100 anos do passamento de Teófilo Braga
Um
abraço para Salgueiro Maia
Pertenço à geração que desejou um 25 de Abril, que ansiou
por um 25 de Abril, que tudo fez para que um 25 de Abril chegasse depressa,
pois a vida estava má e o tempo passava sem as detenças da felicidade. Desde
muito novos que fomos percebendo que Portugal não estava a ser o país glorioso
que nos pintaram em azulejos na escola primária. E no liceu o país amargo
existia em todas as disciplinas, com uns escritores aborrecidos, suicidas ou
adiados de qualquer coisa na Literatura. E todos eles de compêndio, até
descobrirmos que havia outros que se teriam de ler às escondidas por causa de
uns matarruanos que tudo espiavam para aparafusarem as banalidades a ver se
estavam conformes com um regulamento qualquer. Um país triste, desajustado,
acinzentado, sem cores que lhe valessem. Essas chegavam aos poucos lá de fora,
nas canções, nos filmes, nas notícias, na moda e nas ideias que tudo
questionavam. Aos “heróis do mar” que já não havia - e muito menos o seria
aquele velhote de uniforme branco que inaugurava bairros de pescadores - ouvia-se
então o «nem deus, nem césar, nem tribuno» da Internacional ou o mais
caseiro «mudam-se os tempos, mudam-se as vontades» de Camões. Era proibido
falar abertamente no abandono da Índia Portuguesa e na Guerra do Ultramar, e em
muitas outras coisas que nos entravam pelo quotidiano adentro pela porta das
traseiras. E na Guerra do Vietnam, onde as carabinas dos camponeses iam
derrotando o imperialismo estadunidense. E depois veio o Maio 68, Coimbra 69,
as eleições da CDE e as gravatas da CEUD, e a obrigação de trocarmos as roupas
da casa Porfirios pelas do Casão Militar. E de guerra em guerra, da do general
do monóculo, passando pela do “Pantera cor-de-rosa” (“quase ganha”!) e pela dos
“adeus até ao meu regresso” das Supico Pinto natalícias, lá nos fomos
politizando, lendo avidamente o que de melhor circulava clandestinamente de mão
em mão. Para saber do mundo, muito ficamos a dever aos “Cadernos D. Quixote”;
para saber de nós aos cadernos de poesia da Editorial Presença, ao suplemento
juvenil do Diário de Lisboa, a um ou outro livreco artesanal com textos
batidos à máquina e reproduzidos a duplicador. E às Edições Afrodite, que o
sexo era quase tão tabu quanto a política nacional, problemático mesmo quando
abordado coloquialmente. E na larga estrada da vida lá estava aquele enorme
muro avassalador, a obrigatoriedade de participarmos numa guerra colonial com a
qual não concordávamos e que ninguém sabia quando e como terminaria, nem com
que consequências para as colónias, a nossa geração, ou para as futuras.
Por
tudo isto, e o muito mais que veio a seguir, quase todos os rapazes feitos
homens da minha geração estão agradecidos a Salgueiro Maio. Quase todos, porque
alguns ainda não perceberam, e outros nunca perceberão. Deixá-los lá, pois não
foram, nem nunca irão, nas colunas libertadoras dos terreiros dos paços que
foram, ou serão necessárias, para alterar «o estado a que isto chegou».
