segunda-feira, 25 de abril de 2016

Eça & Outras

Os Vinte e Cinco de Abril

            A propósito das comemorações do dia 25 de Abril que hoje decorrem, e que cada vez mais são a banalidade do cumprimento de um ritual de calendário salpicado de recordações revisitadas e nem sempre compreendidas, ou só parcialmente evocadas, a que agora se misturam algumas realizações oportunistas que nada acrescentam à felicidade dos povos, quando começam a escassear os testemunhos pessoais daqueles tempos em que se fizeram três coisas simples e heroicas, que não são as depois teorizadas pelos vencedores do 25 de Novembro: o 25 de Abril de 1974 foi um golpe militar de jovens oficiais militares com formação académica que se rebelaram contra o Estado e a hierarquia senil e obsoleta que a todo o custo pretendia perpetuar um império do faz de conta, de que algumas famílias da classe alta, média e até de colonos assalariados, tiravam proveito num país pobre, medíocre, crente e doméstico. Leia-se aqui à custa de boa parte da juventude portuguesa não alinhada, pois muitos dos filhos dos sustentáculos do regime, em Portugal e nas colónias, não iam à guerra porque iam “estudar” para a Europa ou eram dados como “tolinhos”, como o Bush dos Estados Unidos, que em vez de ir parar ao inferno do Vietnam, como muitos dos seus patrícios, foi incorporado na guarda lá da terrinha, o tal que, com Tony Blair, Aznar e o ex-MRPP Durão Barroso foram responsáveis pela morte de 100.000 civis no Iraque e ainda não foram levados a nenhum tribunal internacional para se justificarem. Ou então iam para lugares com “ar condicionado” garantido na segurança das retaguardas. Se não acreditam nas exceções das guerras coloniais dos portugueses, façam um pequeno inquérito informal entre os vossos conhecidos dessa época e contem-me depois, seriamente, os resultados. É o chamado “patriotismo” endossado: os sacrifícios pela Pátria ficam sempre muito bem feitos pelos outros. Ao mal estar dos militares do quadro juntou-se o dos milicianos que não conseguiram fugir ou escapar, e que viam a sua legítima expetativa de vida barrada pelo muro de betão da guerra colonial, fartos de um conflito inútil e estúpido que não tinha fim à vista. Foi pois o pôr fim à guerra o principal objetivo do 25 de Abril, porque era essa a lepra que roía a sociedade portuguesa de então. Um outro propósito foi o de pôr Portugal em contato franco e aberto com o que de melhor de fazia no mundo em todos os domínios do saber e do conhecimento. E se este propósito também era partilhado por alguns (muito poucos) dos militares profissionais mais esclarecidos, ele era sobretudo civil. Estávamos fartos de ser o país-paróquia governado por mentes cinzentas, as mais das vezes ridículas. Recorde-se que foi este sentir que levou a que mesmo algumas figuras gradas do regime, mas que tinham “ido lá fora”, se tivessem revoltado contra a situação, como foi o caso de Henrique Galvão e Humberto Delgado. Finalmente o terceiro propósito era o da renovação social, que pretendia trocar os morgados estadonovistas bacocos pelos mais capazes, caminhando em direção a uma meritocracia que administrasse o país e cada uma das suas valências com seriedade e sabedoria. Este último propósito falhou completamente, até porque rapidamente os ditos rebentos se travestiram gritando muito pela democracia, enquanto os meninos da classe média “liberal” se inventavam revolucionários folclóricos até arranjarem um bom lugar na nova ordem. Não terão sido todos assim, nem os pretendemos meter a todos