sábado, 25 de maio de 2019

Eça & Outras, sábado, 25 de maio de 2019


O Património Político como mais-valia do presente: a propósito dos 200 Anos da Revolução de 1820
        Venho hoje falar do Património Político da cidade do Porto, como um património imaterial para os tempos que vivemos. No próximo ano acredito que vão aqui comemorar-se os 220 anos da Revolução de 24 de Agosto, ou Constitucional, ou Vintista. Após a Revolução Americana de 1776, da Francesa de 1789, da Constituição de Cádis de 1812 e da Revolta Republicana de Pernambuco de 1817, um grupo de personalidades portuguesas e portuenses, conscientes da necessidade de colocar Portugal na linha da frente das preocupações civilizacionais, criou no Porto o Sinédrio como clube de reflexão e ação, tendo também aliciado alguns militares descontentes com a sua situação profissional para aderirem ao movimento, tomando depois o poder na cidade e no país. É certo que em nome do rei ausente no Brasil, mas sobretudo contra a Inglaterra, a potência ocupante e dominante em ambos os lados do Atlântico desde as Invasões Francesas. Esta Revolução, feita pelos armadores-negociantes da praça do Porto, ou pelos seus filhos já bacharéis em Direito por Coimbra, com um ou outro membro da sociedade mais viajado e letrado, conhecedor das mudanças de um mundo em transformação, além dos referidos militares, cuja maioria rapidamente vai mudar de campo, teve de concretizar-se em circunstâncias habilmente consensuais no que, naqueles dias, era prioritário: trazer o rei do Brasil, libertar o país da opressiva subordinação estrangeira, marcar eleições para os cidadãos se expressarem através dos seus representantes e elaborar e aprovar uma Constituição que acabasse com o poder absoluto e regulasse a vida da sociedade portuguesa no respeito pela liberdade, pela segurança, pela propriedade e pela igualdade. Não era pouco o que de si exigiam os revolucionários vintistas. Como é sabido, depois da Revolução ter triunfado também em Lisboa, logo em dezembro realizaram-se as primeiras eleições em Portugal, a primeira vez que os cidadãos “foram às urnas”.
         Para além dos princípios gerais atrás enunciados a consignar na Constituição (Liberdade, Segurança, respeito pela Propriedade, Igualdade de oportunidades para todos os cidadãos), que mais queriam estes homens e mulheres (nessa época havia na região várias viúvas à frente de empresas de comércio marítimo e das primeiras indústrias) ? Então, tal como hoje, a vida fluía todos os dias e a maior parte destes revolucionários eram homens práticos, entendidos em comércios, navegações e criação de riqueza pelo trabalho, queriam coisas bem concretas e práticas, que obviamente aproveitavam o momento em que novas ideias filosóficas e políticas se implantavam na sociedade portuguesa. A 23 de setembro de 1822 foi aprovada a 1.ª Constituição Portuguesa que, entre muitos outros artigos, consignava no seu artigo 9.º que «a lei é igual para todos». Sabemos também o que, entretanto, veio a seguir com a contra-revolução miguelista: a Constituição foi banida, o poder absoluto de novo, temporariamente instituído, e os adeptos do constitucionalismo perseguidos e alguns dos quais barbaramente sacrificados, como foi o caso dos «mártires da Liberdade», levando o país para uma guerra civil entre 1832-1834, e as que se lhe seguiram, durante as quais a cidade do Porto e todos os liberais sacrificaram vidas e bens para que o país se acertasse com o concerto das nações «…em plena marcha pela estrada da glória, arvorando o Estandarte da Liberdade e derrubando as góticas edificações do Despotismo», como se escreveu no Português Constitucional de 22 de setembro de 1820.
         No vastíssimo Património Mundial que é o Porto, nem todo ele é arqueológico, artístico, edificado ou institucional. Existe também na cidade, ou na ideia que dela temos, o Património Humano e o Imaterial, como é o caso deste outro que tem a ver com a liberdade organizada dos seus cidadãos. Se bem que esteja já materializado em pequenos ou grandes monumentos espalhados pela cidade e pelo país e também nesse filho maior da revolução vintista portuense que é o Brasil independente, não podemos ignorar este património filosófico e político, que é o do apego às instituições democráticas geridas pelo voto popular. Depois do Património Humano é o mais importante de todos os Patrimónios, pois não só ele respeita as pessoas, os acontecimentos e os monumentos do passado como transforma os seus bens com memória e qualidade em mais-valia do presente e certezas de futuro, muito para além dos modismos épocais.
     Preparemo-nos pois com a devida antecedência para comemorarmos condignamente os 200 anos da Revolução de 1820, talvez o momento mais marcante da História em que a cidade do Porto e a região, representados por um punhado dos seus cidadãos mais esclarecidos, se acertaram com a marcha do progresso da Humanidade.
Como escreveu Eça de Queirós no Districto de Évora em 1867, «as revoluções não são factos que se aplaudam ou que se condenem… De cada vez que vêm é sinal de que o homem vai alcançar mais uma liberdade, mais um direito, mais uma felicidade.». Os historiadores não vão ao passado buscar acontecimentos mais ou menos bizarros para propor aos seus leitores ou ouvintes ócios eruditos. O seu trabalho é ir aos acontecimentos verdadeiros da História retomar os fios da vida, mesmo aqueles que o tempo esfiapou ou que outros acontecimentos mais recentes enovelaram, ou mesmo quebraram ou esqueceram. Para que o Património, material ou imaterial que as gerações passadas nos legaram, possa ainda hoje frutificar como exemplo e proveito para as gerações vindouras. Mas como também não vivemos no futuro, mas sim nos dias que correm, comemorar os 200 anos da Revolução de 1820 será com certeza uma mais-valia do presente.
(extrato da comunicação proferida na Biblioteca Almeida Garrett no Porto a 18 de Maio na sessão comemorativa do 10.º aniversário do jornal As Artes Entre As Letras)