Conheci pessoalmente Salgueiro Maia e
desde então tenho-o como Amigo, pois era assim que me tratava quando nos
encontrávamos e nas cartas que me escreveu. Mas não foi no serviço militar, mas
sim nas atividades da Associação Portuguesa dos Amigos dos Castelos, onde
chegamos a ser dois dos seus quatro vice-presidentes territoriais, eu pelo
Norte, ele pelo Centro. Era uma outra das suas facetas, até por formação
académica entretanto adquirida, o estudo, a preservação, a divulgação, a
usufruição do Património Histórico, especialmente o militar. Conhecemo-nos no
Segundo Congresso sobre Monumentos Militares Portugueses, que decorreu em
Lisboa entre 14 e 19 de junho de 1983, e depois em várias outras realizações
idênticas em cuja organização participou, algumas em parceria com a Asociación
Española de Amigos de los Castillos sobre as fortificações de fronteira no
Alentejo/ Estremadura espanhola e na raia Minho/ Galiza. Numa destas
confrontamo-nos com a ridícula ação do diretor de um serviço público português
e do seu séquito familiar que se infiltraram no encontro sem estarem inscritos
nem, quando descobertos, quererem pagar a inscrição e o alojamento, prática
habitual que usavam junto das autarquias portuguesas. O problema agudizou-se na
Galiza, onde não houve outra solução senão expulsá-los publicamente de um
almoço onde se tinham precocemente amesendado. Enfim o Património também tinha
muitos destes parasitas bacocos do “antigamente”. Para além dos castelos,
tínhamos outros gostos comuns, como os cavalos e a História Militar e bem me
lembro de ter estado uma noite inteira, com os outros congressistas, a ouvi-lo
contar a sua versão dos acontecimentos do 25 de Abril no Quarto Congresso que
decorreu em Santarém e noutras cidades e vilas da região, com a vivacidade e o
sentido de humor que todos lhe reconheciam. Numa outra das minhas visitas ao
Regimento de Cavalaria, descreveu-me um acontecimento verdadeiramente
humorístico relacionado com o suposto túmulo do vice-rei da Índia, D. Francisco
de Almeida, que, em tempos passados, perante a indignação de um memorialista
que tal repudiou no periódico local, tinha sido posto a servir de bebedouro dos
cavalos. Apostado em organizar o Museu da Arma de Cavalaria e escrever a
respetiva história, para salvar a honra do regimento, meteu-se a procurar a
histórica peça, acabando por a levar para o museu. Com muitos outros pormenores
hilariantes e sendo ele o seu protagonista, pedi-lhe que escrevesse o relato do
achado. Já não teve tempo para tal. Mas mandou-me uma carta, que guardo, com a
descrição do essencial e uma fotografia do túmulo, para que eu o fizesse. Do
homem afetuoso ficaram o testemunho de sua mulher Natércia Maia, de seus
filhos, e de todos os seus inúmeros e incondicionais amigos, muitos dos quais
fundaram uma associação que tem o seu nome.
Já no século XIX, em plena indignação mapacorderrosista, Eça de Queirós escreveu «Para que temos colónias? E ai de nós que não as teremos muito tempo! Bem cedo elas nos serão expropriadas por utilidade humana. A Europa pensará que imensos territórios, pelo facto lamentável de pertencerem a Portugal, não devem ficar perpetuamente sequestrados do movimento da civilização; e que tirar as colónias à nossa inércia nacional, é conquistá-las para o progresso universal. Nós temo-las aferrolhadas no nosso cárcere privado de miséria. Não tardará que na Europa se pense em as libertar. Para evitar esse dia de humilhação sejamos vilmente agiotas, como compete a uma nação do século XIX – e vendamos as colónias» (Eça de Queirós, Uma Campanha Alegre). A minha geração leu Eça, pediu-lhe desculpa pelas distrações e pelo atraso e foi encerrar a Última Guerra Colonial Portuguesa. Ficaram-nos por aí os castelos d’aquém e d’além mar a recordar sonhos, valentias, desgostos e desânimos. E novos países a plantarem embondeiros que continuarão a crescer. Um abraço, Fernando Salgueiro Maia.
J. A. Gonçalves Guimarães
Historiador
Comemorações dos 50 anos do 25 de Abril
De há tempos a esta parte decorrem um pouco por todo o lado
um leque muito variado de manifestações para lembrar e comemorar os 50 anos
passados sobre a data e as consequências do 25 de Abril de 1974, as quais
continuarão nos próximos meses até à data da aprovação da Constituição da
República Portuguesa saída da Revolução. A associação Amigos do Solar Condes de
Resende – Confraria Queirosiana vai participar em diversas dessas realizações e
muitos dos seus associados estarão presentes, a título pessoal ou institucional,
noutras tantas.
Assim, em Vila Nova de Gaia, a Câmara Municipal realizou
sessões evocativas em colaboração com as Juntas de Freguesia em todas elas
tendo galardoado diversos cidadãos com uma placa evocativa da autoria do
escultor Paulo Neves.