no mesmo saco: ser-se filho de uns dados pais é circunstância que não lhes cabe em culpa, e de todos eles certamente poderemos aprender o melhor, seja lá o que isso for. O “povo”, ou seja “as massas”, entretanto, adaptou-se aos novos mitos nascidos dos anteriores, fazendo-se devoto de São Zé Povinho, analfabeto e grosseiro, mas convencido de que agora ele é que mandava na “Pátria, a mãe de todos nós”. “Revolução dos Cravos”, a flor-símbolo do anticonstitucionalista D. Miguel? Revoluções são coisa séria, que não têm desfiles nas avenidas. O golpe militar do 25A, e os que se lhe seguiram, deram no que deram e o resultado aí está à vista de todos, mesmo dos cegos de espírito. Hoje pega-se no jornal, ou ouvem-se as notícias e, se é certo que a guerra agora é lá com os outros e que Portugal caminha, embora de mão estendida, ao lado do mundo livre, também dito ocidental, continuamos por aqui sob a ação dos muitos dos filhos e netos dos estadonovistas a protagonizarem os nossos escândalos caseiros de corrupção na banca, na política, no futebol, na religião, na cultura, na saúde, na educação, sei lá em que mais. E como isto deve ter o seu quê de genético, os nossos “irmãos de Angola” que estão no poder perseguem e condenam os jovens que ousam discordar da ação das “vacas sagradas” da “revolução”, tal como cá antes do 25 de Abril, perante o silêncio conivente dos netos dos colonialistas e (pasme-se!) dos “primos” da Amadora, enquanto no Brasil, sessenta por cento de cadastrados, ou futuros cadastrados, deputados “irmãos” que o povo elegeu para o parlamento (segundo as notícias sobre a corrupção “do lado di lá”, onde aparecem nomes do “lado di cá”), teimam em dar o golpe na destituição da atual presidente, eleita pelo mesmo povo, para assim travarem a ação de alguns juízes sérios que os querem levar a todos a tribunal, ou então são completamente perversos, querendo fazer vingar os interesses da casta a que, em regra geral, pertencem através do velho truque da divinização da Lei. O tempo o dirá, mas só que nós, os comuns mortais, portugueses, angolanos, brasileiros e outros palopianos, universais, laicos e humanistas, queremos apenas o paraíso na terra nos dias de hoje e não no dia de São Nunca à tarde que há séculos nos andam a cobrar.
            Para continuarmos a ter esperança na espécie humana, e a refletir sobre o 25 de Abril, resta-nos voltar a ler, para além do “Portugal, a Flor e a Foice” de J. Rentes de Carvalho, talvez ainda e sempre Eça de Queirós: «(…) o servilismo inteletual é no homem um vício irredutível, e que por mais que se lhe facilite o largo e livre exercício da razão, e que se lhe ensine a sacudir o despotismo dos oráculos – sempre ele por instinto, por covardia, por indolência, por desconfiança de si próprio, abdicará o direito de pensar originalmente e se submeterá com prazer, com alívio, a toda a autoridade, que, à maneira de um pastor entre um rebanho, se erga, toque a buzina e lhe aponte um caminho com o cajado. Realmente a humanidade é gado – e o primeiro movimento de toda a cabeça livre é pender para o sulco aberto, enfiar para debaixo da canga» (Eça de Queirós, Cartas de Paris). Da minha parte, e creio que da do Mestre, pedimos desculpa se ofendemos vosselências, mas não é essa a nossa intenção. Se tal for o caso, saibam que quem vos ofende são mesmo vocês. Acordai de vez ou ide-vos! Para o Panamá, a Madeira ou outra ilha off shore qualquer. Supomos que o bom senso vai em breve fechar Guantánamo: já vos resta pouco planeta e pouca margem de manobra.