J. A. Gonçalves Guimarães
mesário-mor da Confraria Queirosiana


CONFRADE QUEIROSIANO AGRACIADO
            No passado dia 22 de maio, no Dia do Município de Leiria, o Eng.º. Ricardo Charters de Azevedo foi agraciado com a medalha de mérito municipal classe ouro por aquele município queirosiano, pelo seu «empenho na defesa de Leiria e das suas causas, em especial na área da Cultura». O galardoado, para além de promotor e principal sponsor do prémio Villa Portela, destinado a premiar os trabalhos de «investigação no âmbito da História Local e do Património do Distrito de Leiria» é ainda autor de importante bibliografia nesse âmbito, de que destacamosDoutor D. Frei Patrício da Silva, um cardeal leiriense, Patriarca de Lisboa. 2009;
Quem escreveu o Couseiro?,2010; e A Estrada de Rio Maior a Leiria em 1791, 2011. O agora distinguido peço município do Lis já é Grande-oficial da Ordem do Infante D. Henrique e Confrade Mecenas da Confraria Queirosiana.

Eventos passados
CAPELA DO SENHOR DA PEDRA
            No dia 11 de Maio, logo pela manhã, um grupo de amigos da Capela do Senhor da Pedra organizado por Joaquim Lima Moreira Vaz, participou numa tertúlia e visita guiada à capela e ao seu enquadramento feita pelo professor e patrimoniólogo Henrique Guedes, autor de uma monografia sobre este monumento emblemático do litoral de Gaia publicada em 2000 e já esgotada. Como a romaria tradicional se avizinha, foram ali ouvidas as quadras da célebre Rusga ao Senhor da Pedra, recolhida nos anos trinta pelo etnomusicólogo Armando Leça.

EXPOSIÇÃO DE PROFESSORES E EDUCADORES
            Nesse mesmo dia, mas pelas 15 horas, abriu na Biblioteca Pública Municipal de Vila Nova de Gaia a XXVI Exposição de Pintura, Cerâmica e Porcelana da Associação da Casa dos Professores e Educadores de Gaia, organizada sob a orientação do professor José Manuel Ribeiro e que este ano contou com a colaboração de cerca de três dezenas de participantes. A mostra esteve patente até hoje, dia 25 de maio.

DANTE NO PORTO
            No dia 17 de Maio, pelas 21,15, na Sala da Música do Museu Soares dos Reis, no Porto, no evento “Divina Commedia, uma Viagem pela Arte”, integrada no projeto Dante no Porto, promovido pela Associazione Socio-Culturale Italiana del Portogallo Dante Allighieri, o Prof. Doutor José Manuel Tedim apresentou «uma aula de história de arte e estética sobre as influências que o imaginário dantesco teve nas artes, nomeadamente pintura e escultura, desde a Idade Média até hoje».

DA PSIQUIATRIA À SAÚDE MENTAL
         No dia 18 de maio pelas 11,15, no Auditório do Parque Biológico de Gaia, o médico psiquiatra e ensaísta Dr. Jaime Milheiro, autor, entre muitas outras obras, de O Centro de Saúde Mental de V. N. de Gaia (1969-1992) – uma breve narrativa…na primeira pessoa, publicado em 2013,apresentou uma conferência intitulada Da Psiquiatria à Saúde Mental – 50 anos depois, integrada nas 9.as Jornadas de Psiquiatria e Saúde Mental do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/ Espinho.