No próximo dia 25, a partir das 16 horas, vai realizar-se um cortejo cívico entre o Jardim do Morro e os Paços do Concelho com a presença de instituições locais, entre elas a nossa associação representada por vários confrades. No mesmo dia o historiador Licínio Santos, dos corpos diretivos da ASCR-CQ e da Federação das Coletividades de Vila Nova de Gaia proferirá uma palestra sobre a efeméride nas instalações do Centro Cultural e Recreativo do Lugar de Gaia.
Na Associação dos Arqueólogos Portugueses |
Entretanto no passado dia 20 de abril decorreu em Lisboa na sede da Associação dos Arqueólogos Portugueses o colóquio “Arqueologia em Portugal – antes e depois do 25 de Abril de 1974” organizado por esta organização profissional, tendo aí sido apresentada a reedição de um documento intitulado «Primeiro Plenário dos Arqueólogos Portugueses – 29 de Junho de 1974». Nos diversos painéis estiveram alguns dos maiores nomes da Arqueologia nacional, entre os quais António Manuel S. P. Silva, coordenador do Gabinete de História, Arqueologia e Património da ASCR – Confraria Queirosiana e da Gaya. Revista de História, Arqueologia e Património, que falou sobre «Que futuro para a Arqueologia Portuguesa?»
Ontem, dia 24 de abril pelas 15 horas,
na sede da Academia Portuguesa da História no Palácio dos Lilases na Alameda
das Linhas de Torres em Lisboa, Ricardo Charters d’ Azevedo, confrade
queirosianos apresentou a conferência «De 25 a 25 - do 25 de Abril de 1974 ao
25 de Novembro de 1975»
No próximo dia 26,
sexta-feira, na habitual palestra das últimas quinta-feiras do mês do Solar
Condes de Resende, J. A. Gonçalves Guimarães vai apresentar uma conferência-concerto sobre a origem, significado e
evolução de «Hinos Revolucionários dos séculos XVIII ao XX». A
parte da execução musical estará a cargo do agrupamento Eça Bem Dito dirigido
pela pianista Maria João Ventura.
Tendo inicialmente previsto fazer uma palestra
intitulada «As minhas memórias de
Salgueiro Maia», devido a várias solicitações para apresentar essas mesmas
recordações em vários outros contextos, nomeadamente numa entrevista ao Jornal
de Notícias publicada hoje dia 25 de Abril, o autor elaborou o texto que
abre esta página, também publicado no jornal As Artes entre As Letras, e vai desenvolvê-lo para publicação
no próximo número da Revista de Portugal a sair em novembro.
Receção do espólio de J. Rentes de Carvalho
No passado dia 04 de abril, pelas16
horas, a associação Amigos do Solar Condes de Resende - Confraria Queirosiana,
organizou uma sessão de receção deste espólio no salão nobre do Solar Condes de
Resende, à qual estiveram aí presentes, ou por videoconferência, para além do
doador do espólio, a vereadora do
Pelouro da Cultura e da Programação Cultural, Eng.ª Paula Carvalhal, em
representação do presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, o Eng.º
Mário Duarte, diretor municipal para a Cidadania, a Dr.ª Maria José Fernandes,
diretora do Departamento de Cultura e Juventude e o Mestre João Fernandes,
responsável pelo Solar Condes de Resende, vários membros dos corpos gerentes e
associados da ASCR-CQ e outros amigos e admiradores do escritor. No início da
sessão o presidente da direção, Prof. Doutor José Manuel Tedim referiu-se às
diversas doações feitas à associação desde 2004 e que constituem já um interessante espólio documental, bibliográfico
e artístico que tem vindo a ser divulgado e valorizado.
O presente
acervo, constituído por cerca de 200 caixas vindas
de Amsterdam em dois furgões, chegou ao
Solar Condes de Resende no passado dia 13 de março, em cumprimento da
«Declaração de cedência de espólio pessoal» assinada a 24 de agosto de 2024 e
pela qual a referida associação passou a ser proprietária da sua totalidade,
salvo disposição contrária prevista em lei aplicável. Comprometeu-se a mesma a
manter este espólio como um todo, devidamente inventariado e disponível para
divulgação e estudos nas melhores condições e, sempre que solicitada, dele dará
conta ao doador ou aos seus representantes legais. Para além da sua exposição parcelar
no Solar Condes de Resende, a associação está a concorrer a formas de
financiamento para proceder à sua inventariação arquivística e disponibilização
digital, para além da publicação de um catálogo exaustivo.
