sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Eça & Outras

CANÇÕES E CANÇONETAS


Quem alguma vez refletiu sobre o ato de cantar em Portugal logo deparou com inúmeras perplexidades: nós não cantamos espontaneamente, muito menos por prazer e, de um modo geral, confundimos o cantar com o berrar ou mesmo com o vociferar, ainda que ritmado, o esganiçar, o grunhir. Basta ouvir como berramos o hino nacional e está tudo dito. Ainda que em jejum, cantamos sempre com a barriga como depois da almoçarada. Tirando umas cançõezinhas mais ou menos conhecidas e harmoniosas cantadas em terras onde houve mosteiros e professores de música que deixaram tradição; tirando as cidades e vilas onde houve orfeão ou teatro lírico, o resto é uma desgraça de pieguice, primarismo vocal e musical, macaquice de imitação, horrorosos karaokes, um pavor de ouvir-se. Depois temos o fado: «Atenas produziu a escultura, Roma fez o Direito, Paris inventou a revolução, a Alemanha achou o misticismo. Lisboa que criou? – O Fado» (Eça de Queirós, Prosas Bárbaras). Por isso acho bem e justo que o fado seja património português de reconhecimento internacional, isso de património mundial é uma enorme contradição, pois não estou a ver os australianos ou os suecos a trautearem o “Ai Mouraria”. Mas, a despeito da classificação, continuamos a comprar tudo quanto é cantiga e música estrangeira sobretudo inglesa e norteamericana. Claro que existem aquelas músicas mais ou menos universais a dois níveis: as de elaborada escola – Mozart, Verdi, outros mais recentes – e as cançonetas para as rádios, televisões, cinema e festanças públicas, algumas das quais ficarão na memória. Poucas. A maioria são como os chicletes, suportam-se enquanto estão “doces”.
Em termos cançonetísticos, entre nós o panorama é mauzote, mas temos muitas exceções que são, as mais das vezes, nada mais que exceções. Não deixam exemplo nem fazem escola. Mas sendo de qualidade reconhecida, raramente passam nas nossas rádios e televisões ou nos nossos festivais, que preferem divulgar a banalidade estrangeira promovida pelas grandes empresas de espetáculos ou aquela macaquice de imitação insuportável nas televisões e que paga direitos de autor para a estranja. Lembram-se da Lei da Rádio?
Tenho poucos preconceitos nacionalistas, mas banal por banal, preferia que aquele imposto que eu pago no recibo da luz para ouvir rádio ou o canal televisivo, extorquido sem direito a reclamações, ficasse por cá e até fosse pago a alguns maus cantores para deixarem de cantar ou, se ainda fossem a tempo, para aprenderem.
Também não tenho preconceitos musicais, pois só conheço dois tipos de música: a que gosto e a que não gosto. Schubert e Schumann só ouço como fundo sonoro laboral; Pinho Vargas não consigo ouvir distraído, mas as razões serão outras. Um concerto ao ar livre não é a mesma coisa que colocar o CD na maquineta lá de casa.
Às vezes uma melodia é uma coisa bem simples: «Aquela música é como o amor: juntam-se as imagens e as comparações, tenta explicar-se – mas não se pode dizer o que ela é. Foge pela sua natureza abstrata à expressão escrita. Nunca a filosófica instrumentação de Meyerbeer, nem o idealismo de Beethoven, nem a luminosa serenidade de Mozart, nem a música vermelha e diamantina de Verdi, nem o romantismo apaixonado de Donizetti – nunca nada me deu a impressão profunda daqueles cantos árabes nas ruas do Cairo. São tão belos que entristecem, tão sensuais que são quase lacrimosos, tão doces que desesperam: é a música dos nervos; são os nervos que cantam…» (Eça de Queirós, O Egito).
Cantemos pois com arreganho os nossos estados de alma, um fado, um hino, um rap. Mas com qualidade, com esmero e com conteúdo adequados ao tempo, à arte, à sabedoria das coisas: «Os tristes, os deserdados, os pobres, os oprimidos, quando tudo lhes falta, o pão, o lume, o vestido, têm sempre, no fundo da alma, uma cantiga pequena que os consola, que os aquece, que os alegra. É a última coisa que fica no pobre. E então a cantiga vale mais do que todos os poemas» (Eça de Queirós, Distrito de Évora).
Por isso cantemos, que «quem canta seus males espanta» (popular).

J. A. Gonçalves Guimarães


VII FÓRUM INTERNACIONAL DE SINOLOGIA

Decorre nos próximos dias 1, 2 e 3 de Março no Auditório do Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto, S. Mamede de Infesta, a presente edição deste fórum, organizado pelo Instituto Português de Sinologia.
A sessão inaugural decorrerá no dia 1 pelas 10 horas, sendo oradores o Prof. Roger Greatrex da Universidade de Lund (Suécia) e o Prof. Wang Keping, da Academia Chinesa das Ciências Sociais, a que se seguem oradores das universidades de Hong Kong, Montreal, Ghent, Jean Moulin Lyon 3, Cambridge, Ludwig Maximilian de Munique, Tubinga, Oxford, Leiden, Estocolmo, Nápoles, Nanquim, Técnica de Lisboa, Toronto, Harvard, Paris 7, Pompeu Fabra de Barcelona, Florença, Macau, Nova de Lisboa, Taiwan, Aveiro, Livre de Berlim, Coimbra, Paris III, Academia das Ciências da Rússia, Instituto de Contabilidade e Administração do Porto e Academia Eça de Queirós, esta última representada por Gonçalves Guimarães que no dia 3 presidirá à sessão sobre o tema “O Mar, rotas migratórias para outras terras” e que no último painel dessa sessão falará sobre “A representação dos Chineses na obra de Eça de Queirós”.
Pela primeira vez na realização deste fórum internacional não consta o senhor ministro dos Negócios Estrangeiros na comissão de honra para a qual, como habitualmente, foi convidado.
A participação nas sessões é grátis, obrigando a inscrição prévia.