J. A. Gonçalves Guimarães
Mesário-mor

VOANDO NO TEMPO

Queirosianos em destaque na Imprensa

            Nos últimos tempos vários são os confrades queirosianos com grande destaque na Imprensa. Correndo o risco de pecar por omissão, assinalemos a entrevista de Alexandra Prado Coelho no Público de 17 de abril passado ao egiptólogo Luís Manuel de Araújo intitulada “Estamos mais próximos dos egípcios do que imaginamos”. O entrevistado, vice-presidente da direção da ASCR-Confraria Queirosiana e diretor da Revista de Portugal, dirigiu recentemente mais uma brilhante viagem cultural ao Egito, a qual decorreu sem qualquer incidente. E também a entrevista de J. Rentes de Carvalho a José Mário Silva na E, a revista do Expresso, a 23 de Abril passado, com chamada à primeira página, intitulada “ Nasci rebelde e não deixei de o ser”. Recentemente, a 19 de abril, no blogue escreveretriste, no texto “Eça e a kalashnikov”, Manuel S. Fonseca numa entrevista a Nuno Costa Santos declarou: «… Não percebo nada de heranças, mas um notário meu amigo fez o favor de me chamar a atenção para José Rentes de Carvalho. Talvez por ser estrangeirado tenha, como Eça, uma visão desassombrada de Portugal e invista nas personagens. Lembro-me de ele, numa entrevista, ter dito que o Sócrates, o nosso ex-primeiro ministro, carismático e mau como ele dizia ser, era uma mina de ouro para um ficcionista. Eça pensaria o mesmo».
            Entretanto todas as quinzenas Guilherme de Oliveira Martins publica uma crónica no As Artes Entre as Letras intitulada “A Vida dos Livros”, a última das quais (13 de Abril) sobre “Mário de Sá-Carneiro, cem anos depois…”, sempre com profundo sentido crítico e limpidez de pensamento.

Os Maias regressaram

            No passado dia 31 de Março, Dia Mundial do Teatro, e 1 de Abril, a ETCetera Companhia de Teatro, levou à cena no Auditório Municipal de Gaia uma nova adaptação teatral de “Os Maias. Episódios da Vida Romântica” de Eça de Queirós, encenada por Luís Trigo, que igualmente integrou o elenco.
            A obra prima de Eça de Queirós, devido à perenidade dos seus carateres, continua a interessar às gerações atuais, desta feita através da linguagem cénica.

Genius Loci no Porto

            Nos passados dias 20 a 22 de Abril decorreu na Faculdade de Letras da Universidade do Porto o “Congresso Internacional Genius Loci: lugares e significados”, dedicado à memória e ação de Carlos Alberto Ferreira de Almeida, organizado pelo CITCEM e pelo Departamento de Ciências e Técnicas do Património daquela Faculdade, com a presença de muitos investigadores, entre eles António Manuel S. P. Silva; Laura Cristina Peixoto de Sousa e Pedro Abrunhosa Pereira, da equipa do Castelo de Crestuma do GHAP que falaram sobre “Arqueologia no Castelo de Crestuma, V. N. de Gaia (2010 – 2015): novos olhares sobre um lugar e um tempo de mudança”. Presentes ainda com outras comunicações os nossos sócios António Manuel de Carvalho Lima e Nuno Resende, entre muitos outros.

Expedição artística à Pala Pinta

            No passado dia 23 de Abril o escultor Hélder de Carvalho, como complemento de uma sua exposição de obras de Arte intitulada “Homens da Pala Pinta” patente na Galeria Porto Oriental, conduziu ama expedição às pinturas da Gruta da Pala Pinta (Alijó) e às gravuras rupestres de Botelhinha (Pegarinhos).

Exposições

Macau no Solar Condes de Resende

            A China volta ao Solar Condes de Resende, desta vez através da exposição fotográfica “Macau é um espetáculo: As artes nas ruas de Macau”, com fotografias da Associação Fotográfica de Macau, organizada pelo Instituto Cultural de Macau e o apoio da ASCR – Confraria Queirosiana. A mostra abre ao público no domingo à tarde dia 1 de Maio pelas 14 horas, enquanto decorre neste equipamento cultural a habitual Feira das Novidades.

COLÓQUIOS E PALESTRAS

Património Artístico de Gaia

            No próximo dia 28 de Abril, quinta-feira, pelas 21,30 horas decorrerá no Solar Condes de Resende uma palestra sobre o Património Artístico de Gaia proferida pelo Prof. Doutor José Manuel Tedim, coordenador do volume sobre esta temática, um dos 10 de que compõem o levantamento do Património Cultural de Vila Nova de Gaia em realização pelo GHP da associação ASCR-Confraria Queirosiana.  