Para explicar as relações da associação com o escritor e a sua obra desde longa data, J. A. Gonçalves Guimarães e Maria de Fátima Teixeira apresentaram um power point com fotografias e documentos desde os anos sessenta do século passado, a que se seguiu a intervenção de vários dos presentes e em particular a do jornalista Mário Augusto igualmente amigo do escritor e autor da mais recente reportagem realizada na Holanda para a RTP sobe a sua atividade. A vereadora Eng.ª Paula Carvalhal, encerrou a sessão salientando a importância da vinda deste espólio para Vila Nova de Gaia e a necessidade de serem encontrados apoios para o seu tratamento arquivístico. Seguiu um Porto de Honra com o Porto 20 Anos Confraria Queirosiana.
Curso sobre História Local e Regional
Aproxima-se
do seu término o curso livre «40 anos
depois: História Local e Regional», organizado pela Academia Eça de Queirós,
grupo de trabalho da associação Amigos do Solar Condes de Resende – Confraria
Queirosiana, com o patrocínio da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia e a
certificação do Centro de Formação de Associação de Escolas Gaia Nascente.
Assim, no passado dia 6 de abril o Professor Doutor Pedro Bacelar de
Vasconcelos, das universidades de Coimbra e do Minho, falou sobre o tema «De
súbditos a cidadãos» e a 20 de abril o Prof. Doutor Nuno Resende, da FLUP, sobre
«Regionalismos e internacionalismos». A aula de sábado, dia 27 de abril, foi entretanto
mudada pata o dia 4 de maio, na qual o Prof. Doutor Adrião Cunha, falará sobre
«Reformas e revoluções do século XX».
fotografia de Hélder de Carvalho |
Estátua do Professor Doutor João Marques
O Professor Doutor João Francisco Marques, antigo catedrático da Faculdade de Letras da Universidade do Porto e o último sobrevivente a tertúlia de José Régio, era também uma figura habitual numa esplanada da Póvoa de Varzim onde conversava com uma simpatia muito própria com todos aqueles que o procuravam. Entre muitas outras distinções, em 1995 recebeu a Medalha do Reconhecimento Poveiro e em 2008 foi feito confrade queirosiano de honra, tendo falecido a 6 de março de 2015. Desde o passado dia 7 de abril eu a sua figura ficou perpetuada no local que frequentou através da sua estátua em bronze sentada à mesa com uma outra cadeira disponível para todos os que quiserem continuar o diálogo. A obra de Arte é da autoria do escultor Hélder de Carvalho.
O júri na Universidade Complutense de Madrid |
Provas de Doutoramento
No passado dia 12 de abril na Faculdade de Ciências da Comunicação da Universidade Complutense de Madrid, a arquivista Alexandra Maria da Silva Vidal apresentou a sua tese «O Arquivo da Igreja Lusitana de 1880 a 1980 (Comunhão Anglicana de Portugal)». Do júri fizeram parte os professores Doutor José António Martin Moreno Afonso, do Instituto de Educação da Universidade do Minho e Doutor António Manuel S. P. Silva, responsável por aquele arquivo, ambos membros do Gabinete de História, Arqueologia e Património da ASCR-CQ.
Espaços do Barroco
Nos passados dias 19 e 20 de abril
decorreu no Centro Interpretativo do Barroco em Arcos de Valdevez o colóquio
“Espaços do Barroco”, cuja lição de abertura foi proferida pelo Prof. Doutor
José Manuel Tedim, da Universidade Portucalense Infante D. Henrique e do
Gabinete de História, Arqueologia e Património da ASCR-CQ, sob o tema «A Arte
Efémera na metamorfose dos espaços da Festa Barroca em Portugal»,
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Eça
& Outras, III.ª série, n.º 188, quinta-feira, 25 de Abril de 2024;
propriedade da associação cultural Amigos do Solar Condes de Resende -
Confraria Queirosiana (Instituição de Utilidade Pública), Solar Condes de
Resende, Travessa Condes de Resende, 110, 4410-264, Canelas, Vila Nova de Gaia;
C.te
n.º 506285685; NIB: 0018000055365059001540; IBAN:
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Gonçalves Guimarães (TE-164 A); redação: Fátima Teixeira; inserção: Amélia
Cabral.
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