EÇA DE QUEIRÓS E A GERAÇÃO DE 70
            Nas habituais sessões de divulgação da vida obra e época de Eça de Queirós para vários públicos e dos respetivos Roteiros Queirosianos, J. A. Gonçalves Guimarães no dia 23 de Maio apresentou duas conferências sob o tema « Eça de Queirós e a Geração de 70: itinerários de amizade, pensamento e ação», a primeira pelas 11 da manhã no Colégio do Rosário no Porto para cerca de 150 alunos do 11.º ano que estudam Os Maias, tendo-a repetido, com outro enfoque e para outro tipo de público pelas 18 horas no Arquivo Municipal Alberto Sampaio em Vila Nova de Famalicão.

Livros e Revistas

         O Grupo Eça da Universidade de São Paulo, Brasil, na sequência de outros título já apresentados desde 2015, acaba de publicar o livro Novas Leituras Queirosianas. O Primo Basílio e outras produções, coordenado por Giuliano LellisIto Santos, Luciene Marie Pavanelo e Hélder Garmes e divulgado em Portugal pelo Professor Doutor Carlos Reis, da Universidade de Coimbra e que dele faz parte. Aquele grupo «tem por finalidade estudar a obra do escritor português Eça de Queirós, assim como sua fortuna crítica. Privilegiando uma abordagem de fundamentação marxista, mas aberto a outras abordagens, o grupo pretende reler a obra queirosiana, tomando por pressuposto que o autor de Os Maias foi sempre um crítico ferrenho da burguiesia e da aristocracia portuguesas, mesmo em seus últimos trabalhos. Além disso o grupo também pretende discutir as leituras canônicas do escritor, que, a partir de certas fases de sua obra, fizeram dele ora um autor romântico, ora um aristocrata fin-de-siècle, ora um estilista da língua portuguesa, entre outras personas que lhe foram atribuídas» (ge.fflch.usp.br). O grupo é formado por docentes e alunos de graduação e pós-graduação daquela universidade, a que se juntaram professores e pesquisadores de outras universidades brasileiras e de outros países.


UM JORNAL: AS ARTES ENTRE AS LETRAS
         No dia 15 de maio passado saiu para as bancas o n.º 242 do jornal As Artes Entre As Letras, comemorativo do 10.º aniversário da edição destequinzenário que publica a página Eça & Outras desde a primeira hora. Este número apresenta, entre muitos outros, textos da sua diretora Nassalete Miranda, «Entre Sentidos» e também de Guilherme de Oliveira Martins «Cultura e Humanidades», um poema de José Valle de Figueiredo «Aqui há palavras que nos dizem», de Manuel de Novaes Cabral «Um brinde à Nassalete», de J. A. Gonçalves Guimarães «Uma década, pouco tempo, longa jornada» e de Francisco Ribeiro da Silva «Nos dez anos do “As Artes entre As Letras”».

UM LIVRO: 10 ANOS - AS ARTES ENTRE AS LETRAS
Nasessão do 10 aniversário do jornal, que decorreu no dia 18 de maio na Biblioteca Almeida Garrett no Porto, na qual foram intervenientes Salvato Trigo, reitor da Universidade Fernando Pessoa; J. A. Gonçalves Guimarães, mesário-mor da Confraria Queirosiana e Nassalete Miranda, diretora do jornal, foi lançado o livro 10 Anos - As Artes Entre As Letras, editado pela Singular Plural, o qual, para além dos textos introdutórios de Nassalete Miranda, Rui Moreira e Guilherme de Oliveira Martins, publica as capas de todos os números desde o “0”, publicado a 22 de maio de 2009 até ao n.º 242 acima referido. Para além da beleza do grafismo e de muitas obras de Arte ali reproduzidas, este livro mostra assim os mais diversos acontecimentos culturais decorridos no Porto e sua região e mesmo no país.

Cursos, conferências e palestras
REVOLUÇÕES E CONSTITUIÇÔES
      A Academia Eça de Queirós está a organizar o próximo curso livre do Solar Condes de Resende, com início no mês de outubro, desta vez sob o tema “Revoluções e Constituições” comemorativo dos 200 anos da Revolução de 1820, contando já com a colaboração de alguns dos mais reputados historiadores e constitucionalistas das universidades do Porto, Minho e Nova de Lisboa para as diversas sessões sobre as revolução contemporâneas desde a Revolução Americana de 1776 até ao 25 de Abril de 1974, num total de treze sessões ao ritmo de duas por mês, aos sábados à tarde, entre as 15 e as 17 horas. Brevemente será publicado o respetivo programa e condições de inscrição para a frequência do curso.