História da Educação

            A 20 de maio decorrerá no Arquivo Municipal de Vila Nova de Gaia um Colóquio sobre “A História da Educação”, organizado pelo CITCEM da Faculdade de Letras da Universidade do Porto e aquela entidade da Câmara de Gaia. Recordemos, quase ao acaso, que neste município se aplicou pela primeira vez a Cartilha Maternal de João de Deus, aqui viveu e desenvolveu as suas escolas o pedagogo Diogo Cassels, aqui iniciou o ensino técnico para operários Teixeira Lopes (pai), aqui foi publicado o jornal A Federação Escolar, órgão sindical dos professores no final do século XIX, daqui era natural Bernardo Lucas, deputado e pedagogo da República, aqui foi professor do ensino primário Afonso Ribeiro, fundador do Neo-Realismo em Portugal, daqui era natural o professor de Coimbra Joaquim Ferreira Gomes, considerado «o pai fundador das Ciências da Educação em Portugal» e muitas outras referências incontornáveis na História do Ensino em Portugal. O programa é em grande parte preenchido por investigadores do Gabinete de História, Arqueologia e Património (GHAP) da associação Amigos do Solar Condes de Resende - Confraria Queirosiana (ASCR-CQ), que são também investigadores daquele e de outros centros académicos de investigação: António Manuel S. P. Silva e José António Martin Moreno Afonso, sobre “A rede escolar protestante”; Eva Baptista sobre “A Educação em Vila Nova de Gaia (1880 - 1930)”; J. A. Gonçalves Guimarães sobre “A Escola Primária gaiense na obra literária de Afonso Ribeiro e J. Rentes de Carvalho”; Licínio Santos sobre “As escolas operárias (1893 – 1914)”, e Fátima Teixeira sobre “Contributos educativos da Companhia de Fiação de Crestuma em Lever”. As inscrições podem ser feitas no site:
http:// coloquiohistoriaed.wix.com/vilanovadegaia

LIVROS
           

Encontra-se à venda através da Break Media, Lda, a obra “Oitentações” de César da Fonseca Veloso, cujo lançamento já anteriormente aqui referimos, cerca de seiscentas páginas de e-mails e outros textos trocados entre um avô e um neto ambos deste nosso tempo, muitas recordações servidas em prosa (e verso!) fazendo uma afectuosa e inteligente ponte entre gerações, juntando acontecimentos, dia-a-dia, família, amigos, viagens, o Centro Cultural Eça de Queiroz dos Olivais e todo um percurso de vida partilhada em leitura agradável.



           

No passado dia 22 de março foi lançado em sessão própria em Avintes, Vila Nova de Gaia, na sede da coletividade o livro “Grupo Mérito Dramático Avintense 100 Anos de Arte e Solidariedade” da autoria de Francisco Barbosa da Costa e José Vaz, o qual relata a história desta instituição centenária iniciada em 1910, com o enquadramento necessário em relação à época e ao meio em que nasceu e que até hoje nela se revê, mas também os êxitos alcançados pela sua devoção ao teatro em outros palcos espalhados pelo país, ação que muito contribuiu para atribuir a esta freguesia gaiense a designação de «capital do Teatro Amador em Portugal».


Os Tempos e os Sinais

            No passado dia 6 de Abril no Café Guarani no Porto, foi apresentado o mais recente livro de Maria Virgínia Monteiro, com excelentes ilustrações de Conceição Tavares. Trata-se de uma antologia pessoal de textos escritos ao longo da vida da autora que esperaram no tempo para terem eles próprios, independentemente da forma e do conteúdo, o encanto das estórias contadas. Tendo-nos habituado a livros de poesia, este é o seu primeiro livro de prosa, pelo que fica assim retificada a informação errada que divulgamos anteriormente.
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Eça & Outras, IIIª. Série, n.º 90 – segunda-feira, 25 de abril de 2016; propriedade dos Amigos do Solar Condes de Resende - Confraria Queirosiana; Cte. n.º 506285685 ; NIB: 001800005536505900154 ; 
IBAN: PT50001800005536505900154; email: queirosiana@gmail.com; www.queirosiana.pt; confrariaqueirosiana.blospot.com; eca-e-outras.blogspot.com; vinhosdeeca.blogspot.com; coordenação da página: J. A. Gonçalves Guimarães (TE-638); redação: Fátima Teixeira; inserção: Amélia Cabral.





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