presidente da direção da Confraria Queirosiana e diretor da Revista de Portugal.
Eventos próximos
SINTRA QUEIROSIANA
Nos próximos
meses de verão, no ciclo de Teatro e Património em Sintra (TPS 2019 Sintra
Romântica), vão decorrer neste município vários espetáculos e outros eventos de
matriz queirosiana, produzidos pela empresa ÉTER Cultural. Assim um junho, nos
dias 8, 9, 15, 16, 22 e 23 decorrerá na Vila Alda – Casa do Eléctrico de Sintra
uma recreação intitulada “1904 Inauguração do Eléctrico” (Teatro e Beberete
Queirosiano); nos dias 6, 7, 14 e 21 de julho, na Quinta MontFleuri, uma
representação de Os Maias, a
propósito dos 130 anos da sua publicação (Teatro e Jantar Queirosianos); nos
dias 19, 20 e 21 de setembro, na Quinta da Ribafria um “Serão nos Gouvarinhos –
Os Maias” (Multimédia e Teatro); nos dias 27, 28 e 29 de setembro, nas arcadas
do Palácio Nacional de Sintra, decorrerá um “Baile de Máscaras – Os Maias”
(Multimédia e Teatro). As condições de acesso a estes espetáculos podem ser
vistas em www.etercultural.com
40 ANOS DO CURSO DE HISTÓRIA 1978/1979 DA FLUP
Passados 40 anos
sobre o Curso de História da Faculdade de Letras da Universidade do Porto
1978/1979, os seus alunos vão reunir-se no próximo dia 6 de julho no almoço
ALUMNI comemorativo dos 100 anos daquela Faculdade fundada em 1919 e que o Estado
Novo encerrou em 1928, reabrindo depois em 1961. Daquele Curso, entre muitos
outros, saíram os historiadores Silvestre Lacerda, diretor da Torre do Tombo; José
António Martin Moreno Afonso, professor da Universidade do Minho e membro da
mesa da assembleia geral da ASCR – Confraria Queirosiana; e J. A. Gonçalves
Guimarães, secretário e mesário-mor da mesma associação, ambos co-fundadores em
1982 do Gabinete de História e Arqueologia de Vila Nova de Gaia, desde 2004
integrado nesta associação como Gabinete de História, Arqueologia e Património.
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Eça & Outras, III.ª série, n.º 129,
sábado, 25 de maio de 2019; propriedade dos Amigos do Solar Condes de Resende -
Confraria Queirosiana; C.te. n.º 506285685;
NIB: 0018000055365059001540; IBAN: PT50001800005536505900154; email: queirosiana@gmail.com;
www.queirosiana.pt; confrariaqueirosiana.blospot.com;
eca-e-outras.blogspot.com; vinhosdeeca.blogspot.com; coordenação da página: J.
A. Gonçalves Guimarães (TE-164 A); redação: Fátima Teixeira e Amélia Cabral;
inserção: Licínio Santos.
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