BONECOS DE CASCATA
            No próximo dia 30 de Maio, na habitual palestra das últimas quintas-feiras do mês, J. A. Gonçalves Guimarães falará sobre «Bonecos de barro das cascatas sanjoaninas», desde a sua origem romana nos lares vicinales, passando pelo fabrico de bonecos de barro na Idade Média, a sua exportação para o Brasil no século XVIII e a sua sobrevivência até aos dias de hoje.

Roteiros Queirosianos

EÇA DE QUEIRÓS, O EGITO E A TERRA SANTA
            Prosseguindo as comemorações dos 150 anos da viagem de Eça de Queirós ao Egito com o 5.º Conde de Resende, a Confraria Queirosiana vai celebrar um protocolo de colaboração com a empresa Novas Fronteiras Viagens para a realização deste e de outros Roteiros Queirosianos. Entretanto estão já em período de inscrição as seguintes viagens: 26 de julho a 5 de agosto – Cairo, Cruzeiro no Nilo e Hurghada; 20 a 27 de agosto – Cairo e Cruzeiro no Nilo; 31 de outubro a 11 de novembro – Alexandria, Cairo e Cruzeiro no Nilo; 26 de dezembro a 6 de janeiro de 2020 – Alexandria, Cairo e Terra Santa, com noite de fim-de-ano em Jerusalém. Todas estas viagens são guiadas pelo Prof. Doutor Luís Manuel de Araújo, egiptólogo, vice-presidente da direção da Confraria Queirosiana e diretor da Revista de Portugal.

Eventos próximos
SINTRA QUEIROSIANA
         Nos próximos meses de verão, no ciclo de Teatro e Património em Sintra (TPS 2019 Sintra Romântica), vão decorrer neste município vários espetáculos e outros eventos de matriz queirosiana, produzidos pela empresa ÉTER Cultural. Assim um junho, nos dias 8, 9, 15, 16, 22 e 23 decorrerá na Vila Alda – Casa do Eléctrico de Sintra uma recreação intitulada “1904 Inauguração do Eléctrico” (Teatro e Beberete Queirosiano); nos dias 6, 7, 14 e 21 de julho, na Quinta MontFleuri, uma representação de Os Maias, a propósito dos 130 anos da sua publicação (Teatro e Jantar Queirosianos); nos dias 19, 20 e 21 de setembro, na Quinta da Ribafria um “Serão nos Gouvarinhos – Os Maias” (Multimédia e Teatro); nos dias 27, 28 e 29 de setembro, nas arcadas do Palácio Nacional de Sintra, decorrerá um “Baile de Máscaras – Os Maias” (Multimédia e Teatro). As condições de acesso a estes espetáculos podem ser vistas em www.etercultural.com

40 ANOS DO CURSO DE HISTÓRIA 1978/1979 DA FLUP
      Passados 40 anos sobre o Curso de História da Faculdade de Letras da Universidade do Porto 1978/1979, os seus alunos vão reunir-se no próximo dia 6 de julho no almoço ALUMNI comemorativo dos 100 anos daquela Faculdade fundada em 1919 e que o Estado Novo encerrou em 1928, reabrindo depois em 1961. Daquele Curso, entre muitos outros, saíram os historiadores Silvestre Lacerda, diretor da Torre do Tombo; José António Martin Moreno Afonso, professor da Universidade do Minho e membro da mesa da assembleia geral da ASCR – Confraria Queirosiana; e J. A. Gonçalves Guimarães, secretário e mesário-mor da mesma associação, ambos co-fundadores em 1982 do Gabinete de História e Arqueologia de Vila Nova de Gaia, desde 2004 integrado nesta associação como Gabinete de História, Arqueologia e Património.
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Eça & Outras, III.ª série, n.º 129, sábado, 25 de maio de 2019; propriedade dos Amigos do Solar Condes de Resende - Confraria Queirosiana; C.te. n.º 506285685; NIB: 0018000055365059001540; IBAN: PT50001800005536505900154; email: queirosiana@gmail.com; www.queirosiana.pt; confrariaqueirosiana.blospot.com; eca-e-outras.blogspot.com; vinhosdeeca.blogspot.com; coordenação da página: J. A. Gonçalves Guimarães (TE-164 A); redação: Fátima Teixeira e Amélia Cabral; inserção: Licínio Santos.