CONFERÊNCIAS

No próximo mês de Março serão proferidas conferências pelos seguintes confrades queirosianos: 1 de Março, Reitoria da Universidade do Porto “A proteção mágica dos defuntos para o Além” por Luís Manuel de Araújo, egiptólogo.
29 de Março – Biblioteca Municipal da Régua, “Marquês de Soveral Homem do Douro e do Mundo” por J. A. Gonçalves Guimarães, historiador.

Espetáculos

Decorreu no passado dia 3 de Fevereiro uma nova apresentação de Os Maias de Eça de Queirós, em adaptação dramatúrgica de Miguel Real e Filomena Oliveira no Auditório Acácio Barreiros do Centro Cultural Olga Cadaval em Sintra. Esta versão estreou em 2010, tendo já sido vista por mais de 15.000 espetadores estando em cena todas as quartas-feiras até Maio próximo. No dia 4 de Fevereiro decorreu um jantar queirosiano na Estalagem de Colares, seguido de conversa com o escritor Miguel Real, tudo numa realização da Éter, produção cultural.

Exposições


No próximo dia 11 de Fevereiro, pelas 16 horas, no Museu Municipal da Póvoa de Varzim, abre ao público a exposição “Interiores (por debaixo do vestido)” organizada por aquele Museu, e que assim apresenta ao público de hoje uma interessante coleção de roupa íntima do tempo de Eça de Queirós.








Está também em exposição no Solar Condes de Resende até ao final de Fevereiro a mostra “A Guerra Peninsular – da Literatura à Banda Desenhada” comissariada por José Valle de Figueiredo e organizada pela Sociedade Histórica da Independência de Portugal.
Desde o século XIX que aquele período da História de Portugal serviu de tema a romancistas portugueses e estrangeiros e, já no século XX, a vários autores de BD.
A mostra está ainda enriquecida com armas e objetos da época da Coleção Marciano Azuaga e com vária bibliografia sobre o contributo de Vila Nova de Gaia e do Entre-Douro-e-Vouga na luta contra os franceses.


Cursos

Termina no próximo mês de Março a segunda edição do curso “Eça de Queirós, sua vida sua obra, sua época”, que decorreu no Solar Condes de Resende organizado pela Academia Eça de Queirós e que teve como oradores J. A. Gonçalves Guimarães, Fernando Coimbra, Luís Manuel de Araújo, José Manuel Tedim, Nuno Resende, Anabela Freitas, José Maia Marques, Jaime Milheiro e Ana Margarida Dinis Vieira.
Nas duas últimas sessões de Março, nos dias 10 e 24, falarão Anabela Freitas Mimoso sobre “Uma gramática da Educação”, e J. A. Gonçalves Guimarães, sobre “Eça de Queirós, a China e os Chineses”.
Prossegue no Solar Condes de Resende o curso de Pintura e Expressão Plástica, ministrado pela professora Paula Alves, que visitou recentemente a ARCO de Madrid onde se inteirou das mais recentes tendências estéticas europeias e mundiais. O curso decorre às quintas-feiras entre as 18 e as 20 horas.
A partir do mês de Abril irá iniciar-se um Clube de Bridge e voltará o workshop de Tango Argentino pelos professores Inês Tabajara e Carlos Cabral nos dias 14 e 15 desse mês.

Livros

No próximo dia 3 de Março pelas 15 horas, no Restaurante Mandoline, em Telheiro, Barreira, Leiria, decorrerá o lançamento do livro “Imagens de Palavras” do nosso confrade Joaquim Santos, diretor do jornal Notícias de Colmeias com ilustrações do Mestre Mário Silva e prefácio de António Eça de Queirós, com dois momentos de música clássica de André Ferreira



À procura de dados sobre Luís de Magalhães, antigo proprietário no Douro da Quinta do Bom Retiro que a Casa Ramos Pinto adquiriu em 1919, estava então ele preso por ter aderido à Monarquia do Norte, encontrei este precioso livro de José Valle de Figueiredo, coordenador dos Cadernos do Mosteiro do Centro de Estudos de História Cultural Luís de Magalhães, da Maia, publicado em 2001, com outros títulos de interesse na mesma coleção.






Distinção

João Nicolau de Almeida, o enólogo da Ramos Pinto e nosso confrade, volta a ser distinguido, desta vez pela revista Wine como a personalidade do ano nos vinhos portugueses, na sua edição de Janeiro de 2012.

Brindar com um Porto:

À memória de Igrejas Caeiro, o Senhor da Rádio; à libertação de Khader Adnane, com um chá de hortelã.


Eça & Outras, IIIª. Série, n.º 42 – Sábado, 25 de Fevereiro de 2012
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J. A. Gonçalves Guimarães (TE-638); redacção: Fátima Teixeira; inserção: Amélia Cabral.